domingo, 13 de janeiro de 2013

JESUÍTAS: OS HOMENS DE PRETO CHEGAM AO BRASIL

Da ESPADA à CRUZ

El Rey, Dom João III, houve por bem formar Governos Gerais e enviou Tomé de Souza como primeiro governador geral ao Brasil, formando esquadra onde estariam alguns religiosos para o bem espiritual e conhecimento do evangelho aos gentios (autóctones). O padre Manuel da Nóbrega da Companhia de Jesus, estudioso de Coimbra foi escolhido como superior religioso para tal mister. A nau partiu de Lisboa a 1º de fevereiro de 1549, com seis religiosos da Companhia de Jesus (Societas Jesu o Societas Iesu, S.J. o S.I.):
A. M. D. G=Ad Majorem Dei Gloriam: Para maior glória de Deus.

Lema da Companhia de Jesus 

Padre Manuel da Nóbrega, padre Leonardo Nunes, padre João de Azpilcueta Navarro, o padre Antonio Pires, além dos irmãos Vicente Rodrigues e Diogo Jácome. Desembarcaram na Bahia em 29 de março de 1549. 

Um ano após esta primeira leva de missionários vieram outro quatro sacerdotes a saber: Salvador Rodrigues, Francisco Pires, Manuel de Paiva e Afonso Braz.

Uma terceira leva veio em 8 de maio de 1553, com supervisão do antigo reitor de Coimbra, Padre Luis Da Grã, que no Brasil responderia como segundo provincial. Estavam juntamente com o segundo governador nomeado Dom Duarte da Costa. Seguiram-no dois padres, Brás Lourenço e Ambrósio Pires que tiveram ainda a companhia de quatro irmãos: Gregório Serrão, João Gonçalves, Antonio Bláques e José de Anchieta, o mais novo de todos eles. Chegaram à Bahia na armada de Duarte de Góis, em 13 de julho de 1553, numa viagem de mais de dois meses!

ANCHIETA, O IRMÃO JOSEPHI, FOI ORDENADO SACERDOTE EM 1566

José de Anchieta nasceu em San Cristóbal de la Laguna, Tenerife, no Arquipélago da  Ilhas Canárias, terras de Espanha, em 19 de março de 1534, filho do escrivão real Dom Juan de Anchieta, natural de Biscaia, ao norte da Espanha, e Mência Díaz de Clavijo y Llarena, natural das Canárias. Parente, por linhagem paterna, de uma família de nobres dos Loyolas; a mesma do fundador da Companhia de Jesus, Íñigo López de Loyola, (Ignácio de Loyola, 1491-1556) pertencia a estirpe basca dos rígidos soldados da Península Ibérica. Transfere-se para Coimbra para estudar no Real Colégio das Artes ingressando na Companhia de Jesus em Coimbra, em 1551. 

Tinha facilidade de domínio da prosa e verso, sendo parte da criadora dramaturgia que o impulsionou na vida, além de ser versado em latim para o que lhe competia a compreensão dos estudos da filosofia cristã. José de Anchieta veio ao Brasil em 1553, com apenas 19 anos de idade, chegando a Casa da Bahia e logo depois transferido para a Capitania de São Vicente. Após sua ordenação ocorrida em junho de 1566, foi nomeado superior em 1567, cargo que manteve até 1577.  

Nestas terras passou ao domínio da língua gentílica através de ocupação da conversão destes naturais.


OS AMIGOS DO PASSADO, SUBJUGADOS NO PRESENTE, SEM FUTURO, CAÇADOS EM “ALTA MIRA” APONTADA PELO INIMIGO INVASOR NO "BELO MONTE PASCOAL"!
 
Esteve com o terceiro governador geral do Brasil, Mem de Sá e seu sobrinho Estácio de Sá no ano de 1565[1], quando vencendo os franceses, fizeram-se os assentos da cidade onde se tornou a Capitania Real do Rio de Janeiro e mais tarde sede (1763) do Governo Geral, em substituição a Salvador.
 
Anchieta subiu muitas vezes ao planalto pelos caminhos de Paranapiacaba, em São Paulo, num caminho próprio de seus trajetos do litoral. Os provinciais dessa época tinham sido Manuel da Nóbrega (1549-1559), passando depois por Luis Da Grã (1559-1571) e Inácio Tolosa (1572-1577), sendo então Anchieta nomeado como provincial após sua última profissão de fé para os administradores, reconhecida em 8 de abril de 1577, sendo a sede (SÉ) na Bahia, percorria de Itamaracá a Itanhaém em barco a vela. 

