“CAMPO
SANTO” DE SANTO AMARO
Os
cemitérios foram decretados pelo Imperador do Brasil, Dom Pedro I, em 1828, por
uma contingência necessária de se evitar que os fiéis defuntos de determinada
ordem religiosa fossem depostos nas dependências das referidas paróquias em
determinada Freguesia[1].
Os primeiros cemitérios foram criados para manterem-se próximos das igrejas, ou
seja, ao redor destas, onde serviam determinada congregação e estavam em volta
destas matrizes ou capelas. Logicamente com a expansão urbana houve a
necessidade de ampliar estas áreas físicas depositárias, e no caso o poder
municipal achou por bem determinar locais apropriados para este cunho específico,
quebrando deste modo o vinculo exclusivo de determinada irmandade, (em Santo
Amaro, em 1836 estavam registradas quatro irmandades: do Santíssimo Sacramento,
de São Miguel, das Almas e do Rosário, CALDEIRA, p.66) não mais cabendo todo o
ritual do féretro, sendo às exéquias unicamente parte do serviço religioso
dentro ou ao redor das paróquias, assumindo a deposição do corpo a sepultar ao
poder municipal de cada cidade.
Cumprindo
determinações a respeito e tendo em vista unicamente o sentido da saúde local
houve por bem aceitar as determinações e a interferência sanitarista.
O
século 19 todas as doenças diagnosticadas estavam relacionadas às febres temíveis
e em São Paulo não era diferente, espalhando a febre palustre, a terçã, tifoide,
inflamatória, intermitente ou remitente e a perniciosa, numa gama enorme de
ainda desconhecidas doenças que se somavam a falta de higiene que alastrava também
a peste bubônica e a varíola que eram temidas pela população urbana de concentração
mais elevada[2].
O
pensamento da época sustentava que as aglomerações de cortiços favoreciam maior
foco de epidemias, pois estes locais concentravam um grande número de pessoas
em ambientes insalubres, sendo grande foco de contágio. As anemias contribuíam
para que os óbitos crescessem assustadoramente, pois as parcas sustentações
alimentares agravavam o enfraquecimento e alastravam as doenças, que atacavam
os mais fracos, e, neste grupo muitas crianças eram afetadas em número
alarmante.
Havia
correntes que se preocupavam com a higienização, que demandavam uma nova
concepção de espaço urbano e de suas infraestruturas, exigindo um modelo de
combate em locais segregados, fileiras de grande massa operária, exigindo
saneamento básico compatível com o crescimento. As latrinas não mais deveriam
despejar seus detritos a céu aberto e as águas deveriam ter tratamento
compatível às necessidades locais. As teorias parlamentares campeavam nas
repartições públicas, sem embasamento suficiente para combate eficaz das
moléstias mais comuns da época.
Em
decreto de 14 de setembro 1891, extinguiu-se a “Inspetoria de Higiene de São
Paulo”, reorientando os serviços públicos de saúde. Novas estruturas evoluíam
quanto mais se necessitava o combate às doenças mais comuns entre a população.
O
serviço Sanitário foi instituído em 28 de outubro de 1891, através da lei nº 12.
Em
18 de julho de 1892, a lei nº 43 regulamentava o modelo sanitarista, criando o “Laboratório
de Análises Químicas” para controle de alimentos, o Laboratório de Bacteriologia,
o Instituto Vacinogênico para os trabalhos de produção de vacina antivariólica,
e o Laboratório Farmacêutico, para produção de medicamentos.
Com
a larga escala de navios aportando em Santos com a alta demanda de imigrantes
de várias partes do mundo que afluíam para a Cidade de São Paulo do século 19,
e deslocamento de populações, houve a preocupação com a peste bubônica, sendo os
ratos os agentes transmissores da peste, houve precauções visando que o mal
chegasse a capital paulista.
Cemitério de Santo Amaro
O
Cemitério de Santo Amaro possui sua entrada mais antiga localizada na Rua
Carlos Gomes, sem numeração e a entrada oficial à Rua Ministro Roberto Cardoso
Alves, nº 186, na esquina da Rua Padre José de Anchieta.
Deste
modo houve a criação do Cemitério de Santo Amaro, inaugurado em 9 de maio de 1856, (o Cemitério da Consolação,
considerado o primeiro cemitério da cidade de São Paulo foi inaugurado 15 de
agosto de 1858) quando Santo Amaro possuía autonomia administrativa (Cidade de
1832 a 1935) cumprindo o artigo 66, da Lei Régia de 1º de outubro de 1828,
exigindo que a deposição dos corpos dos fiéis defuntos não deveriam ser
colocados dentro das Igrejas, sob assoalhos onde se mantinham as referidas
campas, pois com o tempo exalava odores insuportáveis pela putrefação da
decomposição orgânica sendo esta prática
um grande risco a saúde.
