quarta-feira, 5 de julho de 2017

A ÁRVORE E O HOMEM ANDARÃO JUNTOS ATÉ O FIM

(Uma relação de destruição!)

Uma árvore tem todo direito de existir,
mesmo que o homem não queira.

No campo ela produz sustento.
Na cidade suas folhas “fazem sujeira”, diz o homem!
Ela, mesmo assim, lhe dá o melhor de si,
embora ele não lhe dê nada em retribuição.

Todos gostam de sua sombra,
mas ninguém quer plantar uma!

E mesmo que seja rejeitada,
ela ainda resiste aos maus tratos recebidos
e insiste em sobreviver.

Limpa o ar do gás carbônico da imundice humana
e devolve oxigênio limpo para o homem respirar!
Esse ingrato ainda assim não a estima.

Umas dão-lhe frutos para prosseguir a caminhada
e de recompensa recebe o machado em seu corpo,
derramando o sangue de sua seiva
para gerar lucro repentino.

O sustento da vida é sempre necessário
e o homem enxerga nela apenas “sua ganância imediata”.
Na floresta suas folhas caem no outono
e aduba a terra para reviver a primavera florida!
O homem é um eterno inverno,
queimando no verão, sua infelicidade!


Um dia o homem vagará solitário no planeta,
E depois os dois se unirão no último tronco:
a árvore cobrirá seu corpo inerte sem vida,
e os dois serão vizinhos 
e apodrecerão juntos no solo da Terra!

sábado, 1 de julho de 2017

A GREVE GERAL DE JULHO DE 1917: O CENTENÁRIO DO PRIMEIRO GRANDE CONFLITO ENTRE O TRABALHO E O CAPITAL NO BRASIL

O TRABALHADOR E A CAUSA SOCIAL

A tensão social das relações de trabalho do início do século 20 teve grande repercussão na cidade de São Paulo, provocada por uma crise econômica intensa, sendo parte disso a Primeira Grande Guerra na Europa, conflito beligerante que afetava a economia de vários países.

Em 1916, o custo de vida no Brasil aumentava na ordem de 16% em comparação ao ano de 1914, enquanto os salários aumentaram apenas em 1%. Em 1917 esses índices eram de 28% em aumento de preços e apenas 7% para os salários. Havia denúncias de especuladores que se aproveitavam da crise e subiam os preços dos produtos de primeira necessidade, do pão em particular.

A luta dos trabalhadores teve primeiramente como intenção primordial a jornada de oito horas. A greve acontecida em 1917 correspondia às aspirações mais de caráter social. A partir do mês de abril, foram realizadas várias reuniões, folhetos distribuídos para uma  chamada popular para combater a crise. Os jornais de grande circulação não divulgaram como deveriam, ou pouca importância deram aos acontecimentos e algumas redações emudeceram e somente jornais de caráter informativo dos trabalhadores se manifestaram como o “A Guerra Social”, “A Plebe”, “Avanti!”, “La Battaglia”, “O Amigo do Povo” entre outros.

Os efeitos são pontuais do movimento da massa de trabalhadores em São Paulo e os mesmos foram incentivados a manifestarem seu descontentamento com a situação de miséria que viviam e as precárias condições de trabalho nas fábricas.

O informativo jornalístico “A Guerra Social” congratulava-se com este despertar da consciência da classe operária.

Os trabalhadores de São Paulo estão em pé de guerra, finalmente reivindicam o seu direito à vida; de se livrar finalmente de apatia que os fez escravos dóceis, prontos para todas as condições servis, digno de todos os abusos, esquecidos de si mesmos, sempre humildes e submissos, sob um jugo constante. Congratulamo-nos com este despertar da consciência proletária que começa com um ato digno: a abolição do imposto de guerra[1] para os trabalhadores das fábricas. O movimento grevista de 1917 expôs desafios para os italianos de São Paulo em sua relação com o movimento operário, pois a comunidade de imigrados italianos estava sujeita às pressões dos comitês locais de arrecadação de fundos para o Exército italiano em guerra, sem contar que não poucas famílias tinham parentes na frente na Europa. As sociedades de socorro mútuo italianas no exterior apoiavam a guerra, em conjunto com toda aquela parte do empresariado imigrado entusiastas do conflito pelos ideais da pátria.

Para explicar esse despertar, o jornal faz a ligação entre os protestos do trabalho e a guerra mundial: como um primeiro passo, os trabalhadores aceitaram as restrições impostas pela crise, especialmente pelo medo do desemprego. Mas observando que a guerra não impedia que os especuladores prosperassem, pelo contrário, a massa proletária de São Paulo revoltou-se:

“O aumento do custo de vida e em particular o aumento do preço do pão, depende na verdade de causas gerais relacionadas com a conduta da grande conflagração de três anos afetando a humanidade na guerra, para satisfazer o prazer de um punhado de bandidos imperiais que estabeleceram a lei comum no privilégio econômico sem interesse de um Estado Social. Mas o efeito destas causas gerais pode ser encontradas nas atividades especulativas de sete ou oito ignorantes, que os reis podem fazer de comandantes, mas que não são menos que vulgares ladrões, bandidos das principais estradas de ferro, que impõem ao povo em geral, e ao proletariado em particular, o plano da fome.”

 As duas maiores empresas de São Paulo são os principais alvos dos ataques: As Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo, e o Cotonifício Rodolfo Crespi & Cia, ambos proprietários imigrantes italianos. O Cotonifício Crespi estava situado na Moóca, no quadrilátero da Rua dos Trilhos, Rua Visconde de Laguna, Rua Javari (paralela a dos Trilhos) e Rua Taquari, em terreno de 30 mil metros quadrados e 50 mil de construção iniciada em 1898, que em 1917 possuía  2 mil operários distribuídos em vários galpões, sendo o prédio principal formado em quatro andares com duas torres laterais.


O primeiro recebeu a carga de insultos por deter um monopólio sobre a farinha em São Paulo, o segundo detentor das empresas do fabrico do maior setor têxtil da América Latina e onde irá desencadear a primeira greve iniciada com ressalvas e pouca adesão em maio de 1917. A empresa estava com alta produção abastecendo até mercados externos naquele momento e havia anunciado que os trabalhadores teriam que fazer trabalho noturno extra, mas com uma agravante: não iriam receber nenhuma compensação financeira por isso, além de que, os salários fossem baixíssimos em relação a “carestia de vida” (hoje denominada inflação). Poderia disser-se que os salários estavam dentro dos limites mínimos de subsistência da prole do trabalhador! Era o mote usado pelas maiores empresas fixadas em São Paulo, isso já havia acontecido na fábrica de bebidas Companhia Antártica Paulista, também situada na Moóca, no verão quando o consumo de bebidas era maior exigia-se prologamento das horas trabalhadas sem acréscimos nos proventos.

