quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

OS TERRATENENTES DO BRASIL (12): INVASÃO MILITAR DAS TERRAS DA AMÉRICA

Guerras Justas, Holocausto dos Nativos da América

A Vila de São Paulo foi “fundada” em terras dos guaianases em 1554, iniciando a aproximação com os nativos do cacique Tibiriça, estruturando a base “militar e religiosa” que mais tarde penetraria em terras que pelos tratados pertenciam à Espanha. Formando bandeiras[1] de reconhecimento e posse de terras desocupadas, foram aquarteladas milícias prontas a viver no mais completo rigor e com o mínimo necessário, penetrando através do sertão do recente povoado de São Paulo com incursões bandeirantes, que foram aos poucos adentrando entre duas serras existentes, do Mar e Mantiqueira, apossando-se de aldeias, onde permaneciam homens desta comitiva que conformaram nova gene, formada por europeus anteriormente miscigenados na península que ao se juntarem aos nativos locais e originaram o caboclo do sertão paulista. A barbárie da formação européia de iberos, ceutas, suevos, godos, somados a mouros, árabes, judeus e outros mais, foram transportados para outra epopéia de formação de identidade, “amalgamada” e abandonada pelo poder central que não lhes sustentavam a própria existência.

São Paulo não tinha a importância das cidades litorâneas com Olinda, Rio de Janeiro e Salvador, e por dificil acesso da muralha da Serra do Mar de setecentos metros de altura que separava o local, dificultava o acesso pelo interior, deixando São Paulo extremamente pobre e de parcos recursos para sua manutenção.


No início recorreu em manter-se com as culturas nativas, produtos da terra, aprendendo a navegação do Rio Tietê que transportava pelo seu curso a rota para o Rio Paraná, que desenbocava no Rio da Prata. Os nativos denominados “negros da terra” eram excelentes navegadores em suas canoas extraídas de cascas das árvores, além de serem bons caçadores, “caaporas” - homens da mata - usando a coleta como sustento e a lança como arpão de pesca. Na agricultura cultivavam a mandioca (mandi'ó) de onde extraiam a farinha e fabricavam o biju, batata (jetý), abóbora (kurapepê), milho (avati), feijão (kumandá), algodão (mandyju) e o cauim usado fermentado como bebida extraida da mandioca para uso festivo da aldeia.

Tudo isso foi aos poucos sendo assimilado pelos colonizadores que levavam para suas incursões pelos sertões, toda esta alimentação reforçada pela criação de suínos, animal de fácil manutenção, dava toda compostura necessária, originando verdadeiras misturas alimentares, “minestras consistentes”, pratos nutritivos que originaram em São Paulo o “virado paulista”, em Minas Gerais o “tutu mineiro” e no topo do nordeste brasileiro, principalmente Ceará, conformou-se o “baião de dois”, ou “rubicão”, estes dois últimos resultante do contato com os bandeirantes quando levaram o costume alimentar para combater os “bárbaros tapuias” por contratos com os senhores de engenho, pois os nativos, caçavam o gado, invasores de terras indígenas, como animal selvagem para a própria alimentação.

São Paulo tornou-se por muito tempo simples local de passagem, de tropeiros vindos da região sul com cargas transportadas através das missões guaranis que abasteciam de muares o setor minerador das Minas Gerais e Potosi, rentável pelo monopólio de mercado dos jesuitas, grandes investidores neste rentável abastecimento. Dos caminhos incas de Piaberu[2] de mais de 3000 quilometros partiam por rotas que poderiam ser úteis e ao mesmo tempo temerárias dando acesso a forças militares de Portugal e Espanha que poderiam a qualquer momento confrontarem em combate.
Estuário do Rio da Prata
Do lado espanhol tinha-se em Juan Díaz de Solís um navegante experiente que veio para a América com interesse de exploração e mapeamento cartográfico do atual Cone Sul do que era a Terra Argêntea e a Terra Incógnita. Uniu-se em 1508 a Vicente Yáñes Pinzone, que em 1512 iniciou a exploração para chegar ao Rio da Prata ainda desconhecido, descobrindo e explorando os territórios adjacentes.
Os bandeirantes[3] interessados em nativos mansos atacavam as Missões de Sacramento para conseguirem escravos, além de apossarem das terras através de sua base militar de
São Paulo, rompendo as fronteiras do Tratado de Tordesilhas[4], povoando pela força e apoderando-se de aldeias nativas, miscigenavam-se com o colonizado, consolidando interesses futuros.
Portugal precisava de um grande contingente de homens para manterem suas possessões de África, Índia e Ásia, onde estavam seus maiores lucros mercantis, mas não poderia abrir mão da posse na América, além de combater incurssões e interferências de outras potências como Inglaterra, Holanda e França que ja se dirigiam suas forças pelo continente.

Com a vinda do primeiro Governador Geral do Brasil Tomé de Souza vieram as primeiras estruturas adminitrativas trazendo o que viria a ser os motores da economia : a cana de açucar da Ilha da Madeira e o gado para formar a pecuária.
Os engenhos canavieiros e a pecuária seriam implantados e manejados pelos terratenentes escolhidos pela coroa portuguesa para consolidar as áreas de ocupação pela força da cultura da cana de açucar e a criação sistemática de penetração através de manadas de gado.

A cidade do Salvador, sede do Governo-Geral Português na América, solidificou-se como centro administrativo e eclesiástico do século 16, tornando-se símbolo de prosperidade econômica com o enriquecimento dos seus moradores refletida na qualidade das construções. Essa pujança e riqueza advinham dos lucros obtidos com da cana do açúcar e da posição privilegiada do porto, principal entreposto comercial entre Portugal e suas colônias do Oriente e em grande centro difusor de mercadorias.
A solidificação da exploração agro-mercantil açucareira também foi fundamental para a fixação dos colonos às novas terras e para a fundação de novos povoados e vilas, determinando a superação da exploração predatória e o surgimento do sistema de produção de artigos voltados para o circuito comercial mundial, mas frágil na dependência de mão-de-obra escrava obtida entre 1534 e 1564, através do aprisionamento de indígenas do litoral. As fugas dos nativos, acostumados a não terem senhor, eram constantes e criava inconstância na produção que representavam prejuízos. Este quadro agravou-se a partir da chegada dos missionários jesuítas, responsáveis pela criação de aldeamentos por eles administrados, pelas sucessivas leis restritivas à escravidão indígena e, finalmente, pelas grandes epidemias de sarampo e varíola de 1560 e 1563, responsáveis pela alta mortandade da população de aldeia do litoral da colônia.

Do lado da Espanha a cana de açúcar tomava conta das terras das Ilhas do Caribe, e havendo disputas pelas ilhas locais com França, Inglaterra e Holanda, bem estrutura pela formação das Companhias das Índias Ocidentais. No continente da América espanhola não houve larga concentração de mão de obra escrava africana, restringindo-se às Antilhas.