SANTO ANDRÉ DA BORDA DO CAMPO

Em citação do Padre Manuel da Nóbrega em Cartas do Brasil e mais Escritos temos a referência seguinte:
ATA DA SESSÃO DA CÂMARA DE SANTO ANDRÉ, 1555 (DOCUMENTO MAIS ANTIGO DA CÃMARA)

“E do mar dez léguas pouco mais ou menos, duas léguas de uma povoação de João Ramalho, que se chama Piratinim, (Santo André da Borda do Campo) onde Martim Afonso de Souza primeiro povoou, ajuntamos todos que Nosso Senhor quer trazer à sua Igreja e aqueles que sua palavra e evangelho engendram pela pregação. E estes de todos deixam seus costumes e se vão extremando dos outros, e, muita esperança temos de serem verdadeiros filhos da Igreja; e vai-se fazendo uma formosa povoação, e os filhos deste são os que se doutrinam do Colégio de São Vicente”. 

Em 8 de abril de 1553 realiza-se a primeira eleição no Planalto dos Piratininguara[2] com a instalação da Câmara de vereadores de Santo André da Borda do Campo, (sem algo que possa posiciona-la na atual cidade de mesmo nome) a Vila do Capitão Mor  João Ramalho.


JOÃO RAMALHO - OBRA DE BENEDITO CALIXTO

O padre Luiz Gonçalves da Câmara, provincial dos jesuítas em Portugal, recebe carta do provincial do Brasil, Manuel da Nóbrega, datada de 31 de agosto de 1553:

“Neste Campo está João Ramalho, o mais antigo homem que está nesta terra. Tem muitos filhos e mui aparentados em todo este sertão, E o mais velho deles levo agora comigo ao sertão por mais autorizar nosso ministério. João Ramalho é muito conhecido e venerado entre os gentios e tem filhas casadas com os principais homens desta Capitânia, e todos estes filhos e filhas são de uma índia, filha dos maiores e mais principais desta terra”.

O REAL COLÉGIO DE SÃO PAULO

A instalação do Real Colégio de São Paulo concretizou-se com a celebração da primeira missa em 25 de janeiro de 1554 pelo padre Manuel Paiva. O jovem José de Anchieta deixou registrado em seu diário: 

"Para sustento destes meninos, a farinha de pau era trazida do interior, da distancia de 30 milhas. Como era muito trabalhoso e difícil por causa da grande aspereza do caminho, ao nosso Padre (Manuel da Nóbrega) pareceu melhor no Senhor mudarmo-nos para esta povoação de índios que se chama Piratininga. Isto por muitas razões: primeiro, por causa dos mantimentos; depois, porque se fazia nos portugueses menos fruto do que se devia... Por isso, alguns irmãos mandados para esta aldeia no ano do Senhor de 1554, chegamos a 25 de janeiro e celebramos a primeira missa em uma casa pobrezinha e muito pequena no dia da conversão de São Paulo, e por isso dedicamos ao mesmo nome a esta Casa."(negrito ref. Blog)

 Tratava-se de "uma pobre casinha feita de barro e paus, e coberta de palhas, tendo quatorze passos de comprimento e apenas dez de largura, onde estão ao mesmo tempo a escola, a enfermaria, o dormitório, o refeitório, a cozinha e a dispensa", conforme citação do “padre” José de Anchieta, local este que serviu como a primeira estrutura catequética dos índios da Capitania de São Vicente.  

Os superiores deveriam escrever ao Superior Geral da Ordem, Ignácio de Loyola, em Roma, a cada quatro meses com informações dos trabalhos missionários. As cartas escritas por José de Anchieta em sua maior parte foram escritas em espanhol e latim, tendo o hábito de redigir com duplicatas. Aquela que deveria ser postada como correspondência em junho de 1554, referindo-se missa e a  instalação do Real Colégio de São Paulo foi desencaminhada por algum motivo, mas que felizmente Anchieta faz nova referência ao fato na carta datada de 1º de setembro de 1554, esta que é tomada como “certidão de batismo” da cidade de São Paulo. 