A reação foi instantânea, algo teria que ser feito em resposta as arbitrariedades patronais. O movimento culpava os empresários pela teimosia em se recusar a ceder algumas exigências, ainda modestas e razoáveis, para os trabalhadores em geral, que continham ideais de anarquistas na maioria italianos e socialistas (o Partido Comunista Brasileiro só seria fundado em 25 de março de 1922) que tentavam unir suas forças na luta e de colaborarem entre si.

Poucos possuíam acesso aos artigos dos jornais e apenas algumas centenas de trabalhadores receberam instrução suficiente para deflagar uma greve pelos interesses comuns e necessitavam de alguma forma conseguir adeptos pela causa e procurando obter de alguma de maneira as condições minimas para organizarem-se.

Antes mesmo de a greve geral se espalhar prevista para julho, as proporções de uma revolta popular real, insiste na natureza de modo espontânea do protesto e relativiza a influência que pode ter ativistas revolucionárias entre os trabalhadores:

Talvez por força da situação de penúria dos trabalhadores de São Paulo por si mesmos articulam para a greve geral. Uns apelam por um modelo a ser seguido, com alguma orientação, algo que os reúna, os anime, colocando-os em ação.

 Os primeiros movimentos de abril e maio de 1917, são acompanhados por um novo protesto nos estabelecimentos dos Crespi, com participação dos anarquistas na organização do proletariado.

A GREVE DE JULHO

A situação endurece na metade do mês de junho de 1917, quando a greve é retomada nas indústrias Crespi. Neste momento, a recém-nascida imprensa anarquista em português, “A Plebe”, publica sobre as greves e manifestações de trabalhadores em São Paulo, onde seus principais editores são Edgard Leuenroth e Florentino de Carvalho, ambos anarquistas sindicalistas que enxergam condições para orientação e organização do movimento.

As greves e reuniões de associações trabalhistas são muito mais detalhadas neste momento, em um novo contexto, pois as fábricas prosperam com o conflito mundial abastecendo o mercado consumidor. Há, deste modo, maior ênfase na estrutura organizada e com movimento menos teórico para arregimentar os trabalhadores.

Rodolfo Crespi, insiste em não ceder aos grevistas, não sendo poupado de críticas. A greve dura vários dias nas fábricas Crespi. Uma manifestação de solidariedade com os trabalhadores organiza-se em 24 junho.



Quando a greve fica mais forte, os trabalhadores começam a parar as fábricas de Crespi, e articulam-se para angariarem alimentos, pois  o movimento se estende a outros setores com prologamento previsto para os meses de junho e julho.

O governador do Estado, Altino Arantes Marques, do Partido Republicano Paulista, através do Secretário de Estado dos Negócios da Justiça e Segurança Pública,, Elói de Miranda Chaves, convocam o delegado geral Tirso Martins para entrar em ação e reprimir as primeiras manifestações, enviando destacamento da Força Pública, que de imediato tenta desmerecer os anarquistas aos olhos dos trabalhadores pelo boato de que os anarquistas são agitadores e que vivem dependentes dos trabalhadores.

Mas estas  tentativas não ficam apenas no menosprezo por todas as greves ocorridas em São Paulo de julho de 1917 e as ações se tornam mais violentas entre as partes e o confronto é inevitável, iniciando a repressão sangrenta entre os grevistas do "Cotonifício Crespi" com as forças policiais.

Os jornais circulantes expõe com condescendência e paternalismo as "exaltações lamentáveis" dos trabalhadores:

“É compreensível até certo ponto esse espírito exaltado. Por um lado, a argumentação do aumento dos preços tem consequências  terríveis, e por outro lado, parece que os donos de alguns estabelecimentos industriais procuram se aproveitar da situação, mas seria razoável aumentar os salários equitativamente. A este estado de coisas, apesar dos constantes apelos da imprensa, nossos homens públicos, embalados em seu habitual amor pela tranquilidade e indiferença, não fazem nada para entender os homens do trabalho e a pobreza, e ninguém se importa com seu sofrimento. Isto explica, em certa medida, porque os trabalhadores perdem a paciência e gritam para serem ouvidos. No entanto, e não muito facilmente, o que é ainda menos justificado, foram os excessos em que muitos deles estão envolvidos, insultando e atacando os soldados que protegem os que não obedecem a greve e  querem executar seu dever profissional, tentando evitar que outros trabalhadores exerçam seu direito de trabalhar e, finalmente, causando ferimentos a si mesmos e também aos outros”.

Durante os confrontos com as forças de segurança, como publicado em matéria jornalística, "que fazem o seu dever" nestes dias sangrentos há apelo para não se confrontarem com as mulheres que aderiram a greve geral. Vários trabalhadores ficaram feridos, mas o mais grave ocorreu no Brás, em frente a fábrica têxtil Mariângela, de propriedade das Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo, IRFM, com um jovem espanhol de 21 anos, José Ineguez Martinez[2], atingido por projetil de arma de fogo em 9 de julho, morrendo dos ferimentos na Santa Casa de São Paulo.


A imprensa reproduzia várias vezes a versão policial segundo a qual Martinez foi atingido "por algo que os agitadores atiravam nas autoridades", acrescentando também outra versão que o destacamento atirou para proteger o delegado de polícia.




“Na manhã paulistana de 11 de julho de 1917, sob intenso frio e chuva fina, uma multidão se formou à frente da casa número 91 da rua Caetano Pinto, no bairro do Brás. Desde as sete horas, homens, mulheres e crianças acotovelavam-se e agitavam bandeiras vermelhas à espera do funeral. Por volta das oito horas e trinta minutos, o corpo de José Ignez Martinez deixou a casa dos seus familiares. Um imenso cortejo fúnebre pôs-se em movimento” – jornal Fanfulla de 12/7/1917. Empregado de uma sapataria na rua Caetano Pinto, o espanhol José Martinez fora baleado no peito, no dia anterior, na rua Monsenhor Andrade, e não resistiu aos ferimentos. 