Do lado de Portugal com a permissão de liberação da mão de obra escrava a partir de 1559, por Catarina da Áustria, Regente da Coroa de Portugal, pela não submissão nativa aos trabalhos forçados, e que pelo fato, foram caçados e mortos pelas “guerras justas”, onde suas cabeças eram trocadas por terras em sesmarias. Deste modo transportou toda a barbárie da Península Ibérica para a Terra Sem Mal, dando origem aos enormes latifúndios pela força das armas dos terratenentes que expulsaram os nativos para bem longe de vilas implantadas em regiões que eram parte de suas realizações culturais.

Referências:

ABREU, J. Capistrano de, Capítulos de história colonial. (1500-1800), Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo,Edusp, 1988.

COUTO, Jorge, A construção do Brasil: Ameríndios, Portugueses, e Africanos, do início do povoamento afinais de Quinhentos, Edições Cosmos, Lisboa, 1995.

FERNANDES, Florestan, Organização Social dos Tupinambá, São Paulo, Instituto Progresso Editorial, S.A.,1948.

FERNANDES, Florestan, A função social da guerra na sociedade Tupinambá, 2ª ed., Livraria Pioneira, Editora da Universidade de São Paulo, 1970.

JABOATÃO, Frei Antônio de S. Maria, Catalogo genealógico das principais famílias que procederam de
Albuquerques e Cavalcante em Pernambuco e Caramurus na Bahia, Salvador, Imprensa Oficial, 1950.

LAPA, José Roberto do Amaral, A Bahia e a Carreira da Índia, Ed. fac-similada, São Paulo, Hucitec,Unicamp, 2000.
MONTEIRO, John Manuel, Negros da terra, São Paulo, Cia. das Letras, 1995.
RIBEIRO, Darcy; NETO, Carlos de Araujo Moreira, A fundação do Brasil: Testemunhos 1500-1700,
Petrópolis, Vozes, 2a edição, 1993.
RIBEIRO, Darcy, O povo Brasileiro: evolução e sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 1995.

[1] As Bandeiras eram iniciativas de particulares, associados ou não, que com recursos próprios buscavam obtenção de lucros.Ou seja eram expedições organizadas por bandeirantes. Foi com esta origem das bandeiras que, um capitão e seus cabos, exploraram e devassaram o território brasileiro. (como Tordesilhas mudou 10° para o oeste após o Tratado de Saragoça, na Questão das Molucas, onde todos sabiam que tinham que caminhar dez graus de sol a mais para oeste, abrindo precedentes de expansão pelo sertão).

[2] O caminho construído pelos Índios sul-americanos começava em São Vicente ou Cananéia no litoral paulista, cruzava parte do Estado de São Paulo e Paraná, passando pelo El Chaco no Paraguai, seguindo pela Bolívia, ultrapassando a Cordilheira dos Andes para chegar a Cuzco no Peru, centro do império inca. Os Bandeirantes e colonizadores ao desbravar o interior do Brasil, utilizaram o Peabiru, ganhando os sertões fundaram vilas, até sua proibição de utilização por Tomé de Souza em 1.533, com pena de morte aos infratores. Partindo da Capitania de São Vicente, o Peaberu passava pela Aldeia de Ivirapuera (Santo Amaro) seguindo em direção a Aldeia de Piratininga (São Paulo, Capital). As atuais Av. Jabaquara e Rua Vergueiro fazem parte do leito do milenar Peabiru.

[3] Denominam-se bandeirantes os sertanistas que, a partir do século 16, penetraram nos sertões brasileiros em busca de riquezas minerais, sobretudo a prata, abundante na América espanhola, indígenas para escravização. Os paulistas, porém, só guerreavam contra índios, acostumados à vida das armas e tirando lucro de sua venda, não queriam ficar sedentários nem administrar as minas que desde 1603 o Rei lhes franqueara, mediante o pagamento do quinto.

[4] As chamadas Entradas tinham a finalidade de expandir o território, eram financiadas pelos cofres públicos e com o apoio do governo colonial, ou seja, eram expedições organizadas pelo governo de Portugal. Tais entradas foram mal registradas e sobram poucas informações sobre os caminhos e os acontecimentos das viagens dos desbravadores. Sertanistas corajosos, eram despreparados, não deram importância ao registro e à documentação das viagens.

OS TERRATENENTES DO BRASIL (11): EM BUSCA DE HONRA E FAMA DA FIDALGUIA IBÉRICA

Portugal e Espanha no “Achamento da América”

A Península Ibérica era a parte mais longínqua do império romano na Europa. Sobre a base primitiva, construída e constituída por várias etnias antigas, instalando-se na região outros povos provenientes das estepes da Ásia encurralados e empurrados após várias guerras, em imigração forçada pelas forças militares romanas, habitaram as antigas bases comerciais fenícias, além de diásporas constantes de judeus e invasões árabes pela Península incorporando à civilização semítica que formavam a população do extremo oriente do Mediterrâneo.

Uma camada da nobreza gótico-ocidental e vândalos desarticularam os romanos através de seus impérios apossaram-se da península, onde antes estavam ceutas, iberos, godos, suevos. Árabes e mouros em nova estirpe étnica, unidos penetram na Península Ibérica pelo norte da África conquistando Al-Andalus.

Por alguns séculos, a civilização da Península Ibérica, antes formada por bárbaros, tornou-se árabe-africana, adaptando-se a outro povo semita presente pelas diásporas sucessivas; os judeus, que controlavam o sistema mercantil. No bojo da expansão árabe havia uma avançada cultura das ciências e das artes, do seu vínculo com a filosofia antiga, com medicina, e tino aguçado nas finanças associadas ao comércio. Através de domínios da fé ampliaram os avanços necessários que modelaram nova sociedade. O Islã, combatido por todos os lados, sobretudo pelo período mais conhecido das Cruzadas, com o domínio das monarquias cristãs, estendeu-se pela península de seu extremo meridional, até próximo as fronteiras com a França.

A Península Ibérica tornou-se o maior centro da expansão naval dos séculos 14 e 15, formada por uma “legião estrangeira” de navegadores que eram livres para embarcarem, contratados pelo país interessado em seus serviços. Além disso, precisava haver regulamentação para evitar conflitos entre as duas potências envolvidas, Portugal e Espanha. Não havia jurisprudência política suficiente para demandas de conflitos sendo indicado como mediador Rodrigo Lenzuolo Bórgia, papa Alejandro VI, natural de Játiva na provincia de Valência, Espanha, não muito confiável, através da “Bula Inter Coetera”[1] de 3(4) de maio de 1493 estabelecia distância de 100 léguas[2] a partir de um ponto das Ilhas de Cabo Verde, dividiu a Terra em dois hemisférios com direitos do Reino de Castela e Leão a oeste, e, de Portugal a leste. Pela “Bula Dundum Siquidem” de 26 de setembro de 1493 confirmava o domínio por parte de Espanha de todas as terras encontradas além das terras descobertas, mas indefinindo a conquista dos portugueses que alargavam tudo o que era desconhecido do Ocidente cristão, confirmando sua legitimação pela ocupação.