O Padre José de Anchieta fez o serviço que lhe competia como provincial até a vinda de seu substituto, Pero Rodrigues, em agosto de 1594, sendo feito Superior da Ordem, e despedindo-se com seu passamento em 9 de junho de 1597, na aldeia de Iriritiba ou Reritiba, no Espírito Santo. Foi nomeado “Apóstolo do Brasil” pelo administrador apostólico do Rio de Janeiro, Bartolomeu Simões Pereira.

CONSIDERAÇÕES

As cartas de José de Anchieta encontram-se em sua quase totalidade no Arquivo da Companhia de Jesus, em Roma. 
A Companhia de Jesus sofreu supressão através de papa Clemente XIV, em 1773, sendo a Ordem restaurada no pontificado de Pio VII, em 1814. A beatificação de Anchieta teve inicio em 1624 através de comissão encomendada por Urbano VIII, mas a campanha já havia sido iniciada na Capitania da Bahia em 1617. Foi beatificado pelo papa João Paulo II em 22 de junho de 1980, talvez o processo religioso mais longo da história feito pelo Vaticano!

Em 1622, na cidade do Rio de Janeiro, várias senhoras da cidade de São Paulo, entre elas Suzana Dias e Leonor Leme, que o conhecerem, depuseram em seu favor, no seu processo de beatificação. Leonor Leme, matriarca da família Leme paulista, uma das depoentes, disse que "assistiu ela à primeira missa celebrada em São Vicente pelo Padre José de Anchieta, em1567, e que ele se confessou depois muitas vezes".

"Todos o tinham por santo publicamente!" (Leonor Leme)






Referências:

Revista do Arquivo Municipal, Antologia, 202. São Paulo, 2004

VIOTTI, Hélio Abranches, S.J. Pesquisa e Organização. “Cartas-Correspondência Ativa e Passiva do Pe. Joseph de Anchieta”. São Paulo: Edições Loyola, 1984

Exposição "Os Empreendedores: de Anchieta aos novos tempos" com edição  “Minhas Cartas”, por José de Anchieta: Material dos arquivos históricos da Companhia de Jesus, no Vaticano, trazidas por iniciativa da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) em conjunto com o “Pateo do Collegio” em comemoração aos 450 anos da cidade de  São Paulo.
 
MADRE DE DEUS, Frei Gaspar da, Memórias para a História da Capitania de São Vicente. São Paulo e Rio: Weisflog Irmãos, 1920(Terceira edição) 

Padre Manoel da Nóbrega, Cartas do Brasil (1549-1560). Opera Omnia. Edição do Padre Serafim Leite, Coimbra, 1955.

LEITE, Serafim, S.I. História da Companhia de Jesus no Brasil. Rio de Janeiro.Instituto Nacional do Livro. Livraria Portugalia, Lisboa.. 1945- Tomo VI

ECHANIZ, Ignácio, S.J. Paixão e Glória História da Companhia de Jesus em Corpo e Alma.Tomo I-Primavera(1529-1581). São Paulo: Edições Loyola

BARBOSA, Maria de Fátima Medeiros. As Letras e a Cruz-Pedagogia da Fé e ESt´ttica Religiosa na Experiência Missionária de José de Anchieta, S.I.(1534-1597). Roma: Editrace Pontificia Università Gregoriana, 2066.

SOUTHEY, Robert. Tradução Luís Joaquim de Oliveira e Castro. História do Brasil. São Paulo: Edições Melhoramentos, 5ª Edição

 





[1] Estácio de Sá, com ajuda do Governador Mem de Sá e de tropas da Capitânia de São Vicente aportou no dia 28 de fevereiro, com sua esquadra entre um penhasco de granito (Pão de Açúcar) situado à entrada da baía de Guanabara e o morro Cara de Cão, atual São João. Após forte combate contra tropas francesas, no dia 1º de março de 1565, fundou oficialmente a cidade São Sebastião do Rio de Janeiro, em lembrança ao Rei Dom Sebastião I de Portugal, neto de Dom João III, da dinastia de Avis, escolhendo o santo de mesmo nome para padroeiro, comemorado em 20 de janeiro.
[2] Piratininguara significa em tupi-guarani: “o morador de Piratininga” ( piratininga + guara). É uma palavra indígena que definia, até 1560, o morador dos Campos de Piratininga, atual cidade de São Paulo. "Piratininga", segundo Silveira Bueno, é vocábulo tupi que significa "peixe seco". (pirá, peixe e tininga, seco).

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