A morte de Martinez foi o estopim sobre a população de trabalhadores de São Paulo para começarem a greve geral. Cinco mil pessoas seguiram o cortejo fúnebre de Martinez em 11 de julho, acompanhado de destacamento policial coordenado pelo delegado auxiliar Rudge Ramos em direção ao cemitério do Araçá. 



Operários marcham portando bandeiras negras pela cidade de São Paulo em 1917



Bandeiras tremulam em funeral de operário morto durante a greve geral de 1917

Vinte mil trabalhadores desde este momento conclamam intensificar a greve, e seu número continua a aumentar nos dias seguintes, alcançando quarenta mil e em 14 julho eram de cem mil, de acordo com o jornal “Fanfulla”[3] edição de 15 julho.

No dia do funeral de Martinez, os grevistas novamente enfrentaram as forças policiais, bem mais numerosas na capital do Estado de São Paulo. Depois do enterro do sapateiro, a multidão dirigiu-se ao centro da cidade deslocando toda a massa operária para a Praça da Sé onde seria realizado um grande comício de protesto. 

Começou-se com a exigência a reabertura das ligas operárias, proibidas anteriormente ao crime ocorrido, de funcionar pelos delegados dos bairro da  Moóca e Brás, onde se concentravam o maior número de fábricas. Além dessa proposta requeria-se também a libertação dos grevistas presos e a punição dos assassinos de Martinez. Ocorrem então as reações violentas entre os grevistas e a polícia que se encontrava no local, sendo que a construção da “nova” Catedral de São Paulo, foi usada como trincheira.

Com a violência generalizada as respostas dos grevistas recrudescem ficando mais intensas. Um ataque ao Moinho Santista[4], situada na Rua André Leão, no bairro da Moóca, é planejado e saqueado, sendo levadas 600 sacas de farinha de trigo e inutilizadas outras tantas.

Toda a cidade está paralisada; ficando sem eletricidade, sem gás, sem meios de transporte e sem pão.


Em 11 de julho, o Comite de Defesa Proletária[5] (CDP), ressurgimento de um comitê homônimo que havia sido criado em 1914, composto por seis pessoas, cinco anarquistas e um socialista, publica as intenções dos grevistas. Em 13 de julho uma mobilização militar está postada na cidade com um contingente de 7 mil milicianos, entre cavalaria e infantaria. Em 13 de julho, os confrontos fazem duas novas vítimas, uma menina de doze anos, atingida na cabeça por um projétil e um pedreiro, Nicola Salerno. O Comitê recusa-se a tratar diretamente com as autoridades, mas aceita, no entanto, conversar com uma intermediação, no caso jornalistas. Dez jornalistas manifestam-se em 14 de julho, oferecendo-se para servir como intermediários entre o CDP, a indústria e o governo. O motivo dessa intermediação é duplo: há uma simpatia pela causa dos trabalhadores e o desejo de retornar a normalidade.

As negociações duram vários dias no final dos quais os jornais de São Paulo publicam o texto dos compromissos da indústria e do governo[6].

Estes compromissos são consistentes com as demandas dos grevistas. Estes requerem um aumento de 20% de 25% para salários de vencimentos baixos, considerando que eles pediram respectivamente 25% e 35%, sendo este último percentual referido aos que recebiam até 5$000 (réis).

Os industriais prometem-lhes também o pagamento regular dos salários quinzenalmente conforma apresentada na reivindicação dos trabalhadores. Asseguram ainda que será respeitado o direito firmado entre as partes e que não haverá nenhuma retaliação contra os trabalhadores grevistas.

Jorge Luís Gustavo Street[7], industrial proprietário da Companhia Nacional de Tecidos de Juta, no bairro do Belém, São Paulo, defendeu as reivindicações operárias junto ao patronato durante a greve daquele ano na capital paulista, após atendê-las em suas fábricas concedendo percentual requerido aos trabalhadores, recebendo críticas do empresariado[8], mas seguido por outros que desejavam produzir seus bens de consumo.

Finalmente, alegavam que "com a melhor boa vontade iria ser tomadas iniciativas para melhorar as condições morais, materiais e econômicas dos trabalhadores em São Paulo."

Por parte dos representantes do governo, os grevistas obtém a palavra de que pessoas presas por motivo da greve seriam soltas com a retomada do trabalho. O direito de reunião é reconhecido dentro dos limites impostos pela lei.

Sobre o trabalho de menores, trabalho noturno das mulheres e menores de 18 anos, os preços de produtos de primeira necessidade, o controle de preços de produtos alimentares, as autoridades públicas falavam que iriam "redobrar os esforços" e "estudar medidas viáveis", "interessados no que estivessem ao seu alcance" para conter os abusos.

Na contra proposta que atendia os compromissos da indústria e do governo, o CDP reiterava suas reivindicações sobre esses pontos mas não obteve resposta, e outros pontos que também ficaram sem resposta, tais como a garantia de emprego, o compromisso das 8 horas diárias de trabalho e a semana inglesa (8), o aumento de 50% para horas extras e a redução dos preços dos aluguéis de habitação.

Em 16 de julho de 1917, várias reuniões são organizadas no decurso da qual os membros CDP formularam o texto redigidos das propostas dos grevistas. O Comitê propõe-se a retomar o trabalho e se caso os compromissos não fossem assumidos iriam retomar a greve. O movimento é aplaudido por milhares de pessoas. Embora reconhecendo que todas as reivindicações não foram satisfeitas, o Comitê considerou uma vitória grandiosa, principalmente em relação ao direito dos trabalhadores, e que está vitória seria o ponto de partida para novas conquistas.

Deste modo  o Comitê anunciou o fim da greve!

O DESCUMPRIMENTO DO ACORDO

Os jornais “A Guerra Social” e “A Plebe” fazem o balanço da greve. Os jornais consideram falhas no processo em relação ao balanço do Comitê.

“A Guerra Social” publicou um artigo com o sugestivo título: "Vittoria"?

O proletariado de São Paulo não havia conseguido tudo o que pretendia, longe disso. No entanto, ele obteve uma vitória contra o Estado, que a greve geral obrigou-o a fazer concessões ante a pressão dos grevistas.

De acordo com “A Plebe”, os trabalhadores não estavam unidos ou não se motivaram suficientemente, pois não impuseram completamente sua direitos básicos. Em cidades do Interior do Estado de São Paulo, greves também foram realizadas, acontecidas mais tarde em comparação com os eventos de São Paulo, como em 15 de julho, em Santos, mas especialmente em 16 e 17. O jornal “A Guerra Social” expôs que devido a este atraso entre o interior e a capital a decisão do Comitê de Defesa Proletária, aconselhava o fim da greve e a aceitação da compromissos com os patrões e o Estado, com a intermediação dos jornalistas da grande imprensa.

