sábado, 23 de maio de 2015

Escola Adventista e o Capão Redondo: 100 anos de convívio

O EXTREMO SUL DE SÃO PAULO: SANTO AMARO

O Capão Redondo abrangia vasta área em uma grande extensão de terra que pertencia ao senador Uladislau Herculano de Freitas Guimarães[1], gaúcho, que se tornou presidente (termo usado na época para governador) do Estado do Paraná em 1890, além de tornar-se Ministro da Justiça e Negócios Exteriores em 1913, e dirigir a Faculdade de Direito do Largo São Francisco, tornou-se ainda deputado e senador estadual por São Paulo.

Estas terras do Capão Redondo, depois, foram adquiridas por outros donos por meio de permutas entre terras da família Corrêa, na cidade de Itapuí, antiga Bica da Pedra, região de Jaú, no interior paulista. A outra parte da propriedade foi vendida posteriormente ao Capitão Amaro Vieira de Moraes, e aos pais da esposa de Pantaleão Teizen e englobava a soma do território de Salvador Antonio Corrêa.

Em 1912 a família de Salvador Corrêa, Antonio Pires de Oliveira e Antonio Rodrigues da Silva, mudaram para a região, seguidos de outras famílias. Em depoimento de 1995, (Jornal O Campo Limpo, ano 1, nº 4) o senhor Adão Corrêa, caçula de uma linhagem de oito filhos de Salvador Corrêa e dona Joana Maria das Dores, e, que havia sido delegado da 47ª delegacia de polícia,  expunha que: “No Capão Redondo existiam dois lagos, um lago nós conhecíamos como lago Salvador Corrêa e o outro lago era o lago dos Moraes. O meu pai (Salvador Antonio Corrêa) e o senhor Antonio das Chagas(morador pioneiro na região) construíram um engenho, que fabricava farinha de mandioca e de milho e era movido por água que vinha do lago Salvador Corrêa”

Como parte decorrente da imigração alemã veio para a região de Santo Amaro,[2] em 1914 Johannes Rudolf Berthold Lipke, original de Berlim, na Alemanha, onde realizou uma série de conferências pela Igreja Adventista do Sétimo Dia, tendo na época contato com o casal Benedita da Conceição e Pantaleão Teizen que venderam a fazenda, propriedade de aproximadamente 50 alqueires paulista[3] por vinte milhões de réis, acertados em 28 de abril de 1915, dando início ao Seminário Adventista no Capão Redondo, hoje UNASP, Campus São Paulo, na Estrada de Itapecerica, onde foram implantadas as instalações do "Colégio da União Conferência Brasileira Adventista do Sétimo Dia", com sede fundada em 06 de maio de 1915 e que mais tarde passou a denominação de Colégio Adventista Brasileiro. 

A localização do “Collegio Adventista” era apresentado em prospecto da época e de como proceder para chegar-se a instituição:
LINHA SÉ-SÃO PAULO À SANTO AMARO (1937)

“De São Paulo até Santo Amaro o trajeto é feito de bonde em cerca de 45 minutos e daí até o local da escola em veículo a tração animal que faz o percurso em uma hora”.

Mais tarde por regime de comodato foi cedido pelo governo paulista área para ser beneficiada e cuidada e que estava conjuntamente à gleba adquirida pela instituição que se tornava usufrutuário da cessão, sendo que em 1979 voltou a fazer parte das “propriedades do governo” e onde foram edificados prédios populares que comumente se conhece como COHAB (conjunto habitacional). Em área de bosque de 134 mil metros quadrados foi implantado, após devolução de terras, o Parque Santo Dias, em 7 de novembro de 1992.

Como primeiro diretor do Seminário Adventista de 1915 a 1918, Johannes Rudolf Berthold Lipke (1875-1943) foi apoiado por John Henrique Boehm, (1874-1975) fundador e primeiro administrador desta instituição, o qual foi incumbido de construir o prédio da escola, idealizado para formar estrutura educacional e para ser auto-suficiente, produzindo as próprias necessidades básicas da instituição na agropecuária e agricultura. 

Depois de edificada toda a estrutura paulistana, Boehm foi incumbido de idealizar o mesmo estilo empreendedor no Espírito Santo, nas colônias alemãs, dirigindo para este Estado em 1917.

Na década de 20 e 30 implantou-se a “Produtos Alimentícios Superbom”, empresa fundada pelo Instituto Adventista, que iniciou a produção de sucos, em especial de uvas adquiridas na cidade de Jundiaí, classificadas com esmero de especialistas antigos, como senhor Hugo que mantinha o sumo da uva no lagar, além de manter as caldeiras em fogo brando, com produção de mel, cevada e grãos integrais, e concentrados de soja vendidos em pequena loja que havia com fachada voltada para a Estrada de Itapecerica.

A primeira professora brasileira do colégio foi Albertina Rodrigues Simon, pois terminada a Primeira Guerra Mundial, o governo brasileiro decretou que nenhuma escola particular poderia funcionar sem ter um educador (a) brasileiro formado para ensinar a língua vernácula, História e Geografia do Brasil. Assim, no início de 1918, Albertina recebeu um chamado para lecionar no Colégio Adventista Brasileiro (CAB), atual UNASP-SP[4]. 

Temos que lembrar a participação ativa de Ernesto Bergold, gerente do Departamento Agropecuário do Instituto Adventista de Ensino, grande colaborador da pecuária leiteira[5] do “gado holandês preto e branco” criado na região de onde saíram muitos reprodutores para várias regiões brasileiras. Deste esforço muitos troféus foram conquistados pela “vaca Fortaleza” por sua “performance” na produção leiteira, sendo responsável pelo troféu “Vaca de Ouro” conquistado em 1957. 

