A DOENÇA
A primeira “pandemia” ficou
conhecida como Praga de Justiniano e foi a primeira epidemia de peste bubônica,
que voltou a assolar a Europa, entre 1346 e 1352.
Transmitida por pulgas de ratos
infectados, vindos dos navios, a praga surgiu no Egito, passou pelo Oriente
Médio e chegou à capital do Império Bizantino, Constantinopla, em 540 d.C.,
matando 5 mil moradores por dia, e eliminando metade da população. Estima-se
que entre 500 mil a 1 milhão de pessoas da cidade.
A
maior epidemia (ou pandemia) foi a Peste Negra na Europa no século 14. Acredita-se que a
peste tenha surgido nas planícies áridas da Ásia Central e foi se
espalhando principalmente pela rota da seda, alcançando a Crimeia,
que era uma feitoria comercial de Gênova, em 1343. No total, a praga
pode ter dizimado 30 a 50 milhões de pessoas que morreram
pela peste, o que representava cerca de um terço da população europeia da
época. As pessoas começaram a fugir das cidades que foram abandonas pelos
camponeses que fugiam com medo de serem infectados em meados de século 14[1].
Alguns sintomas pipocam antes dessas
erupções de nódulos inflamados, dos bubões (tumores inflamatórios), como
febre alta, dores de cabeça e corporais intensas, falta de apetite, náusea e
vômitos.
A Peste Negra (ou peste bubônica) é uma doença
pulmonar causada pela bactéria Yersinia pestis[2]. Essa
doença é bastante conhecida por ter dizimado um terço da população europeia no
século XIV. A
propagação da doença, inicialmente, deu-se por meio de ratos e
principalmente, pulgas infectadas com o bacilo, que acabava sendo transmitido
às pessoas picadas pelas pulgas, em cujo sistema digestivo a bactéria da peste
multiplicava-se. Num estágio mais avançado, a doença começou a se propagar por via aérea, pelas vias orais, por meio de espirros
e gotículas, surgia à propagação de forma pneumônica.
Contribuíam com a propagação da doença as precárias condições de higiene e habitação que as
cidades e vilas medievais possuíam, o que oferecia condições para as
infestações de ratazanas e pulgas. A morte pela peste era dolorosa e terrível, além de rápida,
pois variava de dois a cinco dias após a infecção. O aspecto dos
doentes era horrível, os tumores secretavam sangue e pus, a urina, o suor, a
saliva e o escarro apresentavam aspecto escurecido, sendo esta a referência para
denominá-la peste negra. Há relatos de que as pessoas com a peste cheiravam mal.
Entre os sintomas é importante
ressaltar a febre alta e dores fortíssimas. Como não havia cura, as
pessoas usavam vinagre para tentar se defender, tendo em vista que tanto os
ratos quanto as pulgas evitam seu cheiro. O número de mortos era tão grande
que eram abertas enormes valas comuns.
Nos
tempos medievais, a grande perda de pessoas devido a peste bubônica em uma
cidade criou um desastre econômico. As
corporações de ofício também paralisaram, pois muitas ficaram sem seus mestres,
oficiais e aprendizes. Até mesmo obras artísticas e arquitetônicas foram
interrompidas pela enfermidade de artistas e pedreiros.
A MEDICINA DE ENTÃO
O médico da peste negra era um médico especial que tratava aqueles que
contraíram a peste. Esses médicos foram contratados pelas cidades que
tiveram muitas vítimas da peste. Os médicos de peste tratavam os
pacientes segundo seus acordos e eram conhecidos como médicos municipais ou
comunitários da "peste negra".
Os médicos comunitários foram
bastante valiosos e receberam privilégios especiais. Por exemplo, os médicos da
peste eram livremente autorizados a realizar autópsias, que foram, de outra
maneira, geralmente, proibidas na Europa Medieval, bem como a investigação de
uma cura para a peste.