De fato, em 13 de julho, depois de anunciada o final da greve as forças policiais de todo o Estado de São Paulo concentraram-se na capital. Se os movimentos tivessem sidos solidários e mais rápidos anteriormente, os grevistas de São Paulo poderia resistir muito mais.

Neste momento os ventos favoráveis aos trabalhadores mudaram, porque baixaram a guarda e tiveram que enfrentar as evidências da articulação imediata do Estado. O equilíbrio de poder agora era desfavorável pois deixaram o Estado reorganizar suas forças com a conivência dos industriais atingidos:

Na noite de 13 para 14 de julho, todas as forças policias estadual e federal, que estavam estacionadas em cidades próximas, foram remanejadas e concentradas em São Paulo. Em todas as ruas foram posicionadas metralhadoras para “restabelecerem a ordem”.

Se o governo não poderia ter outras forças que aquelas do início do confronto,  agora todo contingente possível de agrupar-se estavam baseadas na capital. Se os trabalhadores de São Paulo recebessem apoio do Interior do Estado, ter-se-ia evitado que outras forças policiais deslocassem de todos os lados da cidade e poderia supor-se, não que uma Revolução Social eclodisse por completo, mas teria sido uma vitória considerável dos trabalhadores e seus pedidos seriam cumpridos na integra pelo governo e pelos industriais.

A COLHEITA GERMINA

Neste momento o proletariado de São Paulo era composto em sua grande maioria de imigrantes italianos, especialmente no setor têxtil, onde a greve começou, embora houvesse pequenos focos em pequenas indústrias.

Houve na análise do movimento maus profetas e psicólogos, pois não compreenderam as classes trabalhadoras, e que a fome transbordou além dos limites suportáveis, pois as famílias reclamavam unicamente o alimento indispensável.

Embora o movimento popular de julho de 1917 foi "uma greve pela fome em vez de uma greve pelo trabalho",  a grande imprensa de São Paulo atribui a greve a influência dos líderes estrangeiros, principalmente os anarquistas e sua propaganda, mas outros acreditavam no desencadeamento espontâneo da greve:

“Não negamos a nossa responsabilidade em todos estes movimentos de trabalhadores. Pelo contrário, estamos orgulhosos disso. Mas é uma responsabilidade indireta. Por muitos anos, nós nos esforçamos para sair desta apatia do proletariado, para dar-lhe unidade. O trabalho foi feito em todos os lugares e parece que agora os primeiros frutos do trabalho amadureceram, embora em muitas comunidades remotas a propaganda infelizmente não penetrasse com facilidade”.

Se a crise econômica e os baixos salários e preços excessivos dos produtos básicos são as principais causas da greve geral de julho de 1917, não se pode negligenciar a mudança psicológica que ocorreu entre os imigrantes, agora instalados no Brasil por muitos anos (60% de estrangeiros e 80% dos italianos, chegaram no Brasil antes de 1905) e, que sabem que não voltarão para seu país de origem e que assim sendo estão dispostos a defender seus interesses em seu novo país, o Brasil! Os trabalhadores estrangeiros foram aos poucos se adaptando, constituindo famílias, alguns conseguiram a nacionalidade brasileira e tendo perdido a esperança de retornar à sua terra natal, eles começaram a se preocupar seriamente com seus salários e condições de vida na nova Pátria.

O mês de julho de 1917 marcou a história do movimento social no Brasil. O movimento resultou em uma vitória, embora parcial, da vontade de trabalhadores, mas os acontecimentos pós greve vai expor uma derrota inesperada pela ação direta do governo.

UMA VITÓRIA DE PIRRO[9]

O Estado e patrões não cumpririam as reivindicações assumidas no fervor do momento das paralisações!

Um mês depois da greve, o aumento de 20% prometido pelos empresários não foi cumprida. Além disso, no final de julho, pessoas presas durante a greve ainda não haviam sido libertadas, contrariando os compromissos assumidos pelas autoridades ao Comitê dos jornalistas:

A conduta das autoridades não podia surpreender a ponto do Secretário da Justiça desmerecer o pacto do Governo com os trabalhadores e os jornais não tratarem o caso com o devido merecimento em respeito ao trabalhadores que ficaram a mercê da retaliação vinda dos industriais, que não cumpririam o acordo e do governo que promoveria deportação da liderança grevista.

Somente a imprensa anarquista deu ênfase a este momento crucial revivendo a organização do trabalho, em consequência da greve de julho. 



Os grevistas que lideraram o movimento começaram a ser ameaçados de retaliação por parte das autoridades policiais, presos, processados e expulsos do Brasil, usando-se para isso a Lei Adolfo Gordo[10] que formulava as providências para expulsão de estrangeiros.

Havia no meio dos ativistas alguns infiltrados que  se venderam. Deste modo o movimento foi perdendo sua liderança e até uma falsa carta incriminadora era enviada a membros da liderança para impedi-los de aparecer em público e serem presos até com risco de deportação, se fossem estrangeiros. Havia agentes secretos por toda parte e a repressão recrudesceu.

As perseguições são iminentes e vão acontecendo por todos os redutos que se possa encontrar a liderança do movimento.

A retaliação começou verdadeiramente a menos de dois meses após a greve geral. A tipografia onde era impresso o jornal anarquista “A Plebe” foi cercada pela polícia, bem como o Centro Libertário de São Paulo. Edgard Leuenroth[11], acusado de ser o mentor ao ataque em 11 de junho ao Moinho Santista durante a greve geral, sendo aprisionado, e muitos ativistas são espancados ou aprisionados e ameaçados com a deportação. 

Nove pessoas foram deportadas a bordo do navio "Curvello" em rota para a Europa, e 15 outros são investigadas, entre eles, Gigi (Luigi) Damiani[12], que a nova equipe de elaboração do jornal “A Guerra Social” lamenta a ausência:

“Estamos perdendo, é verdade, a ajuda de Gigi Damiani procurado com ordem de expulsão do país e que se refugia no interior do estado, vítima de uma perseguição implacável”.