A Espanha, representada pelos reinos de Leão, Castela e Aragão, por afinidades de enlaces entre coroas européias possuía direitos de domínios nos Países Baixos e Alemanha, além do vice-reino de Nápoles, o que fez da Itália, representada por alguns reinos, grande financista através de seus banqueiros em quaisquer empreitadas navais, tanto que Amerigo Vespucci, autor de “Mundus Novus”, dirigida ao seu grande mecenas Lorenzo de Médici, trabalhou para o “Banco Lorenzo and Giovanni” de Lorenzo di Pierfrancesco de Médici, antes de ir para Sevilha, em nome da casa bancária que detinha interesses pela navegação e era representada por Giannotto Berardi, um amigo florentino agente do banco de Pier Francesco de Médici. Em 1478, Vespúcio foi para Paris, e até o ano de 1489 ainda trabalhava representando este banco, fixando residência em Pisa, na Itália. Em 10 de março de 1491, Vespúcio e Giannotto Berardi, partiram para Cádiz, na Espanha, a porta de entrada para conhecer o navegador genovês Colombo e integrar a pequena esquadra espanhola de Leão e Castela que singraria os mares em busca de terras mencionadas em outros documentos do outro lado do Oceano Atlântico. Amerigo Vespucci representava os financistas da família Médici de Florença que assumia o poder financeiro do “achamento” da América.

O Império Espanhol foi o primeiro globalizado com possessões em todos os continentes alcançados pelo poderio naval. Os comerciantes genoveses anteriormente exclusivos do Mediterrâneo com a Sereníssima República de Gênova contratou os serviços de Alberto Cantino a serviço em Lisboa, para representá-los, expionando em nome do Ducado de Ferrara, conseguiu obter e remeter clandestinamente ao seu empregador na Itália um mapa detalhado dos descobrimentos portugueses. Suspeita-se que muitas informações foram furtadas da Casa da Índia em Lisboa. O melhor exemplo dessa prática é o conhecido Planisfério de Cantino , de 1502, entregue aos genoveses[1].

Para evitar guerra com a Espanha, Portugal através do sereníssimo Dom João II, grande defensor da política de exploração do Atlântico, pela graça de Deus rei de Portugal e dos Algarves d’Aquém e d’Além-Mar, em África, senhor da Guiné e Espanha houve por bem concordarem com a distância de 370 léguas a partir do arquipélago de Cabo Verde[3], iniciando uma “corrida espacial” através do Oceano Atlântico para assumir o direito instituído pelo Tratado de Tordesilhas[4], num primeiro instante um mau negócio para Portugal. O maior interesse estava direcionado para o comércio e riquezas das Índias Orientais, não havendo prioridade em terras ao oeste da Europa, sendo a jovem América apenas considerada reserva de domínio.

A Espanha assumiu suas possessões de maneira firme pelo Caribe que serviu de trampolim para continente, direcionando-se para o atual México onde os astecas foram facilmente controlados pelas forças bélicas do Marquês Hernán Cortés Monroy Pizarro Altamirano. Mais para o sul foram mandados os irmãos Pizzaro que submeteram as regiões controladas pela civilização inca, tomando o Peru chegaram ao Eldorado da prata de Potosi, atual Bolívia, interesse maior que o do planejamento colonizador poderia imaginar conseguir em curto tempo.

Do lado português parece que a sorte não sorria de imediato com riquezas de mineração. Gonçalo Coelho estudou na Itália, em Pisa, e em 1503, prestou serviços à Coroa portuguesa, firmando contrato com um grupo de comerciantes para realizar expedição pela costa brasileira, pois o conhecimento da cartografia era mínimo, havendo necessidade de ser encaminhada para a nova terra uma expedição exploradora que reconhecesse a parte situada aquém da linha divisória de Tordesilhas, pertencente à Portugal. Sobre o comando de Coelho a expedição trouxe embarcado Amerigo Vespucci, florentino conhecedor de terras americanas em viagens castelhanas anteriores.

A frota era acompanhada da expedição guarda-costa do fidalgo da Casa Real Cristóvão Valjaques, que manteve controle regular do litoral brasileiro no comando de duas caravelas de patrulhamento para combater incursões de franceses, seguindo até o Rio da Prata, fazendo esta rota até 1519.

Depois somente houve direcionamento integrado em 1530 através da expedição de exploração comandada por Martin Afonso de Sousa[5], que juntamente com seu irmão Pêro Lopes de Sousa, assumiriam as capitanias a de Santana, Santo Amaro e São Vicente no lado sul e Itamaracá ao norte do Brasil. São Vicente foi fundada em 1532 como base militar pela aproximação com o estuário do Rio da Prata[6], onde a Espanha achou por bem fortificar a cidade Buenos Aires, fundada em 1536 e mais tarde formou-se o vice-reinado do Rio da Prata trazendo apogeu à cidade, onde, instalou-se a administração burocrática do vice-reino. Entre os países Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil na “Mesopotamia Argentina”, onde estavam assentados os guaranis, originou-se mais tarde as missões de Sacramento, local de letigio entre as duas coroas com interesse do controle do estuário iniciando a disputa de terras de interesse mútuo das coroas e suas fidalguias.


ABREU, J. Capistrano de, Capítulos de história colonial. (1500-1800), Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo,Edusp, 1988.
RIBEIRO, Darcy, O povo Brasileiro: evolução e sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 1995.
GUZMÁN, Ruy Díaz de. Anales Del Descubrimiento, Población y Conquista del Río de la Plata.


[1] Bula "Eximiae Devotionis" e "Inter Coetera", de 3 de maio de 1493, concediam à Espanha o direito às terras não pertencentes aos príncipes cristãos. A segunda Bula "Inter Coetera", de 4 de maio de 1493, que concedia à Espanha as terras, descobertas e a descobrir, a oeste de um meridiano 100 léguas a oeste e ao meio-dia (sul) das ilhas dos Açores e Cabo Verde.

[2] Na época das navegações, existia a légua marítima calculada com variações feita com base do diâmetro da terra que por volta do século16 era considerada por volta de 40.000 km e da quantidade de léguas que cada navegador considerava que possuía cada grau do meridiano terrestre dividido pelos 360 graus da circunferência. Devido a essas variações, a medida da légua era expressada de várias formas:
Légua de 18 ao grau, equivalente a 6.172,4 metros
Légua de 20 ao grau, equivalente a 5.555,56 metros (medida oficial da légua marítima)
Légua de 25 ao grau, equivalente a 4.444,44 metros

[3] Determinada a divisão das áreas de influência dos reinos ibéricos, estabelecido o que deveria ser de Portugal as terras “descobertas e por descobrir” situadas antes de linha imaginária que demarcava 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão, última ilha situada a oeste de Peninsula Ibérica, cabendo a Castela e Leão o lado oeste da linha imaginária.