Os médicos de peste praticavam sangria e davam diversos tipos de remédios, como colocar rãs ou
sanguessugas nas ínguas para em uma rotina normal. Eles não podiam,
geralmente, interagir com o público em geral, devido à natureza de seus negócios
e a possibilidade de propagação da doença; eles também poderiam estar sujeitos
a quarentena.
De 18 médicos de Veneza, apenas um ficou trabalhando em 1348, pois cinco tinham
morrido da peste, e 12 desapareceram e podem ter fugido.
Quando a Peste Negra chegou a Avignon, França, em 1348, o médico Guy de Chauliac permaneceu, tratando de doentes
de peste e documentando os sintomas meticulosamente. Ele alegou ter sido ele
próprio infectado e ter sobrevivido à doença usando parte de seu conhecimento. Guy de Chauliac foi médico particular do Papa Clemente VI, que na época, o papado estava instalado em Avignom, sobreviveu a peste e foi o primeiro a estudar essa peste. Através
das suas observações, Chauliac fez distinção entre as duas formas da doença, a peste bubônica e a peste pneumónica[3]. (Redigiu um tratado em latim sobre a cirurgia,
intitulado Chirurgia Magna). Era incansável em
sua persistência analítica dos sintomas a ponto de declarar sempre que "Um cirurgião que não sabe a sua anatomia é como
um cego a esculpir um tronco".
A peste negra contribuiu
para outra maneira de encarar a morte observada na arte iconográfica que se
popularizou com a representação da morte. Todo esse drama entre a vida e a morte da doença
que assolou a humanidade foi
representado na gravura a "A Dança da Morte", que apareceu como ilustração
reproduzida em xilogravura do século XV, A Sétima Era do Mundo: A Imagem de
Morte de do Livro de Crônicas[4] (Nuremberg Chronicle),
escrita por Hartmann Schedel e ilustrada por Michael Wolgemut em 1493.
O DOUTOR BICO OU DOUTOR DA PESTE: As precauções da época do surto da Peste Negra
Alguns médicos de peste usavam um traje especial, embora fontes
gráficas mostrassem que usavam uma variedade de peças de vestuário. As roupas
foram inventadas por Charles de L'Orme em 1619; elas foram usadas pela primeira vez
em Paris, tendo mais tarde se espalhando em toda a Europa.
Este traje também foi usado por médicos durante a
peste de 1656, que matou 145.000 pessoas em Roma e 300.000 em Nápoles.
O traje de proteção consistia em um sobretudo de tecido pesado, que
era encerado, uma máscara com aberturas de olhos de vidro e um nariz em forma
de cone, como um bico para segurar substâncias aromáticas e palha. A
maioria dos médicos da peste também usavam um chapéu de aba, que foi
tipicamente utilizado para identificar sua posição como médico.
Alguns médicos
usavam máscaras que pareciam bicos de aves cheias de itens aromáticos. As
máscaras foram concebidas para protegê-los do ar fétido, que, de acordo com
a teoria
miasmática[5] da doença, foi
considerado como a causa da infecção.
Eram assim descritos:
Possuíam um nariz de meio pé (uns 15 centímetros) de
comprimento, com a forma de um bico, preenchido com perfume em apenas dois
orifícios, um de cada lado, perto das narinas, mas que eram o suficiente para
respirar e reunir o ar das drogas alojadas no interior do bico. Sob o casaco
usam botas de couro marroquino (couro de cabra) por cima dos calções que
estavam amarradas a estas botas e uma blusa de manga curta em pele lisa, do
qual o extremo inferior é dobrado para dentro dos calções. O chapéu e as luvas
também são feitas da mesma pele... com lentes sobre os olhos.
Irmãos abandonavam
irmãos, maridos abandonavam as suas mulheres, pais e mães abandonavam e
recusavam tratar os próprios filhos. Por todas as ruas, havia cadáveres
empilhados em grupos. A principal preocupação era retirar-se os corpos de
dentro das casas, nem que para isso fosse necessário atirá-los pelas janelas.