Damiani sabendo que estava sendo procurado refugia-se em local ignorado e em 3 de setembro de 1917  vê através do jornal “O Combate”, que ele está ameaçado de expulsão do território nacional. A justiça o procura até 15 de setembro. O advogado Evaristo de Morais, em 29 de outubro de 1917, entra com um pedido de habeas corpus em seu nome. Para demonstrar a ilegalidade da expulsão de Damiani, o advogado baseou-se na Constituição Federal que promulgava a não expulsão a quem tivesse residência fixa por mais de dois anos, demonstrando que Damiani possuía uma propriedade no Estado do Paraná, onde participou da implantação da Colônia Cecília, fundada por Giovanni Rossi, pagando os impostos, e que permaneceu neste local até 1912 residindo em uma propriedade de um “bem conhecido capitalista, que nem se pode ter suspeita de ter ideias contrárias à ordem pública", possuindo também uma carta de apresentação de uma das empresas Matarazzo "também acima de suspeita”. Ele contava ainda com várias ocupações profissionais, que no final do ano de 1913, exerceu sua profissão de decorador para a Câmara Municipal de Poços de Caldas e a Companhia Teatral de Jundiaí, em fevereiro de 1914. Finalmente, o advogado denunciou a perseguição a seu cliente, que era membro da comissão de trabalho e que integrou sim a greve de julho de 1917,  acusando o governo de ter quebrado sua palavra de não abrir processo contra os grevistas.

Em contraste, ao habeas corpus pedido ao mesmo tempo para Gigi Damiani, foi concedido sem demora ao chapeleiro José Sarmento Marques, ex-empregado da Estrada de Ferro Central, responsável pelo jornal “O Baluarte”, já possuindo sentença em Portugal, e que havia sido colocado junto com outros a bordo do navio Curvello. Neste caso específico havia a alegação que após a decisão do Supremo Tribunal Federal não se podia expulsar uma pessoa que havia completado um serviço público (José Sarmento Marques havia trabalhado em ferrovias brasileiras) e que estava de posse de um cartão de eleitor do Brasil[13].

EXPULSÕES DO ANO DE 1917

Muitos outros ativistas foram ameaçados de expulsão em retaliação a greve de 1917. Os registros são muito semelhantes entre si e denotam a procura de um pretexto para justificar a expulsão. Este pretexto encontrou-se rapidamente em todos os casos, usando um modelo padrão, onde o acusado admitisse ter participado da greve de 1917 e expressasse ser um anarquista ou socialista. Se alguém se expressasse ser socialista havia certa confusão com o  testemunho dos interrogatórios daqueles que se pronunciassem como anarquista. Deste modo as autoridades buscava concluir um dossiê que foi criado pela justiça brasileira para estes casos específicos. (Neste momento ambos grupos possuíam os mesmos ideais, embora diferenciassem em suas ideologias, separando suas convicções somente a partir da década de 1920).

As armas mais utilizadas pela repressão do Estado brasileiro, no período pós greve de 1917, foi a expulsão sumária dos militantes estrangeiros, só diminuindo a partir de 1921. Naquele momento, as lideranças sindicais e políticas de trabalhadores paulistanos eram na maioria dos casos estrangeiras e era necessário, por parte do poder, enfraquecer quaisquer focos de futuros movimentos e torná-los acéfalos.

Os processos de expulsão foram acompanhados de declaração de estado de sítio, com o fechamento dos comitês, das federações, dos socorros mútuos[14], dos grupos políticos e dos jornais operários.

Este “modus operandi” ocorreu entre 1917 e 1921, como resposta a um momento de organização da atividade político-sindical[15].

Mesmo pessoas próximas dos acusados ameaçados de expulsão os oprimiam com os piores adjetivos circulantes nas ruas como anarquistas reacionários, incorrigíveis anarquistas, libertários e perigosos, sendo estas expressões colocadas como parte dos registros para especificar a expulsão do país. Torna-se verdadeira “caça as bruxas”, no caso, caça aos líderes do movimento grevista!

O caso do colaborador do jornal Avanti![16], Teodoro Monicelli, é o melhor exemplo da incapacidade das autoridades de São Paulo em acompanhar os casos de expulsões. Com efeito, de acordo com o estabelecido em 1917, Monicelli conforme o processo deveria ser deportado em 11 de setembro de 1917, o que não aconteceu. O caso só voltou a ser analisado, após uma viagem que fez à Itália realizado três anos mais tarde, onde desejando retornar ao Brasil, foi impedido pelas autoridades brasileiras.

No auge dos acontecimentos, os jornais anarquistas sofrem o contragolpe da repressão. Edgard Leuenroth foi preso, e Francisco Azevedo Lomônaco passa então a ser responsável pela direção do jornal “A Plebe” que cessou sua publicação em 30 de outubro de 1917, por força da repressão violenta afetando a situação financeira do jornal. O jornal “A Guerra Social” sofreu também uma interrupção de um mês e meio, enquanto Gigi Damiani foi forçado a se esconder e um novo grupo foi criado para reativar e organizar o jornal em outubro. Este grupo, que publicou apenas o jornal número 56, era composto por Francesco Cianci, o diretor além de João da Costa Pimenta, Francisco Azevedo, Cleto Trombetti, Francisco Scudelario, Maria A. Soares e José Cardoso de Almeida. Se esta lista contém muito poucos nomes italianos, é provavelmente porque os operários brasileiros talvez não colaborassem até aquele momento para um jornal anarquista pelo pouco intendimento ideológico de contexto social. Note-se, pela primeira vez na equipe o nome de uma mulher, Maria A. Soares.

A MULHER E OS ANARQUISTAS ITALIANOS DE SÃO PAULO

As mulheres são efetivamente em menor número no movimento anarquista de 1917 em São Paulo, mas sua importância é considerável no trabalho do momento da greve, pois representava o maior contingente de mão de obra do setor têxtil. As italianas em particular são uma parte significativa desta mão de obra operária. Sua presença no movimento trabalhista está muitas vezes ligada à atividade cultural. As mulheres participam nas celebrações para a imprensa anarquista, nas trupes de teatro, quer representando nessas ocasiões, quer idealizando metas de ação. Sua participação ativa no movimento trabalhista em São Paulo aparece às vezes nos jornais, como em 1906, quando três mulheres lançam apelo aos trabalhadores na importância feminina em várias profissões, embora com maior ênfase na indústria têxtil. O objetivo maior é fomentar o interesse dos trabalhadores e tirá-los da "apatia dominante” o que os impediu de interessar-se pela greve geral de 1907 e defenderem interesses de condições básicas de subsistência da família, direitos e deveres que também pertencem as mulheres.