Tudo isso foi concretizado a partir de 1945, quando o Serviço de Controle Leiteiro da Associação Paulista de Criadores de Bovinos difundiu os resultados conseguidos em ordenhas. Existiam animais com nomes pitorescos como Nativa, Festa, Botãozinho, que eram vacas de lactação, fornecedoras, em média diária per capita de 40 litros de leite, ou sendo preparadas para a cria sendo inseminadas com sêmen de touro que "bufafa" na raia, solitário, e por sua aparência recebia nomes de sua qualidade reprodutora como o sugestivo nome inglês “Strong”, pela sua robustez, de estrutura fortalecida, meio amarronzado, além de outros animais que fizeram parte de um quadro genético dos melhores, como Jaguari, Sorriso e Fumaça, e que mais tarde outros tratadores como Bonfim e Sassá deram seguimento, este último apelidado desde criança lá em Itabuna, Bahia, onde aprendeu o manuseio, e, aplicava-se a técnica apropriada, cuidando com carinho a pequena manada desta seleção de animais escolhidos para dar qualidade aos produtos locais deste subúrbio meio interiorano do Capão Redondo.

Havia determinadas pessoas que cuidavam de outros seguimentos, como o senhor Framiak, que dirigia toda a turma que havia nesta área produtiva da instituição, ou como o Zé Horta, que recebeu a alcunha por cuidar das leguminosas, ou o seu Antonio do Trator, que remexia a terra preparando o solo para o cultivo, ou o seu Paulo veterinário que recebia toda informação possível por parte do Lourival, que também controlava o plantel.

Com a iniciação do loteamento os primeiros a adquirir os terrenos próximos a Escola Adventista foram os Zorub e os Van Rôo, talvez integrantes de famílias provenientes de outras regiões européias, e que foram sendo adaptados a outra realidade. Aos poucos foram sendo loteadas outras glebas em antigas propriedades de Antonio Chácara, Quirino Diz, Belchior de Araujo, Juca Candido e Juca Grilo, dando origem a expansão de novos bairros em volta de colégio, como o Parque Fernanda, em 1959, com área de 37.248,50 m2 do espólio de Jose Figueiredo Junior, processo nº 291/59 loteado por Dantas de Freitas S.A Comercial Agrícola e Construção; Jardim Comercial, em 1961 possuindo 110.491,85 m2 constituído pela Comercial e Construtora A. E. Carvalho S.A. ou o Jardim das Rosas, projetado em 1963 com 98.773,00 m2 e o Parque Independência com 223.248,00 m2, feito pela Simberg Imobiliária e Agrícola Ltda.


São Paulo tinha aproximadamente em 1915, 500 mil habitantes e o Capão Redondo possuía alguns “fogos”, casinhas esparsas, com não mais que 50 pessoas espalhadas em longas extensões de terras do extremo sul paulistano. Hoje se tornou um local adensado com aproximadamente 300 mil pessoas distribuída numa extensão de 13,6 Km2, sendo, na atualidade, um dos distritos paulistanos.

Deste modo que onde foi um capão, um bosque em meio e um descampado, área de caça, de pequenos animais selvagens que possuíam seu habitat natural na localidade, surgiu esta região administrativa do Capão Redondo com área estimada atualmente em 13,6 km2 adensada na periferia que cresce no extremo da capital, de muita arte e cultura paulistana.


NOTA: Crônica sujeita a revisões para aprimoramento das informações e complemento da historiografia.


Complementos disponíveis para análise e considerações:






Jornal O Campo Limpo, ano 1, nº 2 e 4

Exposição do Colégio Adventista ocorrida em abril de 2009

Revista Adventista, outubro de 1984, p. 30. SIMON

Revista Adventista, agosto de 1943, p. 25; 34-LIPKE

João Rabello, John Boehm - Educador Pioneiro (São Paulo: Centro Nacional da Memória Adventista, 1990).




[1] Homenageado com denominação de rua próximo ao Largo 13 de Maio, em Santo Amaro, mas devido à dualidade de nomes dentro do mesmo município, pois São Amaro perdeu sua emancipação política em 1935, tornado-se parte integrante do território do município de São Paulo, foi alterado, mais tarde, para Rua Desembargador Bandeira de Melo. Nota: há alguns desembargadores com o referido sobrenome, falta informação a respeito do homenageado.

[2] Em 1829 Imigrantes alemães instalam-se na Região da Colônia Paulista e Itapecerica, regiões pertencentes, à época, a Vila de Santo Amaro, independente administrativamente de 1832 a 1935.

[3] 50 alqueires paulista (onde um alqueire= 24200 m2) corresponde a aproximados 300 acres (onde um acre=4046,85 m2). Um acre era quantidade de terras planas que um homem poderia arar em um dia com uma junta de bois. Fazenda é uma grande área rural, destinada para a prática de agricultura e da pecuária que podem ser dirigidas por pessoas, famílias, ou comunidades, ou por corporações e companhias. 
[4] O Ministério da Educação transformou em 1999 o IAE em Centro Universitário.

[5] Houve um grande empenho no desenvolvimento educacional e agroindustrial da escola, destacando-se a partir de 1925 a criação de gado leiteiro holandês, importado dos Estados Unidos.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

VILA ANASTÁCIO, LAPA, SP: Nova Ponte Sobre o Rio Tietê e a Av. Raimundo Pereira de Magalhães

A ponte antiga e a moderna: Gentrificação local!

Aquele espaço bucólico que existia nas vilas e aonde cada pessoa se conhecia pelo nome está sendo esquecido com a verticalização da cidade. Não haverá, em curto espaço de tempo, aquelas casas de varandas e ajardinadas de antes, onde todos possuíam relações de amizade eternizadas que aproximavam todos num bem comum, que poderia ser uma associação de bairro para reivindicar melhorias perante as autoridades representativas municipais e por vezes até estaduais, ou por intermédio da religião tornavam-se ligados por matrimônio ou compadres de conhecimento por longa data.

Participavam de datas festivas, aniversários, festas juninas, natividade, jogando um futebol, tricotando, além de manterem comércio variado, com relações comerciais diariamente, sem as grandes estruturas dos supermercados mantendo ativa a relação de compra e venda, do haver e o dever.