Cópia de documento de 1828(fração)
O primeiro enterro do Cemitério de
Santo Amaro conforme registros historiográficos ocorreu em 5 de janeiro de 1857.
Logicamente com a rotatividade na área física do cemitério não houve a
preservação do espaço destes primeiros túmulos depositários, ficando como indício
do século 19 a lápide do Comandante José Foster, que participou da Guerra da
Cisplatina e que nasceu em Wertemberg na Alemanha, em 27 de setembro de 1800,
vindo a falecer em 14 de outubro de 1886 em Santo Amaro, São Paulo, Brasil.
Muita
história local foi depositada neste “campo santo”. Além de muitas atribuições
exercidas em Santo Amaro coube-lhe ainda ser o primeiro administrador foi Adolpho
Alves Pinheiro de Paiva (1814-1880).
Através de observação no Cemitério de Santo
Amaro é possível conhecer sepulturas de importantes personagens santamarenses. Deste
modo podem- ser vistas lapides de famílias tradicionais que muito contribuíram
para o desenvolvimento da Cidade de Santo Amaro:
Araújo, Moraes, Zillig,
Sgarbi, Luz, Lamera, Diniz, Lang, Foster, Hessel, Barroso, Zenha, Schmidt,
Guerra, Rivellino, De Luca, Amaro, Borba, Roschel, Klein, Piccarolo, Schunck,
Bechara, Grassmann, Fares, Martins, Carvalho, Abrantes, Mendes, Czernik, Cortez,
Petrillo e tantos outros nascidos nestas paragens ou imigrados que vieram de
lugares diversos que podem ser aqui acrescidos e que merecem sempre o réquiem e
o silêncio do respeito de todas as gerações demarcada pelo Cruzeiro, farol de
luz entre os que estão aqui e aos que tiveram “passamento” pela vida.
Bento
do Portão: Santo para o povo!
Antônio
Bento nasceu em 20 de janeiro de 1875 no estado
da Bahia, Brasil.
Tornou-se figura de devoção em Santo Amaro. Bento do Portão
como se tornou conhecido, viveu em boa parte de sua existência em Santo Amaro
espalhando bondade, com labor da vida diária, ora carregando lenha, fonte de
energia local e da cidade como um todo, ora sendo o “agueiro” recolhido das
minas d’água da Iguatinga, recebendo as benesses populares desta labuta, tendo
como “morada” o portão do Cemitério de Santo Amaro ou acomodava-se diante da ombreira
e verga das grandes portas das residências dos domicílios de onde usufruísse de
seu sustento, sendo essa casa abençoada pela benevolência.
Veio a falecer em 29
de junho de 1917 sendo sepultado no Cemitério de
Santo Amaro e em sua exumação após o período de sete anos, seu corpo permanecia
intacto. Seu túmulo, no Cemitério de Santo Amaro possui alta frequência, sendo
diferenciada dos demais por uma estrutura coberta próxima a capela. Os leigos
religiosos tem grande apreço nas interseções e através de orações elevam graças
ao Deus Criador, sendo Bento do Portão o instrumento elevado pela força do
Espírito Santo, um dia, quem sabe, sua beatificação, cabendo à prova
taumaturga, pela fé cristã, torne-se um grande acontecimento de santidade em
Santo Amaro.
Referências:
Colaboração do administrador do Cemitério de Santo Amaro, Amaro
Machado.
Trabalho de Conclusão
de Curso: Elisandra Martins e equipe- Universidade Unisa
Revistas do Arquivo Municipal. Publicação da Divisão
do Arquivo Histórico, do Departamento de Cultura, da Secretária de Educação e
Cultura, da Prefeitura de São Paulo.
GUERRA, Juvêncio, Guerra Jurandyr. Almanack Commemorativo do 1º Centenário
do Município de Santo Amaro.São Paulo: Estab. Graphico Rossolillo - p. 79.
CALDEIRA, Netto Caldeira. Álbum de Santo Amaro. São
Paulo: Organização Cruzeiro do Sul-Bentivegna & Netto, 1935.
[1] Freguês: Da expressão latina fillius eclesiae,
filho da igreja, logo a Freguesia era uma divisão administrativa pequena dentro
dos municípios, (“concelhos”, em Portugal) civil ou eclesiástica. O território eclesiástico
no Brasil são distintos aos territórios político-administrativos.
[2] Em Santo Amaro,
não havia um perigo concentrado, pois existiam poucos “fogos” com uma população
um pouco maior do que dez mil habitantes (em 1876/77, apenas 426 fogos (casas),
em uma área total de 40 léguas quadradas, CALDEIRA, p.73).