MULHERES ORADORAS

As mulheres muitas vezes preferiam o anonimato e apareciam pouco na imprensa anarquista. Houve alguns nomes que se sobressaíram como Emma Mennocchi (Ballerini?) Companheira de Gigi Damiani, integrante da  Associazione Femminile, associação de mulheres anarquistas italianas e Matilde Magrassi[17], esposa de Luigi Magrassi, ou Ines Betelli e Éster Marucci. Em alguns artigos do La Battaglia são assinados D. Giannini, ou "Uma jovem liberal". Enfim, alguns editores podem sentir a falta de nomes femininos no movimento, pois as mesmas escolhiam pseudônimos por vezes masculinos  para serem aceitas sem restrições.
Jornais anarquistas referem-se a Ernestina Lesina[18], a Giuseppina Stefani Bertacchi, professora de letras e de pedagogia, que fazia conferências sobre o tema do feminismo. Isabel Cerruti[19], Teresa Rocchi[20], Teresa Maria Carini[21]

Era muito raro que, nos textos que escreviam, mulheres darem seu ponto de vista sobre uma situação global, como faziamm os editores masculinos. Parece não haver essa conotação em citar os temas: as mulheres e a guerra, mulheres e o antimilitarismo, mulheres e a religião, o trabalho das mulheres, entre outros tantos assuntos. De acordo com as palavras dos editores femininos e masculinos da imprensa anarquista, a mulher é igual ao homem, mas, ao mesmo tempo, a mulher ainda são consideradas submissas em relação ao marido, ao filho, ao irmão[22].

No campo do trabalho, seus direitos são defendidos da mesma forma como os direitos dos homens, embora os salários não sejam de mesma proporção com atividades até semelhantes. Todas as reivindicações dos trabalhadores, em especial aqueles da greve de 1917, destinava-se a aliviar o trabalho das mulheres, proibindo o trabalho noturno e reduzindo carga horária. A igualdade de gênero deve ser para todos os humanos, deste modo não haverá mais um motivo para sujeição qualquer de pessoa. As projeções para o futuro, é este, dignidade de viver em um mundo melhor!

CONSIDERAÇÕES

Somente em 1º de maio de 1943 foi assinada pelo Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, Alexandre Marcondes Machado Filho, as reformas das relações de trabalho daquilo que era pauta imediata em 1917 como proibição do trabalho de menores e o pagamento de 50% de horas extras, itens consagrados com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
Reivindicações pautadas de 1917 só foram concluídas, em partes, por ironia, pelo autoritarismo do Estado Novo de Getúlio Dorneles Vargas, de 1937 a 1946, na época da Segunda Guerra Mundial ocorrido de 1939 a 1945. Este conflito foi a continuação do capítulo de Primeira Guerra mal terminada como ocorrido com a greve geral do movimento operário no Brasil de 1917! 
Em 1917 ninguém acreditava, ninguém esperava, desde o governo como até os líderes do movimento, todo mundo estava convencido de que nada poderia vir desta amálgama de migração de resíduos, se não a demissão ou até mesmo covardia.
Os trabalhadores não conseguiram tudo o que queriam, mas eles tiveram uma grande vitória, não só contra o Estado, não só contra a indústria, mas especialmente sobre si mesmos.


Espera-se a crítica ou informações que venham acrescentar valores nesta crônica! 

 

 

 

 

Bibliografia

 

FELICI, Isabelle. "Os italianos no movimento anarquista no Brasil, 1890-1920"

Todas as versões deste artigo:francês
Tese de doutorado, dir. Mario Fusco, co - dir. Jean-Charles Vegliante. Universidade da Sorbonne notícias-PARIS 3:1994.p.216 a 231-10º capítulo http://raforum.info/spip.php?article661 & lang = en
BIONDI, Luigi. Mãos unidas, corações divididos. As sociedades italianas de socorro mútuo em São Paulo na Primeira República: sua formação, suas lutas, suas festas http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-77042012000200004

 SANTOS, Kauan Willian dos. Derrubando Fronteiras: A Construção do Jornal A Plebe e o Internacionalismo Operário em São Paulo (1917-1920)  História e Cultura, Franca, v. 4, n. 1, p. 122-139, mar. 2015.

Lopreato, Christina Roquette.O Espírito da Revolta: A GREVE Geral de 1917. São Paulo: ANNABLUME, 2000

FAUSTO, Boris. Trabalho urbano e conflito social : 1890-1920 2ª - ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.


DULLES, John E. F. Anarchists and Communists in Brazil, 1900-1935. University of Texas Press, 1973

Alves, Paulo.A Verdade da Repressão: Práticas Penais e Outras Estratégias na Ordem Pública: 1890-1921, São Paulo: Editora Artes & Ciência/ unip, 1977

GONÇALVES, Caroline. Alma e Vida: Os Deslocamentos de Ernestina Lesina, O Cotidiano e a Luta das Mulheres Operárias

Exposição permanente do Museu da Casa Brasileira, Avenida Brig. Faria Lima, São Paulo, nº 2705















[1] A greve de 1917 possuía a característica de forte etnicidade, com grande presença de trabalhadores italianos, imigrantes de uma nação atuante na Primeira Guerra Global. Os empresários emergentes imigrados no Brasil, como fortes tendências nacionalistas pró Itália, possuíam interesses envolvidos no conflito e exigiam a contribuição mensal, por vezes até semanalmente para os comitês paulistanos que arrecadavam verbas para o Estado italiano, agravando condições precárias de vida e de trabalho desse momento conflitante na Europa, mas que afetava o trabalhador deste período e criando insatisfação dos operários destas empresas.