[4] Insatisfeito com a arbitragem do papa o rei Dom João II de Portugal negocia diretamente com os Reis Católicos, na povoação castelhana deTordesilhas,o Tratado denominado oficialmente como "Capitulación de la partición del mar Oceano", assinado em 7 de junho de 1494. Este novo diploma dividia o mundo descoberto e a descobrir, estabelecendo um meridiano a 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde entre as Coroas de Portugal (a quem cabia o Este) e da Espanha (a quem cabia o Oeste), preservando os interesses de cada uma das Coroas. (O original está depositado no Arquivo Nacional daTorre do Tombo, Lisboa, maço 4, gaveta 17). No Brasil o meridiano aceito como referencia demarcatória passava, ao norte pela atual Belém do Pará e ao sul, por Laguna.

[5] "A quantos essa minha carta de poder virem faço saber que eu a envio ora a Martim Afonso de Sousa do meu conselho por capitão-mor da armada que envio à terra do Brasil e assim de todas as terras que ele achar e descobrir (...) aos capitães da dita armada, e fidalgos, cavaleiros, escudeiros, gente de armas, pilotos, mestres, mareantes e todas as outras pessoas que haja ao dito Martim Afonso de Sousa por capitão-mor da dita armada e terras e lhe obedeçam em tudo e por tudo o que lhes mandar." Carta enviada pelo rei de Portugal, dom João III, em 20 de novembro de 1530, concedendo jurisdição a Martim Afonso de Sousa sobre todos os integrantes de sua armada e todos os habitantes do Brasil.

[6]Juan Díaz de Solís era um navegante que veio para a América com interesse de pesquisa e exploração e mapeamento cartográfico da parte meridional do Novo Mundo. Uniu-se em 1508 a Vincente Yáñez Pinzón, integrante da primeira armada de Colombo que descobriu a América. Solís iniciou em 1512 a exploração para chegar aoRio da Prata, descobrindo e explorando os territórios em sua volta. Depois da morte de Amerigo Vespucci, Solís quem ocuparia o cargo de Piloto Mor devido à experiência náutica como piloto da Casa da Índia de Portugal.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

OS TERRATENENTES DO BRASIL (10): PRODUÇÃO PREDATÓRIA

A CANA DE AÇUCAR E A PECUÁRIA

Foi o Oriente que descobriu a doçura através da cana de açúcar, tendo a Papua Nova Guiné, Ásia Tropical como referência inicial. Os árabes fizeram-no chegar ao ocidente e foram os principais arautos da sua expansão. Genoveses e venezianos encarregaram-se do seu comércio e Europa. Mas é nas ilhas que ela encontrou um dos principais viveiros da sua afirmação e divulgação no Ocidente: Creta e Sicília no Mediterrâneo, Madeira, Açores, Canárias, Cabo Verde e São Tomé no Atlântico Oriental Porto Rico, Cuba, Jamaica, nas Antilhas e Demerara (Guiana).

A cana-de-açúcar recebeu dos botânicos a classificação de "Saccarum officinarum". Introduzida no Mediterrâneo pelos cruzados e árabes que a trouxeram do Oriente, no século XIII, foi logo aclimatada em Rodes e na Sicília, onde logrou aproveitamento comercial. Foram também os árabes que a introduziram na Espanha quando de sua dominação na península. Coube ao Infante D. Henrique estimular sua cultura na Madeira e Cabo Verde, de onde foi trazida para o Brasil. Nos fins do século XV já contava Portugal com a supremacia do mercado mundial do açúcar.

Foi amplamente cultivada na Ilha da Madeira devido ao seu elevado valor comercial e múltiplas utilidades, como a produção de mel. A Ilha Madeira posiciona-se nos anais da História universal como a primeira área de ocupação Atlântica, pioneira na cultura e divulgação do açúcar.
A cultura açucareira e a tecnologia do açúcar de cana passaram do Mediterrâneo para a Ilha da Madeira, onde a produção açucareira sofreu um grande desenvolvimento. Assim, novos termos e técnicas açucareiras surgem na ilha e difundem-se no Atlântico, juntamente com os termos e as técnicas tradicionais do Mediterrâneo, passando para Canárias, Açores, Cabo Verde, S. Tomé e Brasil, com as canas e os mestres de açúcar madeirenses.

Com mudas de cana da ilha da Madeira, Martim Afonso de Souza, em 1533, fundou na Capitania de São Vicente, próximo à cidade de Santos, Estado de São Paulo, o primeiro engenho para produzir açúcar, com o nome de São Jorge dos Erasmos. Novas pequenas plantações de cana foram introduzidas em várias regiões do litoral brasileiro, passando o açúcar a ser produzido nos Estados do Rio de Janeiro, Bahia, Espírito Santo, Sergipe e Alagoas. De todas essas regiões, a que mais se desenvolveu foi a de Pernambuco, chegando a ter em fins do século XVI cerca de 66 engenhos.

A cultura da cana encontrou no Novo Continente excelente condição para se desenvolver, e não foram precisos muitos anos para que, praticamente, todos os países recém colonizados se cobrissem de cana-de-açúcar. Os solos eram férteis, o clima o mais adequado e o sucesso foi tal que, por volta de 1584, havia no Brasil 115 engenhos funcionando graças ao esforço de 10.000 escravos, que produziam mais de 200.000 arrobas de açúcar por ano, cerca de 3.000 toneladas.
Em pouco tempo o açúcar, que figurava como jóia nos cofres reais e era doado em gramas em heranças e estimado apenas nas boticas como produto medicinal, tornou-se popular, sendo seu consumo obrigatório. (em 1440 uma arroba custava 1:120$000, em 1501 8$500 o quilo).
Gilberto Freire afirma que "o canavial desvirginou todo esse mato grosso de modo mais cru pela queimada. A cultura da cana… valorizou o canavial e tornou desprezível a mata".
Durante o período colonial, século XVII, a indústria do açúcar sofreu um grande desenvolvimento. Os holandeses, portadores de tecnologia de ponta, deram nessa época um grande impulso à fabricação do açúcar. As melhores condições de clima e solo do nordeste brasileiro e a maior proximidade com o continente europeu favoreceram o desenvolvimento do açúcar naquela região.