Enfim tudo tinha um sentido para estarem juntos, ou por simplesmente “jogar conversa fora”. As pessoas uniam-se e reuniam-se na sua própria localidade e assim tinham forte ligação e possuíam identidade e pertencimento.

 As cidades crescem e o tempo passa e muitos que deram origem ao bairro já não fazem parte de uma história em transformação, pois a vida é finita e muitos tiveram seu passamento e seus filhos ainda tentam manter alguma tradição, mas a expansão imobiliária faz o “apoderamento” do espaço. Toda estrutura anterior é transformada em outra que nada tem haver com a embrionária que fundou as bases da localidade.

Cada espaço tem seu cuidado, mas se assemelham no tempo, e os bairros de operários das décadas anteriores vão aos poucos desaparecendo ganhando ares de “gentrificação” através de grandes edifícios urbanos que transformam a paisagem, edificando em pouca área física de terreno, um adensando com número muito grande de pessoas. 

O “anjo da história” olha sempre para frente em nome de um progresso sem fim e os locais das inter-relações desaparecem dando lugar a uma relação unicamente de interesses financeiros. Esta é a moeda de troca e o preço que se paga de estar em local que expandirá com o tempo e terá o valor monetário como poder daquilo que se tem como um bem de consumo, expande-se sem controle e a cidade está a venda todo tipo de imóvel, em nome do mercado imobiliário.

As vilas  que antes foram consideradas longínquas e periféricas da cidade de São Paulo agora fazem parte de cidade e precisam ser transformadas em outra realidade que não aquela de nossos antepassados.

Momento houve em que se lutava por melhorias básicas como energia elétrica, asfalto, ônibus, esgoto, uma ponte para cruzar um rio, e outras necessidades. Por esses motivos reuniam-se todos para requerer melhorias locais, e, deste modo nasceram a “Sociedade Amigos de Bairros”, que através de abaixo assinados procuram egrégios representantes políticos para juntos ao prefeito atingir os objetivos das reivindicações coletivas com petições como esta encontrada nos Anais da Câmara Municipal de São Paulo, onde a população da Vila Anastácio, na Lapa, requeria urgência de uma nova ponte sobre o Rio Tietê. 
  
Em 1948, pelo estado precário da ponte que ligava a Lapa, na Vila Anastácio, com Pirituba, houve mobilização popular para requerer ao executivo prioridade de construção de "uma nova ponte" no local. Depois de mais de seis décadas parece que a reivindicação será atendida pelo poder público! (Vejam documento abaixo)


2ª SESSÃO ORDINÁRIA EM 12 DE JANEIRO DE 1948 (escrito conforme documento da época)


Presidência do dr. Marrey Júnior


Secretários Anis Aidar e Angelo Bôrtolo


Indicação nº 18-48


Considerando que a ponte sobre o Rio Tietê entre a Lapa e Vila Anastácio, na Armour, é de pequena largura, dando passagem a apenas um veículo;
Considerando que, em virtude do grande movimento que aí se escoa para a Via Anhanguera, intenso é o trânsito de caminhões e ônibus;
Considerando que estes veículos, por suas maiores dimensões, ocupam toda a largura da mencionada ponte;
Considerando, ainda, que por tratar-se de zona densamente povoada e industrializada, o movimento de pedestres aí é intensíssimo;
Considerando que, pelas razões acima apontadas, são quase diários os atropelamentos de pedestres sobre a citada ponte;
Considerando finalmente, que pela estrutura dessa ponte, fácil se torna a construção de uma passagem para pedestres pelo lado extremo da atual grade de proteção ficando, assim o atual estrado inteiramente livre para os veículos;
INDICO ao Sr Prefeito Municipal a urgente necessidade da construção, na mencionada ponte, de uma passagem para pedestres. Sala das Sessões, 12 de janeiro de 1948 – Roberto Grassi – “À Prefeitura”.


A reivindicação conforme citada acima não possui mais espaço na cidade de São Paulo, conforme acontecia anteriormente em décadas passadas, não há mais essa aproximação entre o cidadão e a representação política da cidade, e tudo esta atrelado a grandes projetos com grandes investimentos financeiros onde os empresários ditam as normas de reajustes no andamento da obra e aos contribuintes resta apenas aceitar as condições impostas. Tudo esta atrelado entre grandes empreiteiras e o poder administrativo da cidade e nem em pequenas obras de manutenção há locução entre as partes envolvidas do projeto e os munícipes, que se resigna a aceitara as condições impostas.

Segue a afirmação deste ponto de vista das pontes que já existem cruzando o Tietê próximo a Vila Anastácio, onde a primeira existente, finalizada em 1955, houve alguma participação da população. O Complexo Viário Rodovia dos Bandeirantes, inaugurada em 1995, pouco ou nenhuma participação existiu. A novo complexo que está prestes a cruzar novamente o rio Tietê entre a Vila Anastácio e Pirituba, para adensar a região com uma população flutuante, pouco há de explicação como será feito a nova estrutura viária, e há a falta de informação de projetos em andamento em toda a cidade!

Somente existe uma aproximação entre o poder político do executivo e o capital financeiro das grandes incorporadoras imobiliárias em detrimento da população que se fixou na região antes da mesma ter valor financeiro. Como romper essa resistência dessa quebra de paradigma dos que residem na vila e não abrem mão de seu espaço conquistado ao longo do tempo? 
Os mandatários aumentam os impostos prediais, essa é a fórmula de expulsar e destruir e reconstruir uma nova estrutura urbana!

Cada momento tem seu histórico.

Pontes existentes que ligam na Vila Anastácio, Lapa a complexos em rodovias:

A Ponte Atílio Fontana foi inaugurada em 1955, a Rodovia Anhanguera, no bairro da Lapa. A Ponte Ulysses Guimarães (Complexo Viário Rodovia dos Bandeirantes) foi inaugurada em 1994.