[2] “A notícia da morte de um operário, assassinado nas imediações de uma fábrica de tecidos do Brás, divulgou-se como um desafio à dignidade do proletariado. Caracterizou-se como um violento impacto emocional sacudindo todas as energias. O enterro dessa vitima da reação foi uma das mais impressionantes demonstrações populares até então verificadas em São Paulo. Partindo o feretro da Rua Caetano Pinto, no Brás, estendeu-se o cortejo, como um oceano humano, por toda a avenida Rangel Pestana até a então Ladeira do Carmo em caminho da Cidade, sob um silencio impressionante, que assumiu o aspecto de uma advertencia. Foram percorridas as principais ruas do centro. Debalde a Policia cercava os encontros de ruas. A multidão ia rompendo todos os cordões, prosseguindo sua impetuosa marca até o cemitério. À beira da sepultura revezaram os oradores, em indignadas manifestações de repulsa à reação.  No regresso do cemitério, uma parte da multidão reuniu-se em comicio na Praça da Sé; a outra parte desceu para o Brás, até à rua Caetano Pinto, onde, em frente à casa da familia do operario assassinado, foi realizado outro comicio. Sem que se possa precisar detalhes, verificou-se uma agitação entre a multidão estacionada nas imediações da avenida Rangel Pestana. Havia sido assaltada uma carrocinha de pão. Essa ocorrencia teve o efeito da chispa lançada ao rastilho de polvora. Parece ter servido ela de exemplo e estimulo para que a mesma ação fosse praticada em muitas partes da cidade. Feito que aconteceu com rapidez fulminante, como se um veiculo de comunicação de excepcional capacidade pusesse em contato todo o elemento popular paulistano. As fábricas e oficinas esvaziavam-se, enquanto as ruas se povoavam de multidões, movimentando-se agitadas em todos os sentidos.”
(Fragmento, conforme original publicado, da carta de Edgard Leunroth enviada ao jornal O Estado de São Paulo que havia sido citado em matéria de 2 de junho de 1917 como responsável pelo início das manifestações de greve)

[3] Originalmente o Fanfulla era um jornal editado por italianos, predominantemente em língua italiana, com a sua distribuição principalmente na cidade de São Paulo.  O FANFULLA começou a circular a partir de 1893 recebendo outras denominações ao longo do tempo. O jornal impresso deixou de circular em 2014 e é apresentado em portal eletrônico www.jornalfanfulla.com

[4] Atualmente empresa incorporada pelo Grupo BUNGE

[5] Diversas categorias cruzaram os braços em solidariedade as greves de julho de 1917, a saber: marceneiros, pedreiros, tecelões, sapateiros, costureiras, cozinheiras, chapeleiros e outras tantas que colaboraram no processo reivindicatório contribuindo com propostas. Desse momento surgiu o Comitê de Defesa Proletária, CPD, para articulações em prol dos trabalhadores, tendo em suas fileiras os anarquistas Edgard Leunroth e Gigi Damiani. 

[6] Acordo dos trabalhadores, patrões e governo na Greve de 1917 http://www.projetomemoria.art.br/RuiBarbosa/glossario/a/greve-1917.htm

[7] Idealizou também em 1912 a primeira vila operária do Brasil, a Vila Operária Maria Zélia.

(8) A expressão semana inglesa se refere a jornada de trabalho de oito horas de segunda a sexta-feira e de quatro horas pela manhã do dia de sábado havendo, portanto, descanso no período do sábado à tarde e o dia de domingo, totalizando 44 horas semanais de trabalho

[9] Vitória de Pirro é uma expressão utilizada para se referir a uma vitória obtida a alto preço, potencialmente acarretando prejuízos irreparáveis.

[10] DECRETO Nº 1.641, DE 7 DE JANEIRO DE 1907, Lei Adolfo Gordo
Providencia sobre a expulsão de estrangeiros do territorio nacional. 
     O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
      Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sancciono a seguinte resolução :

     Art. 1º O estrangeiro que, por qualquer motivo, comprometter a segurança nacional ou a tranquillidade publica, póde ser expulso de parte ou de todo o territorio nacional.

     Art. 2º São tambem causas bastantes para a expulsão:
     1ª, a condemnação ou processo pelos tribunaes estrangeiros por crimes ou delictos de natureza commum;
     2ª, duas condemnações, pelo menos, pelos tribunaes brazileiros, por crimes ou delictos de natureza commum;
     3ª, a vagabundagem, a mendicidade e o lenocinio competentemente verificados.

     Art. 3º Não póde ser expulso o estrangeiro que residir no territorio da Republica por dous annos continuos, ou por menos tempo, quando:  
a)
casado com brazileira;

b)
viuvo com filho brazileiro.
     
Art. 4º O Poder Executivo póde impedir a entrada no territorio da Republica a todo estrangeiro cujos antecedentes autorizem incluil-o entre aquelles a que se referem os arts. 1º e 2º.
     Paragrapho unico. A entrada não póde ser vedada ao estrangeiro nas condições do art. 3º, si tiver se retirado da Republica temporariamente.

     Art. 5º A expulsão será individual e em fórma de acto, que será expedido pelo Ministro da Justiça e Negocios Interiores.

     Art. 6º O Poder Executivo dará annualmente conta ao Congresso da execução da presente lei, remettendo-lhe os nomes de cada um dos expulsos, com a indicação de sua nacionalidade, e relatando igualmente os casos em que deixou de attender á requisição das autoridades estadoaes e os motivos da recusa.

     Art. 7º O Poder Executivo fará notificar em nota official ao estrangeiro que resolver expulsar, os motivos da deliberação, concedendo-lhe o prazo de tres a trinta dias para se retirar, e podendo, como medida de segurança publica, ordenar a sua detenção até o momento da partida.

     Art. 8º Dentro do prazo que fôr concedido, póde o estrangeiro recorrer para o proprio Poder que ordenou a expulsão, si ella se fundou na disposição do art. 1º, ou para o Poder Judiciario Federal, quando proceder do disposto no art. 2º. Sómente neste ultimo caso o recurso terá effeito suspensivo.
     Paragrapho unico. O recurso ao Poder Judiciario Federal consistirá na justificação da falsidade do motivo allegado, feita perante o juizo seccional, com audiencia do ministerio publico.

     Art. 9º O estrangeiro que regressar ao territorio de onde tiver sido expulso será punido com a pena de um a tres annos de prisão, em processo preparado e julgado pelo juiz seccional e, depois de cumprida a pena, novamente expulso.

     Art. 10º. O Poder Executivo póde revogar a expulsão, si cessarem as causas que a determinaram.