Os cemitérios começavam a superlotar e eram abertas grandes valas para se
enterrarem mais que um corpo de cada vez.
A população humana não retornou aos níveis
anteriores à peste até o século 17. A peste negra continuou a aparecer de
forma intermitente e em pequena escala pela Europa até praticamente desaparecer
do continente no começo do século 19.
A medicina não conseguia
debelar a epidemia, nem a justificar, mas houve no entanto uma importante
medida de saúde pública: Antes de qualquer pessoa poder entrar em uma cidade, era
obrigada a estar isolada e vigiada durante um período de 40 dias, que ficou
conhecido como “período de quarentena”.
Ref.
[1] Giovanni Boccaccio,
poeta e crítico literário italiano autor de Decameron, exercendo o cargo de
embaixador da Lombardia, e com grande influência no meio eclesiástico, descreveu
os sintomas da doença:
“Apareciam, no começo, tanto em homens como nas mulheres, ou na
virilha ou nas axilas, algumas inchações. Algumas destas cresciam como maçãs,
outras como um ovo; cresciam umas mais, outras menos; chamava-as o povo de
bubões. Em seguida o aspecto da doença começou a alterar-se; começou a colocar
manchas de cor negra ou lívidas nos enfermos. Tais manchas estavam nos braços,
nas coxas e em outros lugares do corpo. Em algumas pessoas as manchas apareciam
grandes e esparsas; em outras eram pequenas e abundantes. E, do mesmo modo
como, a princípio, o bubão fora e ainda era indício inevitável de morte, também
as manchas passaram a ser mortais”.
“Para
dar sepultura à grande quantidade de corpos já não era suficiente a terra
sagrada junto às igrejas; por isso passaram-se a edificar igrejas nos
cemitérios; punham-se nessas igrejas, às centenas, os cadáveres que iam chegando;
e eles eram empilhados como as mercadorias nos navios”.
[2] A propagação foi ocasionada por
meio de um bacilo que em 20 de junho de 1894 e foi identificado em Hong Kong pelo
bacteriologista
francês de origem suíça, Alexandre Yersin (1863-1943) recebendo o nome
de Yersinia pestis,
que tinha como vetor pulgas que parasitam os ratos como o vetor da epidemia. De
regresso a Paris no ano seguinte desenvolveria com Albert Calmette e Emile Roux
uma vacina e um soro contra a peste.
Bactéria Yersinia pestis
[3] O médico Guy de
Chauliac ficou para estudar a doença e tratar os pacientes e isso quase lhe
custou a vida, deixando-o a beira da morte. Ninguém melhor que ele sabia quão
escassas eram suas chances de sobreviver a peste. Em seu diário ele deixou o
relato: “Próximo ao final da peste, desenvolvi febre e um inchaço na
virilha. Fiquei enfermo durante três semanas e quando o inchaço amadureceu e
tratei com figos e cebolas cozidas misturados com fermento e manteiga. Eu
escapei com as graças de Deus”
Em
outro relato: “A grande mortandade teve início em Avignon em
janeiro de 1348. A epidemia se apresentou de duas maneiras. Nos primeiros dois
meses manifestava-se com febre e expectoração sanguinolenta e os doentes
morriam em três dias; decorrido esse tempo manifestou-se com febre contínua e
inchação nas axilas e nas virilhas e os doentes morriam em 5 dias. Era tão
contagiosa que se propagava rapidamente de uma pessoa a outra; o pai não ia ver
seu filho nem o filho a seu pai; a caridade desaparecera por completo”.
[4] The Seventh Age of the World: The
Image of Death from Liber chronicarum (Nuremberg Chronicle)
[5] Emanação proveniente de detritos
orgânicos em decomposição, considerada outrora (antes dos avanços da
microbiologia) como causadora de doenças e epidemias
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