Uma nova ponte de um novo complexo entre a Vila Anastácio, na Lapa, e Pirituba


Uma nova ponte foi orçada em 70 milhões de reais e será construída partindo da Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, que ligará A Vila Anastácio, na Lapa, com Pirituba, projeto e obra a cargo da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras. Será um complexo viário com orçamento total "inicial" de 300 milhões de reais, recursos esses advindos da Operação Urbana Água Branca.  



Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, Vila Anastácio, na Lapa



Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, em Pirituba


Biografia de Raimundo Pereira de Magalhães

Raimundo Pereira de Magalhães nasceu em 1871, na pequena povoação de Vila Meã, Conselho de Amarante - Portugal. Veio para a Bahia em 1884, onde logo em 1891, se estabeleceu no local em que hoje em grande e belo edifício, está instalado a Sociedade Anônima Magalhães. Casou-se com Elisa Magalhães, com quem teve 8 filhos, fundador da firma Sá Ferreira & Magalhães, em sociedade com Sr. Domingos de Sá Ferreira, passando a denominar-se depois de Magalhães & Cia, a maior empresa do norte e nordeste Brasileiro, e a maior do Brasil na produção e comercialização do açúcar em todo território nacional. A Magalhães & Cia, terminou suas atividades comerciais, em 1978, já com a razão social de Sociedade Anônima Magalhães Comércio e Indústria, sob a gestão da quarta geração dos Magalhães na Bahia.
Passou a atuar também na indústria do açúcar, abrindo filiais no Rio de Janeiro e em Recife, que se ligaram as suas Refinações e usinas de açúcar em cuja atividade manteve preponderância em todo o Brasil.


Em 1924 fundou na Lapa, a Cia. Industrial Suburbana, depois denominada Companhia Suburbana Imobiliária. Custeou o saneamento desse local, aterrando-o, inclusive uma longa extensão do braço morto do rio Tietê, utilizando cerca de 3 milhões de metros cúbicos de terra. Imaginou, então, aproveitar essa grande área, para instalação de industriais e armazéns, dada a vizinhança com as duas estradas de ferro, Sorocabana e Santos - Jundiaí, as quais ligou os terrenos por ramais e sub-ramais, abrindo largas ruas de servidão, mandando construir os viadutos necessários, transformando aqueles terrenos em grande parque industrial, onde estão instaladas, entre outras, Anderson Clayton & Cia Ltda, Sociedade Técnica de Fundições Gerais (Sofunge), Armazéns Gerais do Estado de São Paulo, Moinho da Lapa Socil e Serrarias Lameirão. Para facilitar a vinda aos operários dessa indústria, localizadas na Vila Anastácio, a Companhia Suburbana. Doou uma gleba de terreno à Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, no Km. 88, entre as estações da Lapa e Pirituba, para ser construída uma estação de trens de subúrbios. Raimundo Pereira de Magalhães faleceu em 1934 em Portugal.

Petição popular para denominação da Avenida Raimundo Pereira de Magalhães em 1959





Crédito dos documentos: facebook.com/vilaanastácio


561ª Sessão Ordinária da Câmara Municipal em 23 de dezembro de 1959 e a Avenida Raimundo Pereira de Magalhães. Projeto de Lei 558/59 na íntegra


NOTA: Crônica sujeita a revisões para aprimoramento das informações e complemento da historiografia.

Referências:




quarta-feira, 13 de maio de 2015

SOFUNGE - Sociedade Técnica de Fundições Gerais S/A: Uma indústria pioneira na Vila Anastácio, Lapa

A Guerra de Movimento e a Destruição da Europa e sua Reconstrução

Terminada a 2ª Guerra Mundial a Europa estava destruída e combalida em sua estrutura de sustentação industrial, com uma população fragilizada pela miséria e a fome. A América, mais uma vez, foi a tábua de salvação para um grande contingente migratório.  Era necessário reerguer todos os países destruídos pelo confronto das superpotências bélicas de avançada industrialização.

O Plano Marshall dava o incentivo para que houvesse o mínimo de sustentabilidade governante aos países destruídos pelo conflito e cobrarem dos derrotados do Eixo, Itália, Alemanha e Japão o ressarcimento das perdas de guerra aos Aliados e para isso teriam que intensificar a produção ao extremo para voltar a serem grandes economias estáveis.

A América era o foco principal desses produtos fabricados para exportação e foi em larga escala expandido na década de 1950. Ousemos falar que as empresas automobilísticas cresceram imensamente a partir dessa década, pois toda a América Latina era movida pela força humana e de animais de tração, embora a energia elétrica fosse uma realidade existia um atraso tecnológico que seria compensado com a industrialização tardia do Brasil. Havia contribuído com o esforço de guerra com suas forças militares na 2ª Guerra enviando tropas regulares para a Itália, mas possuía equipamentos “obsoletos” das grandes indústrias estrangeiras e que eram ultrapassados, e teve que se adaptar as dificuldades do equipamento militar mais avançado e tecnologia que se apresentaram no conflito de certa forma compensada pela bravura de homens em formação em terreno inóspito e alheio, pois era inteiramente desconhecido todo aparato bélico de guerras de movimento e necessitava de treinamento específico.

O país tinha que sair de seu marasmo secular e abrir fronteiras para as novas realidades que adivinham da própria guerra que se travara em solo europeu onde se desenvolveram as maiores pesquisas tecnológicas dando origem a um novo porvir de possibilidades, inclusive em pesquisas industriais e laboratoriais, onde o conflito promoveu grandes experiências também no campo da medicina pelas mutilações ocorridas em escala sem precedentes e que necessitava de novas drogas para combater enfermidades e mutilações.

A AMÉRICA TORNOU-SE O CAMPO DAS POSSIBILIDADES NOVAMENTE

As possibilidades de desenvolvimento eram imensas e necessitava de mercados consumidores e de preferência “um lugar” que não tivesse sentido as agruras da miséria da guerra! Esse lugar era a América.