PECUÁRIA

O gado foi introduzido no Brasil como um núcleo pastoril de auxílio à lavoura canavieira nos trabalhos de transporte e movimentação dos engenhos. Data de 1549 a sua introdução na Bahia por Tomé de Sousa. Os primeiros vieram na caravela "Galga", proveniente da ilha de São Vicente. Desde 1534, porém, Dona Ana Pimentel introduzira gado na capitania de Martim Afonso de Sousa.
A irradiação da pecuária. — Cresceram rapidamente as manadas e os currais foram obrigados a retirar–se para o interior dá Bahia, alastrando-se o gado rapidamente pelo vale do São Francisco e passando o divisor de águas em direção do Norte, atinge o Maranhão, Picui, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.
Cristóvão de Barros em 1589 fez-se grande criador.
Subindo o São Francisco até suas nascentes o gado passou para a baía do Tocantins e do Araguaia. De Goiás passou para Mato Grosso.
O gado introduzido em São Vicente penetrou em Sabarabuçu, atingiu o rio das Velhas, Minas Gerais, encontrando-se ali com o gado que descera o vale do São Francisco, onde se fixaram centenas de famílias paulistas entregues às fainas da pecuária.
No Norte outros paulistas, os sertanistas Domingos Jorge Velho, Matias Cardoso de Almeida e Morais Navarro entre outros, fixaram-se nas bacias do rio Açu e do Jaguaribe depois do sucesso alcançado contra os índios que haviam atacado os currais do Aporá.
Domingos Mafrense, o Domingos Sertão, fundou no Piauí mais de 39 fazendas de gado vacum.
Levantando uma estatística muito aproximada Antonil propõe:

Bahia . . ……….. 500000 cabeças
Pernambuco………………………………………….. 800 000
Rio de Janeiro………………………………………… 60 000
São Paulo e os campos de Curitiba …. 1 500 000 "

Deste modo expandiram-se fronteiras nos "caminhos dos currais" ou "caminhos dos vaqueiros", que cortavam o sertão interior a dentro em território anteriormente pertencente a Espanha e que foi conquistado pelas patas do gado e a cana-de-açúcar dos terratenentes ávidos por terra.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

OS TERRATENENTES DO BRASIL (09): O PREÇO DA OPRESSÃO

O CAPITÃO-MOR E O GOVERNO GERAL DO BRASIL

A atividade do tráfico negreiro inicia-se oficialmente em 1559, quando a metrópole portuguesa decide permitir o ingresso de escravos vindos da África no Brasil. Antes disso já ocorriam no Brasil transações envolvendo escravos africanos, sendo a escassez de mão-de-obra um dos principais argumentos dos colonos.

O mais antigo registo de envio de escravos africanos para o Brasil data de 1533 quando Pero de Góis, Capitão-Mor da Costa do Brasil, solicitou ao Rei a remessa de 17 negros para a sua capitania de São Tomé, Paraíba do Sul em Macaé.

Catarina da Áustria oficializou o tráfico de escravos para o Brasil que acontecia na prática: O comércio de escravos oriundos da África, antes dominado pelos africanos e árabes, fazia parte dos resgates de cativos, prática comum de escravizados e libertados durante o reinado de Dom João V, e revela que era lucrativo cambiar mão de obra até de grupos oriundos do Brasil que chegaram a ser capturados e vendidos para o mercado africano, através dos árabes que controlavam já boa parte deste comércio ao norte da África, e que passa a ser também dominado também por europeus no Atlântico e Pacífico.

O Alvará de 29 de Março de 1559, de Dona Catarina de Áustria, regente de Portugal, mediante certidão passada pelo Governador Geral, “autorizava cada senhor de engenho do Brasil, mediante certidão passada pelo Governador Geral, a importar até 120 escravos do Congo, pagando apenas 1/3 dos direitos”, vindo oficializar o que era feito na prática.

Os escravos africanos que os portugueses comerciavam, no começo passavam por Portugal, onde uma parte menor era levada principalmente por via marítima, para outros países europeus e outra parte destinava-se ao Brasil e as ilhas portuguesas do Atlãntico. O tráfico de escravos para o Brasil não era exclusivo de comerciantes europeus, mas uma atividade feita por uma rede intricada de interesses de vários controladores, inclusive os pumbeiros, mestiços livres e também ex-escravos, que não só se dedicavam ao tráfico de escravos como controlavam o comércio costeiro, no caso de Angola, para fazerem o papel de mediadores no comércio de escravos da África Atlântica.

A partir de 1550, o Governador-Geral do Brasil, Tomé de Souza, estimula a importação de africanos e, em 1557, chega à Bahia uma caravela vinda de São Tomé, importante centro açucareiro, com escravos da África

Em 1591 o preço dos animais em Pernambuco era de 30.000 reis para uma junta de bois, 10 a 12.000 reis para uma vaca, 15 reis para um porco, 3 a 4 reis para um carneiro, 1 real para um peru e 6 a 7 tostões para uma galinha.O investimento total dos senhores de engenho e lavradores, poderia atingir 25% em mão de obra e a cotação dos escravos negros era feita conforme o sexos, a idade, a origem étnica e aptidões, sendo mais valorizados os crioulos, aqueles nascidos no Brasil, os ladinos, já aculturados com o modelo do colonizador, e, por último os boçais, recém chegados da África. A classificação por idade respeitava o seguinte critério: o velho; com mais de 35 anos, o barbado; entre 25 a 35 anos, a peça; homem de 15 a 25 anos, molecão ou molecona; entre 8 a 15 anos, moleque ou moleca; inferior a 8 anos, as crianças de peito eram incluídas no preço das mães. O Preço era de 22.000 reis para uma peça, 12.000 reis para um velho e para um moleque ou moleca, 44.000 reis para e molecões ou 3 moleconas.

Era um comércio lucrativo ao investidor do açúcar branco cobiçado na Europa, produzido pela negra e injusta escravidão que manchou o Brasil, que não consegue perder as amarras destas correntes do passado para escrever com liberdade sua história.

sábado, 9 de janeiro de 2010

OS TERRATENENTES DO BRASIL (08): A IGNOMÍNIA DA ESCRAVIDÃO

A COSTA OCIDENTAL DA ÁFRICA E OS AFRO-BRASILEIROS

“Os negros do Brasil trazidos principalmente da costa ocidental da África, foram capturados meio ao acaso nas centenas de povos tribais que falavam dialetos e línguas não inteligíveis uns aos outros. A África, era, então, como ainda hoje o é, em larga medida, uma imensa Babel de línguas. Embora mais homogênea no plano da cultura, os africanos variavam também largamente nessa esfera. Tudo isso fazia com que a uniformidade racial não correspondesse a uma unidade lingüístico-cultural, que enseja uma unificação, quando os negros se encontraram submetidos todos à escravidão” (RIBEIRO, p.114; 115)

Com a liberação da metrópole portuguesa em enviar escravos para o Brasil a partir de 1559, foram tomadas algumas providências para evitar levantes como os ocorridos anteriormente em São Tomé e Príncipe, na fase exploração da cana-de-açúcar que a partir de 1493 é intensificada com mudas transladadas da Ilha da Madeira e o deslocamento de escravos provenientes do continente africano.