     Art. 11º. Revogam-se as disposições em contrario.
     Rio de Janeiro, 7 de janeiro de 1907, 19º da Republica.
AFFONSO AUGUSTO MOREIRA PENNA.
Augusto Tavares de Lyra.
Este texto não substitui o original publicado no Diário Official de 09/01/1907
Publicação: Diário Official - 9/1/1907, Página 194 (Publicação Original)

[11] Edgard Frederico Leuenroth nasceu em Mogi Mirim, São Paulo, em 31 de outubro de 1881, filho do imigrante austríaco e farmacêutico Valdemar Eugênio Leuenroth e de Amélia de Oliveira Brito. Utilizou pseudônimos como Demócrito, Frederico Brito, Palmiro Leão, Len e Leão Vermelho. Perdeu o pai aos cinco anos de idade, mudando-se para a cidade de São Paulo com a família, instalando-se no bairro do Brás. Aos 15 anos tornou-se tirador de provas do jornal O Comércio de São Paulo. Em setembro de 1887 concluiu seu primeiro periódico, o jornal “O Boi”, em pequena tipografia que comprara. Em 1899, lançou “A Folha do Brás”, que circulou até 1901. Nas páginas do jornal, fazia a denúncia da politicagem e da “falsidade do voto”. Começava deste modo sua atividade pelos direitos básicos do trabalhador.

[12] O pintor de cenários teatrais Gigi Damiani (1876-1953) foi um líder anarquista italiano que ao imigrar para o Brasil foi o principal editor de jornais libertários em São Paulo, como o La Battaglia e extinto este, fundou e dirigiu La Barricata (continuação do anterior de 1912 a 1913), La Propaganda Libertaria (1913-1914) e o A Guerra Social (1915-1917), terminando sua militância no Brasil como um dos principais colaboradores do jornal A Plebe (1917-1919). Voltou para a Itália em 1919 quando foi deportado do Brasil após a greve geral. Foi preso na Itália em conseqüência de suas atividades e passa a se dedicar a publicação contra a imigração para o Brasil, onde expõe a péssima condição do imigrante.(I paesi nei quali non si deve emigrare. La questione sociale nel Brasile, Milano, Edizioni di Umanità Nova, 1920) http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/DAMIANI,%20Gigi.pdf

[13] O problema fundamental era o da naturalização, onde os grupos italianos de socorro mútuo e os republicanos italianos de São Paulo queriam que o governo italiano permitisse a obtenção da dupla cidadania possibilitando, desta forma, a participação dos imigrantes italianos nas eleições. As respostas foram sempre negativas. Foram obrigados a optar pela naturalização adquirindo a cidadania brasileira e contribuindo, desta forma, para as eleições na política brasileira.

[14] Sociedade de socorro mútuo é uma associação de caráter não-lucrativo, formada voluntariamente com o objetivo de prover auxílio a seus membros, em caso de necessidade, baseado no mutualismo. Junto com as corporações de ofício, teria dado origem aos sindicatos.

[15] Os processos de expulsão de imigrantes italianos, a partir dos documentos do Ministério da Justiça e Negócios Interiores depositados no Arquivo Nacional (Rio de Janeiro), no período 1917-1921 consta que houve proporcionalmente mais expulsões neste tempo (40) que os 10 anos anteriores, 1907-1916 (86), com picos em 1917 e 1919. Do ponto de vista das lideranças sindicais e políticas, no período anterior a 1916 destaca-se somente a expulsão do socialista Vincenzo Vacirca, diretor do Avanti!, em 1908, ainda que se tentou expulsar o secretário da Federação Operária de São Paulo, Giulio Sorelli e os redatores do jornal anarquista La Battaglia. Depois de 1917, ao contrário, os líderes socialistas, anarquistas e sindicalistas de origem italiana em São Paulo, foram dizimados. Segundo o Anuário Estatístico do Brasil, Ano V, citado por Sheldon Leslie Maram, op. cit., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979, p. 43, somente no quinquênio 1917-1921 houve 205 expulsões de estrangeiros do Brasil (36,8% do total), enquanto nos 10 anos precedentes foram 351. Segundo esta fonte, as porcentagens não mudam para o caso específico dos italianos (79 expulsões entre 1907 e 1916 e 42 - 34,7% do total dos italianos expulsos –, entre 1916 e 1921). https://nuevomundo.revues.org/3720

[16] O jornal Avanti !, homônimo do jornal Partido Socialista na Itália, foi publicado em São Paulo em língua italiana entre 1902 e 1908, sem equivalência em outra comunidade italiana nas Américas. Foi publicado também como semanário em São Paulo entre 1900 e 1902 e, depois, entre 1914 e 1920,  no auge das manifestações trabalhistas teve uma tiragens de mais de 8.000 exemplares.

[17] Ajudou na feitura de "Novos Rumos", lançado em maio de 1905 e colaborou assiduamente, entre outros, no "Amigo do Povo", e "O Chapeleiro" publicados em São Paulo em idiomas italiano e português, o primeiro sob a responsabilidade de Neno Vasco e o segundo de José Sarmento Marques.

[18] Ernestina Lesina, anarquista, dedicada à defesa das mulheres operárias do começo do século, foi uma das fundadoras do jornal operário “Anima Vita” em São Paulo. Foi brilhante oradora em manifestações de trabalhadores, defendendo a emancipação das mulheres e da classe operária. Participou da formação da Associação de Costureiras de Sacos, em 1906, lutando pela redução da jornada de trabalho e pela organização sindical. As mulheres trabalhadoras tiveram papel decisivo na greve geral 1917, denunciando maus-tratos e exploração, sobretudo das costureiras e têxteis.

[19] Isabel Cerruti veio bem jovem ao Brasil, e, interessada desde cedo pelas ideais anarquistas, participou intensamente e de forma duradoura do movimento libertário Isabel escreveu em jornais anarquistas, proferiu conferências, falava em comícios públicos, de comemoração e protesto, e tomou parte no Centro Educativo Feminino e na Liga Feminina Internacional. Colaborou na imprensa anarquista, em periódicos como “A Plebe”, com seu próprio nome e com os pseudônimos Isa, Ruti e Isabel Silva.

[20] Teresa Rocchi era casada com o maestro que veio para o Brasil no final do século XIX e que participou da fundação do Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, em 1906. Possuía ligação com a esquerda italiana e entre o rol de amigos estava Astrogildo Pereira, Edgard Leuenroth, Antonio Piccarolo, Edmondo Rossoni, entre outros.

[21] Teresa Maria Carini (1863-1951): Ativista política, natural da Itália, veio para o Brasil em 1890, fixando-se em São Paulo (SP), onde se participou na luta dos trabalhadores, o movimento anarquista e a defesa da emancipação feminina. Elaborou o Manifesto às Trabalhadoras de São Paulo, publicado no jornal anarquista “A Terra Livre”, incentivando as costureiras a denunciarem as condições degradantes de vida, as longas jornadas de trabalho e os baixos salários.

[22] A MULHER É AINDA A PROLETÁRIA DO HOMEM! (Uma realidade que precisa ser mudada)