Internamente o Brasil defrontava-se com as mazelas políticas de uma ditadura embasada na sustentação da necessidade de se manter no poder pelas forças militares na luta contra Intentona Comunista de 1935. De 1937 a 1945 foi instituído no Brasil o Estado Novo regido por uma Constituição implantada em 1937 dando respaldo ao Estado Novo do governo de Getúlio Dorneles Vargas que governava sobre a égide da ditadura. Para que as regras do jogo político fossem restabelecidas a contento o governo brasileiro foi compensado com a implantação da Companhia Siderúrgica Nacional, CSN em Volta Redonda, Estado do Rio de Janeiro, fundada em 9 de abril de 1941 pelos Acordos de Washington promovido entre os países americanos onde os fundos participativos da iniciativa coube ao Export Import Bank, EXIMBANK.

Em 1º de outubro de 1946 foram iniciadas as atividades siderúrgicas, (sendo a siderurgia considerada a mãe de todas as indústrias) na CSN, concomitantemente no Brasil, com perfil de empresa pertencente ao Estado. Começava a produção de aços planos, o início da industrialização competitiva de mercado, pois produzindo a partir de minério nacional proveniente do Estado de Minas Gerias propiciava alta produção de ferro gusa nos altos fornos e transformação em aço de laminação a partir dos aços provenientes de fornos conversores, que eram preparados para as corridas constantes nos laminadores de rolos. Estava formada a interação aço e a indústria de transformação de produtos.

CICLO DOS VEÍCULOS AUTOMOTORES NO PAÍS

Em São Paulo burilava muitas pequenas empresas de transformação e já em 1931 foi formado o Instituto de Organização Racional do Trabalho (IDORT) que se preocupava com a organização empresarial e a capacitação profissional do operário. Roberto Mange, Roberto Simonsen e Euvaldo Lodi, nos anos de  1940 a 1942,  fundaram o Serviço Nacional de Aprendizado Industrial, SENAI, que daria qualificação a mão de obra, especializando a mesma em vários setores que se formava com o advento industrial moderno.
A ansiedade por uma indústria automobilística em território nacional era tão grande que foi até instituído em 13 de maio de 1934 o “Dia do Automóvel no Brasil” [1], sem ter uma indústria que realmente merecesse o titulo de produção de automóvel genuinamente nacional, pois todas as empresas que tinham suas marcas rodando no território nacional faziam suas montagens pelo processo CKD[2].

Existia antes desse “boom” industrial direcionada uma série de fábricas e oficinas de máquinas, como fundições, laminações do aço, instrumentos agrícolas, máquinas têxteis, enfim fábricas de peças, que manufaturavam e comercializavam máquinas em geral. No Censo Industrial de 1920 referentes ao Estado de São Paulo apontava-se 35 fundições e laminação de ferro e construção de máquinas, somado a 11 oficinas mecânicas de fabricação de peças perfazendo um total de 46 empresas (DGE/ MAIC. Recenseamento do Brasil 1920, vol. V. -primeira parte: indústria, Rio de Janeiro. Tipografia de Estatística, 1927)

Empresas de máquinas, oficinas mecânicas e fundições, São Paulo, 1919
(TABELA PARCIAL DE EMPRESAS EM SÃO PAULO)
EMPRESAS


Martins Barros (1911-16)
Capital


São Paulo
$ RÉIS


2.000.000
FUNC.


200



máquinas lavoura e indústria*
Mario Babbini & Irmão (1916)
São Paulo
200.000
95
máquinas lavoura e indústria*
Pirie & Villares (1918)
São Paulo
n.d.
n.d.
oficina mecânica*
L. Silva & Cia. Ltda. (1918)
São Paulo
400.000
4
Instrumentos agrícolas*
Oficina Craig Ltda. (1896)
São Paulo
675.931
117
máquinas diversas*
Vagnotti & Cia. (1900)
São Paulo
4.613.015
149
acessórios para máquinas têxteis*
Ind. Mecânica Cavallari (1905)
São Paulo
1.055.431
107
máquinas para papel e borracha*
José Dapice (1910)
São Paulo
28.000
máquinas tecidos*
Haupt & Cia. (1823)
São Paulo
371.942
28
bombas hidráulicas
Bardella Ind. Mecânicas (1911)
São Paulo
9.318.908
182
eixos e fundições de peças*
Puccetti & Cia. (1915)
São Paulo
266.642
18
máquinas para bebidas*
Henrique Grassmann F.(1917)
São Paulo
11.000
1
foices, arados, consertos
Lilla & Irmãos (1918)
São Paulo
285.842
30
torrador e máquinas*
Naschold (1897)
São Paulo
n.d.
120
n.d.
Fundição Progresso (1917)
São Paulo
n.d.
450
n.d.
Cia. Mecân. Importadora (1890)
São Paulo
10.000.000
n.d.
n.d.*

Fonte: DEIC/SACOP/SP. Boletim da Diretoria de Indústria e Comércio, Estatística Industrial. DEIC/SAIC/SP. São Paulo. Diário Oficial do Estado de São Paulo, 1919.
NOTA: * Empresas comprovadamente produtoras de máquinas em 1919;

n.d.= não disponível.