“Apresado aos quinze anos em sua terra, como se fosse uma caça apanhada numa armadilha, ele era arrastado pelo pombeiro- mercador africano de escravos- para a praia, onde seria resgatado em troca de tabaco, aguardente e bugigangas. Dali partia em comboios, pescoço atado a pescoço com outros negros, numa corda puxada até o porto e o tumbeiro” (RIBEIRO, p.116)

Os Angolares das Ilhas São Tomé e Príncipe

A partir de 1520 as Ilhas São Tomé e Príncipe tornam-se os maiores produtores de cana de açúcar do mundo. Portugal houve por bem enviar as ilhas um único grupo lingüístico; os Angolares. Eram escravos adquiridos de uma mesma tribo de Angola, apresentando a mesma língua, características raciais uniformes e tinham uma estrutura militar que lhes permitia organizar assaltos do tipo de guerrilhas. Se pertencessem a tribos diferentes, não se conceberia que no curto espaço de tempo já estivessem miscigenados a tal ponto de se comunicarem num idioma único. Os Angolares se entendiam num mesmo idioma semelhante ao Quimbundo, a língua franca dos povos das regiões do interior de Luanda, em Angola, adquiridos por mercadores de escravos europeus e árabes. Além disso, tinham características físicas assemelhadas aos grupos dos Negros Mussorongos, tribo do noroeste de Angola, mestiçados com outros Bantos e que estariam já presentes na ilha para intensificar a produção a partir de 1540. .(GALLARÍN, Consuelo Garcia. Vocabulário Temático Y Característico de Pío Baroja. Madri: Editora Verbum, 1991).
Em julho de 1595 um escravo que pertencia a um capitão-do-mato, de nome Amador sublevou com um enorme contingente de escravos organizandos de forma militar, combateu os colonos valendo-se da fuga de guerrilha, conseguindo libertar a maior parte do território e, inclusive, a administração colonial localizada na capital. Devido ao menor poderio bélico e à traição de alguns membros. Amador foi capturado e morto em janeiro de 1596.[1]

O Modelo Usado no Brasil

Devido ao fato ocorrido em São Tomé e Príncipe os escravos que fariam parte das levas que viriam ao Brasil foram divididos em grupos diversificados.[2]

*As culturas sudanesas vieram para o Brasil dentro dos grupos: iorubá,denominados nagô, depois os dahomey reconhecido como jêje, e por último os fanti-ashanti como sendo os minas.

**Depois houve outro grupo que eram originários de Gâmbia, Serra Leoa, Costa da Malagueta e Costa do Marfim, trazendo a cultura africana islamizada, principalmente os peuhl, os mandingas e os haussa do norte da Nigéria conhecidos na Bahia como negros malê[3] e no Rio de Janeiro como alufá.

***Um terceiro grupo era integrado por tribos bantu (banto) formado das estruturas congo-angolês vindos de Angola (angolas, congos, cambindas, benguelas e outros). e da contra-costa, da região de Moçambique.

“A diversidade lingüística e cultural dos contingentes negros introduzidos no Brasil, somada as essas hostilidades recíprocas que eles traziam da África e a política de evitar concentração de escravos oriundos de uma mesma etnia, nas mesmas propriedades, e até nos mesmos navios negreiros, impediu a formação de núcleos solidários que retivessem o patrimônio cultural africano.
Encontrando-se dispersos na terra nova, ao lado de outros escravos, seus iguais na cor e na condição servil, mas diferentes na língua, na identificação tribal e freqüentemente hostis pelos referidos conflitos de origem, os negros foram compelidos a incorporar-se passivamente no universo cultural da nova sociedade.” (RIBEIRO, p. 115)

A Bahia era o principal porto de entrada dos escravos africanos, principalmente das etnias jalofa, mandinga, fula, mossi, haussa, bantos. Este atividade gerou novo tipo de comerciante, pois o tráfico negreiro era altamente rentável e durante séculos foi o mais lucrativo empreendimento colonial. Os capatazes foram aqueles de maior relação e de certa forma ensinavam aos escravos o português rude do trabalho e com que aos poucos assimilaram para prover alguma comunicação inicial de relacionamento nas áreas do engenho da cana de açúcar e posteriormente nas minas auríferas.

Os vários grupos provenientes de várias regiões da África foram integrados na proto célula lusa-tupi, onde foram se adaptando-se a uma outra realidade inteiramente desconhecida, aprendendo a plantar outro tipo de cultura e a cozinhar os alimentos da terra como mandioca, milho, e a colher palmito de palmeiras que originou alguns pratos básicos da culinária como bolo de milho, empadas, cuscuz, tapioca, completada a alimentação com peixes variados. Tudo isso foi sendo incorporada do grupo nativo indígena onde assimilaram certos nomes que faziam parte do universo religioso local que usavam em cultos aos espíritos o uso do tabaco e o cauim, bebida fermentada da mandioca.

“Nos dois casos, o engenho e a mina, os negros viram-se incorporados compulsoriamente as comunidades atípicas, porque não estavam destinados a atender as necessidades de sua população, mas sim aos desígnios venais do senhor. Nelas, à medida que eram desgastados para produzir o que não consumiam, iam sendo radicalmente desculturados pela erradicação de sua cultura africana.” (RIBEIRO, p. 115)

Esses negros que falavam um português trôpego desempenhavam as tarefas pesadas na divisão do trabalho, no engenho ou na mina, pois o índio devido as perseguições impetradas pelos capitães do mato, predecessores dos bandeirantes paulistas, através das “guerras justas” exterminaram nações inteiras e preá-los tornou-se coisa rara. Deste modo com a introdução da mão de obra escrava suprimiu-se essa deficiência, e deste modo integrava-se novo elemento a uma sociedade que se formava de outras culturas com técnicas de trabalho existentes por parte do colonizador europeu, que deveriam ser aceitas como normas e valores pelo contingente africano, submetido ao pedra de moer, o mó aculturativo da escravidão, perdendo-se o modelo das origens, desafricanizando-os.

“O surgimento de uma etnia brasileira, inclusiva, que possa envolver e acolher a gente variada que aqui se juntou, passa também pela anulação das identificações étnicas de índios, africanos e europeus, como pela indiferenciação entre as várias formas de mestiçagem, como os mulatos; resultado de negros com brancos; caboclos; resultado de índios com brancos; ou curibocas; resultado de índios com negros”. (RIBEIRO, p. 133)

Demonstra-se que uma nova condição de pertencimento formou-se a partir de um novo modelo de agrupamento, com novos elementos que formam uma outra identidade coletiva.
“A doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se conjuraram para fazer de nós a gente sentida e sofrida que somos e a gente insensível e brutal, que também somos” (RIBEIRO, p. 120)

Bibliografia:

RIBEIRO, Darcy.O Povo Brasileiro- A Formação e o Sentido do Brasil, in Moinho de Gastar Gente. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

FREYRE, Gilberto. Casa grande & senzala: formação da família brasileira sob oregime patriarcal. Rio de Janeiro: Jose Olympio, 1973.