Pode ter havido anteriormente empresas de bens de capital (de produção) no Brasil para fabricar pequenos utensílios variados, ferramentas usadas na lavoura, como uma enxada, uma foice, facas de charruas para lavrar a terra para a agricultura também em transformação. O momento estava evidenciando um novo modelo de indústria para muitos setores com apresentação de novas tecnologias.
Muitos equipamentos da indústria nacional ainda estavam no estágio das máquinas a vapor impulsionadas por correias de couro comandados por um eixo motriz que transmitia toda a potência para as máquinas operatrizes como furadeiras, fresas, tornos, tambores de tratamento, enfim tudo que necessitasse movimento rotativo. Iniciava-se o ciclo da energia advinda da força geradora das hidroelétricas controladas pela Light and Power. 
A industrialização tardia do país iniciou-se nesta época conturbada da história mundial com uma guerra em andamento. Necessitava as indústrias de transformação do aço produzido pela Companhia Siderúrgica Nacional uma indústria que sustentasse a demanda de laminados, vergalhões e chapas e que produzissem bens de consumo, por exemplo, automóveis.   
Era necessário estruturar o suporte para a produção automobilística, como motores a explosão, blocos e cabeçotes e outras várias peças usadas em caminhões, automóveis, tratores, geradores, motores estacionários de grandes potências e impulsionados com combustível de hidrocarbonetos.

 “Sociedade Técnica de Fundições Gerais S/A”- SOFUNGE


A Sociedade Técnica de Fundições Gerais, SOFUNGE, foi fundada em 23 de dezembro de 1941, conforme certificado da Junta Comercial do Estado de São Paulo e registro número 15.924, apresentado por seiscentas e cinqüenta ações de valor nominal Rs 1:000$000 (um conto de réis) cada uma conforme indicado em ata da assembléia geral de sua realização realizada em 15 de dezembro de 1941, e publicado em Diário Oficial de 1º janeiro de 1942. Tinha como objetivo inicial a fabricação de rodas e peças de ferro fundido cinzento para vagões ferroviários e peças diversas, em um momento em que as ferrovias viam-se ameaçadas de paralisação em seus serviços por falta de rodas e equipamentos diversos para vagões. 




Em 1942, em um modesto galpão de madeira, à Rua Camacan, número 210, na Vila Anastácio houve início a produção da SOFUNGE.

O registro em São Paulo da indústria automobilística no Brasil foi forjado na Sociedade Técnica de Fundições Gerais S/A, SOFUNGE, e seus operários com sua matriz de produção que expandindo sua produção teve um segundo endereço também situada na Vila Anastácio, na Rua Bartolomeu Paes, nº 136, Lapa, um quarteirão inteiro, formado pelas ruas Camacan, Raimundo Pereira de Magalhães, onde também havia a Mafersa, próxima ao Quartel do Exército, indústria de trucks e vagões ferroviários, que muito contribuiu para fabricação do metrô paulistano, desativada em 1994 e que hoje é a empresa Alstom, grupo industrial francês associado com suportes de know-how multinacional. Evidentemente que na Lapa existiam, à época, grandes empresas de peso para o desenvolvimento de São Paulo e por conseqüência do Brasil.

Neste quarteirão onde estava instalada a Mafersa havia um galpão de madeira onde se montou um rinque, que às sextas-feiras a “casa” enchia de operários em busca de divertimento, que apreciavam o boxe amador, para assistirem duelos de pugilistas amadores. 
Além disso, existiam os torneios futebolísticos entre empresas muito em voga na época que fomentava grandes torneios entre as várias empresas que circundavam o Bairro da Lapa.


A Rua Camacan, na hora do almoço, era uma verdadeira legião de homens que transitavam sem parar. Os bares estavam sempre entupidos de operários, a tomar algum aperitivo para aguçar a fome, que era saciada nos restaurantes da empresa, divididos por escalas de horários, pois havia milhares de colaboradores para movimentar o complexo sistema da fundição. Em volta nas calçadas era uma verdadeira feira de produtos comercializados por vendedores informais.




Em 1947 a Comissão de Similares do Ministério da Fazenda examinando as rodas de vagões ferroviários produzidos pela SOFUNGE considerou-as iguais aos produtos importados, conforme circular nº 3 do Ministério da Fazenda, publicado em 12 de fevereiro de 1948 pelo Ministério da Fazenda. Abria-se deste modo o campo da produção de peças para a indústria de transformação que sentiam dificuldades no abastecimento de peças em ferro fundido. Deste modo uma vasta gama de empresas do setor da indústria automobilística que já tinha no território nacional veículos importados de suas sedes optaram em fabricar algumas peças para facilitar a manutenção desses veículos que eram produzidos no exterior.

Fabricantes como Mercedes Benz (que depois se tornou a maior acionista da SOFUNGE), General Motors, Ford Motor Company, Volkswagen, Willys Overland, DKW Vemag, além de ZF, MWM, Caterpillar e outras tantas optaram por fundir peças sobressalentes para equipar seus veículos ou manter a manutenção de equipamentos diversos. Podia-se citar uma gama muito grande de outras empresas que se serviram dos préstimos da empresa Sofunge nos primórdios da industrialização do país.

Desta maneira é iniciada a produção das peças de reposição para o setor automotivo para a demanda do mercado interno que exigia a produção de blocos e cabeçotes de motores, bombas de água, caixas de cambio, mancais, polias, tambores de freios, coletores e outras peças componentes do conjunto motriz de um veículo.

O momento era propício havendo um rápido crescimento da SOFUNGE que necessitava de novos equipamentos para a fabricação de peças em série ou de reposição. Houve maior investimento em mão de obra para movimentar todos esses maquinários que na década de 1950 atingia a marca de 1300 funcionários apoiado por um corpo de engenheiros com conhecimento de metalurgia nas instalações da Vila Anastácio, na Lapa, sendo que a produção estava instalada no quadrilátero das divisas da empresa Anderson Clayton, Rua Camacan, Rua Bartolomeu Paes e o desvio ferroviário estava instalada toda a produção fabril em uma área de 36.302,40 metros quadrados, sem computar a modelação do lado oposto da Rua Bartolomeu Paes e escritórios de recursos humanos. 

Fechando o quadrilátero estava a Rua Campos Vergueiro, paralela à Rua Bartolomeu Paes, por onde adentrava os trens de carga das empresas vizinhas, inclusive a SOFUNGE, que fazia parte deste complexo onde se implantou os primórdios antecessores do advento automobilístico nacional.