FREYRE, Gilberto. Sobrados e Mucambos: Decadência do Patriarcado Rural e
Desenvolvimento do Urbano. Rio de Janeiro: Record, 2000.

HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1997

PRADO JR., Caio. Evolução política do Brasil: colônia e império. São Paulo:
Brasiliense, 1987 [1933].

RAMOS, Arthur. A Aculturação Negra no Brasil. São Paulo: Ed. Comp. Nacional, 1942.

RAMOS, Arthur. O Negro Brasileiro. Rio de Janeiro: Graphia Editorial , 2001.

BASTIDE, Roger. O Candomblé da Bahia. Companhia das Letras, São Paulo, 2001.

RAMOS, Arthur. A Mestiçagem no Brasil. Editora EDUFAL, Rio de Janeiro.
RODRIGUES, Nina. Os Africanos no Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1932.

[1] O herói é uma construção ideológica, onde há um grande número de intrincados processos e acontecimentos na História. Portanto, o "herói" ou grande personagem deve ser observado e estudado no foco do conceito da idiossincrasia(mistura de fatos), logicamente dentro dos processos de acontecimentos sociais que estão em volta.

[2] “Esta imagem é reforçada pela insistência numa diversidade lingüistica africana e nas hipóteses improváveis da história brasileira de que os escravisadores colocavam africanos de origens diferentes na mesma fazenda e nas moradias para evitar a comunicação entre eles e, portanto, evitar a possibilidade de rebeliões. Indo à realidade africana lingüistica, temos que notar que todas as línguas provem de apenas quatro matrizes lingüisticas. Que no continente africano, hoje como no passado, diversas línguas são compreendidas por povos diversos. Ainda mais que, existem línguas como o Árabe e o Suarili que são faladas em quase todo o continente.” Pensamento de Henrique Cunha Júnior, professor da Universidade Federal do Ceará, em “ O Ensino da História Africana

[3] Revolta dos Malês ou a Revolta dos Escravos de Alá, foi um levante na cidade de Salvador, em 1835, capital da então Província da Bahia Consistiu numa sublevação de escravos africanos das etnias hauçá e nagô, de religião islâmica, com propostas para libertação dos demais escravos africanos. O termo "malê" deriva do iorubá "imale", designando o muçulmano.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

OS TERRATENENTES DO BRASIL (07):POVOAMENTO A TODO CUSTO

O “QUINTO DOS INFERNOS”
Tem-se diante da historia certas lacunas que às vezes não são preenchidas devido à falta de cuidados com documentos que forneceriam subsídios para a compreensão de determinado período, mesmo uma fração, um pequeno recorte do que representou um dia as estruturas da formação do povo brasileiro, e ainda se busca constantemente uma identidade que seja representada por todos, índios, portugueses, africanos.
Que não seja a identidade do Brasil a do quadriênio das copas do mundo, onde a população sai às ruas para comemorações entusiásticas em verde e amarelo, por vezes o azul de menos constância, e todas as etnias abraçam-se festivamente congratulando-se com orgulho de pertencer como legitimo torcedor da seleção Brasil, esquecendo-se das agruras passadas e as recentes da falta de oportunidade e da discriminação por parte do poder do Estado.
Nossa história possui nodoas que marcaram pela força excessiva exercida pelos antigos coronéis de engenho que nada tinha a ver com estruturar a pátria na liberdade, fraternidade e igualdade das idéias revolucionárias que tentavam por um fim as hegemonias imperiais, e o Brasil ficou no julgo destes terratenentes, e permanece a ter influências macabras e maléficas deste quadro imposto pelo poder, onde há sempre uma evolução tardia dos movimentos libertários, onde estes coronéis soltam as rédeas em conta gotas para não perder o controle sobre a massa populacional, sempre dividindo o povo para melhor dominá-lo.

O Brasil era o “quinto dos infernos”, anterior a derrama do rei, era os infernos que somente os degredados, piratas, desocupados, mimetizes e outras levas sujeitadas e aventureiras se promoviam em aceitar a incumbência de a ferro e fogo povoar estas terras, o paraíso perdido, da terra sem mal, dos nativos aqui existentes, verdadeiros descobridores que chegaram antes das caravelas, mas que não aceitaram o julgo da escravidão e foram exterminados em toda America Latina.

Do lado oposto da costa do Brasil, dividida pelo Atlântico, estava a África, também pouco explorada ao sul com grupos heterogêneo formados por nativos que pelo intercâmbio anterior com os portugueses foram escravizados anteriormente para uso como mão de obra nas plantações de cana de açúcar na ilha de São Tome e Príncipe, no Golfo da Guiné, que após a decadência açucareira tornaram-se entrepostos de escravos para o Caribe e para o Brasil.

A exploração intensiva da cana de açúcar desde o século 15 gerou exigências maiores de mão de obra, sendo responsável pela maior fenômeno migratório em escala mundial que teve por palco o Atlântico: a escravatura de milhões de africanos iniciada em 1559 por Alvará de 29 de Março de 1559, de Dona Catarina de Áustria, regente de Portugal, autorizando a cada senhor de engenho do Brasil, com certidão reconhecida pelo Governador Geral, a importar até 120 escravos. Assim iniciava-se a maior Diáspora entre o continente africano e as recentes e desconhecidas Américas, onde o Brasil, ao sul do continente, seria comandado por terratenentes apoiados pelos hegemônicos impérios europeus, entre os mais atuantes, Portugal, Espanha, Inglaterra, Holanda e França com exclusividade dos mares, manchando o solo verde das matas, amarelo do ouro e azul do céu com a cor rubra do sangue da escravidão, que maculou o solo da terra e seus filhos no julgo eterno do poder das ditaduras eternas e escravizantes do povo brasileiro.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

OS TERRATENENTES DO BRASIL (06): IDENTIDADE MOURISCA

OS NATURAIS DA AMÉRICA

Os naturais, que os invasores pejorativamente denominaram “negros da terra” era um novo elemento que precisaria ser incorporado e ser “adestrado” aos interesses da posse local e que forçosamente faria parte nesta teia histórica, de uma urdidura complexa, fazendo parte da miscigenação com os elementos aportados no Brasil.