Em 1958 para atingir patamares maiores de produção de blocos para motores e peças do setor automobilístico uma nova fundição entrou em operação possibilitando aumentar para um pouco mais de 10.000 toneladas de peças fundidas sendo incorporadas duas novas estruturas da construção do ferro fundido, surgindo o ferro fundido maleável e nodular, este último já conhecido na Alemanha desde a década de 1930, sendo que a associação com a Mercedes-Benz (Daimler-Benz) trazia para ao setor as tendências do mercado mundial.


Em 1980 a SOFUNGE atingiu o recorde de produção com 69.800 toneladas de peças produzidas em ferro fundido cinzento, maleável e nodular, mas a crise do início da mesma década comprometeu o setor de fundição e a SOFUNGE em 1983 reduzia o número de funcionários para 1300 colaboradores e produziu 28.434 toneladas de peças fundidas. O ferro fundido cinzento, que antes era o material do maior número de peças da empresa, perde espaço para o ferro fundido nodular e a SOFUNGE acompanha a tendência incorporando-o aos seus produtos.

MATERIAL FUNDIDO

Uma massa humana toda acinzentada pela cor do uniforme e pela fuligem proveniente do ambiente insalubre, transpiravam o odor do ferro saído dos "fornos cubilô", abastecidos com um reagente calcário, o combustível carvão e a carga de ferro, que se tornava incandescente a jorrar pelas bicas de saída, enchendo as panelas de vazamento de líquido fundente transportado por pontes rolantes por cima de caixas previamente preparadas para fabricar um cabeçote de motor, um bloco, um coletor de escapamento, um diferencial de caminhão, uma roda de trem. As empilhadeiras removiam as peças retiradas das caixas para os pátios de expedição, para serem enviadas as empresas montadoras de veículos.


O mercado brasileiro ainda era tímido na década de 1940, pois se baseava basicamente na produção agrícola escoada pelas companhias de estradas de ferro que se interligava com o porto de Santos o principal do país. A SOFUNGE aprimorava-se na qualidade de seus produtos e oferecia peças em ferro fundido de alta resistência mecânica. 

O “carro chefe” eram as rodas ferroviárias e para melhorar o processo introduziu-se na produção o sistema duplex agregando a fusão dos fornos cubilôs com os fornos elétricos gerando uma melhor qualidade do ferro fundido produzido. Houve significativo aumento e no ano de 1950 onde se atingiu uma produção diária em turno de dez horas de 2.200 toneladas. A SOFUNGE destacou-se pelo alto desenvolvimento técnico de peças em ferro fundido e abastecia o setor ferroviário com rodas, produto este que atingiu na época uma demanda de 90 rodas por dia.

Com um planejamento metódico e encontrando no mercado um profissional especialista americano que aprimorou a técnica e qualidade necessária a SOFUNGE foi abalizada em 1947 pela Comissão de Similares do Ministério da Fazenda como possuindo qualidade nas rodas produzidas como sendo similares aos produtos importados, conforme circular número 3, de 7 de fevereiro de 1948 e publicado no Diário Oficial da União de 12 de fevereiro de 1948.


 SANTA CRUZ, BOLÍVIA



Começava nova etapa de empresa que passava a exportar rodas ferroviárias para a América Latina.






A SOFUNGE produzia peças de poucos gramas chegando atingir até três toneladas. Era bem diversificada a produção sendo carcaças, bases de máquinas e suportes, volantes, polias para motores elétricos e geradores, peças para equipamentos domésticos como máquinas de costura e de lavar roupas, peças de fogões, batedeiras e geladeiras, peças hospitalares, e peças para equipamentos industriais em geral.

O ferro fundido recebia muitas designações, maleável, nodular, cinzento, produzidos por fórmulas bem protegidas como segredos industriais, mas todos preparados com muito esmero por homens gabaritados na arte metalúrgica.


A fabricação de rodas para vagões ferroviários atingiu a marca de 1.000.000 em 1974, ano que se limitou para a substituição das rodas produzidas em ferro fundido coquilhado por rodas de aço ou forjadas.  


Terminava assim um ciclo e iniciava-se outro, pois a Mercedes Benz, acionista da SOFUNGE desde 1969, ganhava mais espaço para produzir para sua demanda crescente e deste modo a fundição passa a produzir ainda algumas peças diversificadas de algumas empresas, mas paulatinamente acaba se especializando no setor automobilístico.


Na década de 1970 a empresa começou a trabalhar também no período noturno atingindo cifras próximas de 64 mil toneladas por ano de peças produzidas, exigindo modernização e ampliando o quadro de funcionários para aproximadamente 3.600 colaboradores dividido em varias áreas, onde o mais elevado estava na estrutura manufatureira.

No saguão da entrada principal, onde se recebiam as visitas, estava a primeira roda produzida em ferro fundido cinzento, fabricada em 1942, exemplar de tantas quanto foram feitas pela SOFUNGE, e na parede estava exposta uma imagem entalhada de Santa Bárbara, protetora dos operários que manipulam a arte de fundição, daqueles que operam com o perigo do fogo.
A data de 5 - 10 - 1982 fundida na peça representa a primeira a primeira corrida de ferro da Central de Fusão onde estavam instalados um forno cubilô e dois fornos de indução produzindo todo o metal necessário usado na produção de peças na SOFUNGE.


MODELAÇÃO





A indústria possuía uma mão de obra especializada que provinha de muitos lugares, imigrantes e migrantes, que se deslocavam para o maior pólo industrial que era São Paulo, na comumente denominada “industrialização tardia”, e que foram sendo lapidados como pedra bruta e se tornaram mestres fundidores do ferro e muito contribuíram na formação da mão de obra deste segmento.
Poder-se-ia citar também nomes de grandes mestres desta arte, do setor de modelação fabricadas em madeira, verdadeiras obras de arte, que fariam inveja aos grandes escultores do Renascimento italiano, ou as curvas de entalhadores barrocos, mas eram mestres artistas da indústria, e esse era seu maior mérito: eram incansáveis e incessantes artistas de produzir a arte industrial.