O modelo e o sentido de vida para os primeiros habitantes da América lusa era outro e diferente do europeu, sendo a terra aliada a sua auto-suficiência em um processo integrado à natureza da “Terra sem Mal” sem os cercamentos de posse. Este encontro trágico para os autóctones criaram-se matizes diferenciados com este elemento desconhecido e que por um erro histórico do Ocidente convencionou-se denominá-los como habitantes das Índias, portanto denominados índios, falha jamais alterada pela historiografia.
Como fatores determinantes apresentados por cada lado, do dominado e do dominante, houve novo modelo de condição transformadora com outras possibilidades desconhecidas que alteraria e deformaria a gênese da Pindorama, que seria rebatizado por Brasil.

O negro da África nortista, já estava presente na cultura Ibérica, na transposição mourisca, de cor acobreada, proveniente da mestiçagem entre árabes e africanos, o mouro da Mauritânia com sarracenos dos desertos, vindos através de um nomadismo da Síria e Arábia.
Mouriscos eram todos aqueles que deslocavam em caravanas provenientes da Arábia, África e Península Ibérica. Uma nova caravana foi iniciada em direção ao “deserto do mar” e será responsável pelo “ACHAMENTO” de uma nova e surpreendente civilização, algo que não tinha nada haver com a “superioridade” do eurocêntrico.

Os primeiros ibéricos eram de castas das fimbrias da Europa, sendo uma mistura somada de recessivos genéticos e valores ligados a ocupação de vários povos bárbaros empurrados constantemente para a ponta do final do império romano, que constituíram os íberos, formação esta que não predominava a origem do “sangue azul” das dinastias continuístas da Europa. De tudo isto resultou a uma latinidade mestiça, sem “pureza romana” latina, impregnada em cada elemento rude que já havia sido formado por variantes genéticas por casamentos compondo misturas originadas por outro modelo transformador nos vernáculos e costumes[1] existentes ao longo do domínio romanos.

Estas etapas determinadas como evolução estavam impregnada de adaptações e ajustamentos às novas condições apresentadas, numa negação do vencido em favor do modelo do vencedor. Este é um campo fértil de análise e de possibilidades investigativas na busca da identidade formadora da América, como modelo distinto entre Castela e Leão e o reino de Portugal, mas mesmo representando impérios distintos ambos eram dominantes e interessados em apoderarem do serviço do exclusivo mercantilista europeu[2], domínio anteriormente exercido por genoveses e florentinos, e que a partir do século dezesseis será fortemente exercido por ibéricos e sua mestiçagem.

Todos nós, brasileiros, somos carne da carne daqueles pretos e índios supliciados. Como descendentes de escravos e de senhores de escravos seremos sempre marcados pelo exercício da brutalidade sobre aqueles homens, mulheres e crianças. Esta é a mais terrível de nossas heranças. Mas nossa crescente indignação contra esta herança maldita nos dará forças para, amanhã, conter os possessos e criar aqui, neste país, uma sociedade solidária.
[1] Videiras e oliveiras, únicas alternativas de intercâmbios de rotas comerciais forjaram costumes macerados nos lagares dos vinhos e azeites europeus, considerados primordiais na alimentação européia.
[2] Vide “Convergencia y Especificidad de Los Valores de América Latina y El Caribe”, In Avaliação Questão 1,Tópico “Submissões”

OS TERRATENENTES DO BRASIL (05): EM BUSCA DE IDENTIDADE

Processo de Formação

Na introdução do livro “O Povo Brasileiro” de Darcy Ribeiro, tem-se uma singular determinante de cada raça aportada no Brasil, que compreende um novo elemento que já não é nem uma raça européia nem outra raça qualquer, mas uma nova estrutura amalgamada com anomalias próprias de toda deformação bárbara, uma Nova Roma.
Deu-se choque de latinização somada a um barbarismo pré-existente na formação da raça na Península Ibérica, formada por visigodos (godos nobres!), alanos e suevos misturados com autóctones da península, todos agentes transformadores.
A gênese fora, deste modo, interrompida por um hibridismo transformador, um novo elemento de uma complexa rede de intercâmbios, culminantes num novo modelo mestiço.

Mais tarde essa estrutura foi novamente transformada com a penetração de nômades vindos em direção a península cruzando pelo continente d’África através do estreito de Gibraltar, porta de entrada do Atlântico para o Mediterrâneo, ou saída, e não somente constituídos de árabes numa expansão da doutrina do Islã, mas um grupo coeso de certa hegemonia econômica-político-militar, com unificação de idéias, num sincretismo, fundindo elementos culturais diferentes, com domínios bem definidos que se deslocavam do Oriente Médio pelo litoral africano. Estes ismaelitas[1], com preceitos definidos pela formação de descendência semita, antigo historicamente, expandia-se entrando em contato com povo berbere da África e nestes deslocamentos forjaram um novo modelo sócio cultural. Estruturou-se nova linhagem, nesta complexa rede formadora, que destoa o modelo atual eugenista[2] de pureza das raças depurante, fundidos num cadinho efervescente borbulhante de raças diversas com trocas, sujeições e acertos.

Darcy Ribeiro debruça neste imaginário, emaranhado de situações que já é um processo na Europa e as circunstâncias forneceram subsídios suficientes de continuísmo, redefinindo elementos novos, que misturados darão nova substância, diferente de suas matrizes originárias, nova estrutura, o americano amalgamado, detentor de nomes diversificados e pejorativos, referências da articulação de domínio.

“O tema que me propunha agora era reconstruir o processo de formação dos povos americanos, num esforço para explicar as causas de seu desenvolvimento desigual”. (Darcy Ribeiro)

Deste resultado miscigenado do povo ibérico, fruto de uma amálgama preliminar, proveniente da relação em um determinado espaço geográfico, e um tempo definido, dará um grande passo para a expansão de domínios, jamais tentado por grandes povos navegantes da antiguidade: Atravessar mar aberto, navegar sem ilhas como era o costume do Mediterrâneo, para se aventurar num novo modelo de navegação, mudando de um sistema de cabotagem, de paradas constantemente em pontos de apoio, para um deslocamento rumo ao desconhecido, sem apoio constante de portos. Deste continuísmo expansionista dos “antigos romanos”, encabeçados por Portugal, fizeram-se senhores dos mares, não mais o “Mare Nostrum” fechado do Mediterrâneo, mas um mar de possibilidades abertas: o Atlântico.

[1] Descendentes de Abraão, “Pai das Gentes”, com sua escrava Agar, egípcia, e que foi despedida por sua ama Sara, que mais tarde legitimou a descendência de Israel dando a luz a Isaac. GENESIS, capítulo 16.
[2] Os progressistas perseguem o modelo da perfeição, adeptos incontestáveis da eugenia que teve seu apogeu de pesquisa na 2ª Guerra, (que não se sabe por que segunda e não milésima) financiada pela organização FUNDAÇÃO ROCKEFELLER e controlados por sistemas de processamento de dados da IBM.