MOLDAGEM

Deste modo intensifica-se a produção de fundidos no Brasil, e marca o início da produção em massa de peças. 


MÁQUINA DE MOLDAR

O preparo das caixas para fundidos eram  preenchidas com areia fina que eram proveniente de uma central de fornecimento, eram compactadas em máquinas de alta pressão que “martelavam” a areia moldando-a, previamente preparada com alguns "ingredientes", como milho em farelo finíssimo (mogul), açúcar refinado, separados em baias de madeira, ligados com algum aglutinante que unia essa massa. 


CROQUI CENTRAL DE AREIA

 MISTURADOR DE AREIA

Duas caixas distintas, o fundo e a tampa, recebiam, no interior desta cavidade, outras peças, denominadas de "macho", também feitas de areia finíssima, quando cozidas (curadas) em maquinas aquecidas ficavam com tom amarronzado. Depois, como um quebra cabeça, era montado e iria formar o corpo e as cavidades de um bloco, ou cabeçote de motor, ou outro componente automotivo. As areias eram recolhidas em compartimentos, (baias) provenientes do interior de São Paulo, como por exemplo, da cidade de Descalvado.

No campo da moldagem em areia a empresa possuía até a década de 1980 máquinas antigas individualizadas que já não produziam a demanda necessária para abastecer a indústria de autopeças e então houve por bem importar um complexo industrial de moldagem em areia provenientes da cidade de Modena, na Itália, e dar continuidade de um novo ciclo de progresso na produção de ferrosos.

MACHARIA

No campo de produção de machos, que faz o corpo interno das peças que representam a parte vazia das mesmas, tinham as denominadas Hoper TF 48, de fabricação alemã que abastecia a demanda dos motores da Daimler-Benz.







PACOTE DE MACHOS DE 6 CILINDROS COM CAIXA DE ENGRENAGEM EM PINTURA

Havia também a produção das camisas de pistão do Fusca, que evidentemente pertencia a montadora Volkswagen, produzidas com areia Shell que encapsulava a liga de alumínio saindo duas camisas do motor a ar do “carro do século” em cada forma de macharia num forno circular denominado Carrossel.

UM MOMENTO ÉPICO DA INDÚSTRIA NACIONAL

Foi na SOFUNGE que o presidente do Brasil, Juscelino Kubitschek, segurou o volante da panela de vazamento do primeiro bloco de motor do caminhão L-312, O Torpedo, encomendado pela Mercedes Benz, em 21 de dezembro de 1955, dando início à indústria automobilística do país, embora o país já montasse caminhões com peças importadas.

DESATIVAÇÃO DA SOFUNGE

O desenvolvimento da indústria em expansão no Brasil muito contribuiu para o crescimento da cidade de São Paulo, e a SOFUNGE consolidou o moderno campo industrial, e seus colaboradores contribuíram de maneira incisiva nesta expansão preparando com o pioneirismo e do progresso produtivo nacional.

Em 06 de agosto de 1996, foi anunciada a liquidação da empresa, sendo que os bancos ficaram com parte da fatia de investimentos, consorciados a outros interessados deste marco da história iniciada em 1941 e que representou a implantação das  indústrias automobilísticas no país e o pioneirismo deste segmento na América Latina.

Parte do equipamento da SOFUNGE foi transferido mais tarde para a Fundição Tupy, em Joinville, Santa Catarina, sendo que o Bradesco, as Fundações de fundo de participação PREVI e TELOS assumiram o comando da empresa.

Fim de mais um capítulo da indústria nacional na Cidade de São Paulo que representou o crescimento da produção no Brasil, hoje apenas uma recordação de um passado glorioso!  

NOTA: Crônica sujeita a revisões para aprimoramento das informações e complemento da historiografia.


Referencias Bibliográficas:




Jornal o Estado de São Paulo, 21 de Outubro de 1995

Jornal do Carro-O Estado de São Paulo, 13-05-2015, folhas 14 e 15D

SAES, Flávio; NOZOE, Nelson.A Indústria Paulista da Crise de 1929 Ao Plano de Metas.pdf –

Boletim Informativo da Associação Desportiva Classista Sofunge, Ano 1, nº 2

A História da SOFUNGE-1942-1992. São Paulo: DBA Artes Gráficas Ltda, 1992

Vide Tema:

As Indústrias Villares, o Piso da Fábrica, a Cidade de São Paulo e Santo Amaro




[1] O “Dia do Automóvel e da Estrada de Rodagem” no Brasil foi criado em 1934 pelo presidente Getúlio Vargas em homenagem a primeira estrada pavimentada e sinalizada do Brasil denominada de Rio – Petrópolis, de 66 quilômetros, inaugurada em 13 de maio de 1926, recebeu o nome do ex-presidente da República do Brasil, Washington Luís, ironicamente deposto pelo mesmo Getúlio Vargas no Golpe de 1930. A referida estrada liga a Praça Mauá no centro da cidade do Rio de Janeiro, passando pela Serra dos Órgãos, chegando a Petrópolis, a Cidade Imperial. (Jornal do Carro/O Estado de São Paulo, 13 de maio de 2015, folhas 14 e 15D)

[2] Completely Knock-Down ou Complete Knock-Down são conjuntos de partes de automóveis   geralmente fabricados pela matriz de origem ou pelo seu centro de produção para exportação e posterior montagem dos veículos nos países receptores destes kits, geralmente fábricas menores ou com produção reduzida. Os kits visam o ganho de escala das empresas, pois são produzidos um maior número de peças neste mesmo centro de produção; obtendo benefício fiscal de importação, uma vez que os veículos são montados no país de destino,(na época o Brasil) gerando empregos, ao contrário dos veículos importados já montados; menores custos na montadora de destino, já que são necessários pequenos investimentos para desenvolvimento de fornecedores locais.