As terras
dos autóctones guaianases tornaram-se propriedade do Estado
A história tem nuances
onde a metamorfose se transforma ao correr do tempo, um tempo que dizemos
passar, mas que na realidade somos nós que passamos pelo “tempo incólume”, mas
aquilo que vemos na contemporaneidade atual outros virão com outros olhares em
outro momento.
Dentro da Riviera
Paulista, São Paulo, ainda há parte de um oásis as margens da Represa de
Guarapiranga parte ainda intocável (ainda) de uma vegetação pela ação do homem,
ou pouco transformada pela ação deste, mas em alguns aspectos mantém a
exuberância da natureza que teimosamente tenta manter ainda como parte
integrante de uma harmonia.
Neste espaço
“esquecido” da velha Santo Amaro de autóctones habitantes guaianases como nos
transmite a história reproduzida a larga em livros publicados.
Por força de ocupação
estrangeira a terra tornou-se posse habitada por gente de mesma língua, onde
estes nativos foram forçados a uma catequese para aprender a língua do
ocupante. Depois disso miscigenou-se dando origem ao caboclo do encontro entre os
povos europeus e indígenas, que foram largados depois a própria sorte embrenhando-se
no mato vivendo da caça e da pesca e morando em “paioça” as margens de rios e
lagoas.
Deste modo se criou muitas
vilas pelo Brasil e da mesma forma se criou as aldeias de M”Boy (Embu das
Artes), Carapicuíba, Pinheiros e a Vila de Santo Amaro e outros pequenos “fogos”
de moradores.
Bem mais tarde foram se
achegando outros grupos de estrangeiros que também se miscigenou e criou-se
outra estrutura heterogênea, com muitos sobrenomes teutônicos com traços
acaboclados de etnias já fixados à terra.
Estas terras virgens,
outrora parte de aldeias, foram ocupadas e registradas em nome de famílias que
exerciam controle político desde o período colonial, passando pelos dois
Impérios da América do Sul e até a República.
Uladislau Herculano de Freitas Guimarães, o “dono das terras
em Santo Amaro”
Destes que assumiram
cargos de relevância no Brasil estava o Dr.
Uladislau Herculano de Freitas Guimarães nascido no Arroio Grande, Província do
Rio Grande do Sul, a 25 de novembro de 1865. Matriculou-se na
Faculdade de Direito de São Paulo em 1884, transferiu-se para o Recife, em cuja
Faculdade fez o 4º ano, sendo que depois voltou a São Paulo, recebendo o grau
de bacharel em oito de março de 1889 no limiar da República.
Foi para Campinas onde
era o centro das idéias republicanas e nesta cidade casou em 1887, com Clotilde
Glicério de Freitas, filha do chefe político local Francisco Glycério de Cerqueira Leite passando a trabalhar ao lado do
sogro advogado.
Francisco Glycério mais
tarde tornou-se Ministro dos Transportes e Ministro da Agricultura do Brasil de 1890 a 1891 e deste
modo, com respaldo político, ascendeu rapidamente como advogado jornalista e tribuno e com o advento da
República ascendeu ao cargo de Chefe da Polícia do Paraná, chegando a ser,
governador provisório, em 1890.
Herculano
de Freitas tomou posse na Faculdade de Direito de São Paulo, recebendo o grau
de doutor em 16 de janeiro de 1891 sendo nomeado lente substituto. Em 21 de
março do mesmo ano foi empossado como lente catedrático. Sua carreira foi
meteórica tornando-se deputado
estadual, federal e senador por São Paulo. Nomeado lente catedrático de direito
criminal, passou em 10 de fevereiro de 1902 por permuta com o Dr. José Mariano
Corrêa de Camargo Aranha, a catedrático de direito público e constitucional a
1º de maio de 1902.
Foi eleito senador
estadual para a legislatura de 1907-1915 , em 2 de fevereiro de 1907, assumindo
sua cadeira em 14 de abril seguinte. No Senado foi membro da Comissão
Permanente de Fazenda e Contas, entre 1907 a 1913, e da Comissão de Redação em
1913. Em 1910, foi nomeado juntamente com seu colega José Luiz de Almeida
Nogueira, para representar a Faculdade de Direito, como delegado do governo
federal no Congresso Jurídico Pan-Americano, realizado em Buenos Aires, na
Argentina.
Renunciou ao mandato
parlamentar, em agosto de 1913, quando recebeu o convite do presidente da
República marechal Hermes da Fonseca para assumir o cargo de ministro da
Justiça e Negócios Interiores, exercendo no período de 12 de agosto de 1913 a
14 de novembro de 1914. Sua vaga no Senado estadual foi preenchida por Fernando
Prestes de Albuquerque.
Tornou-se
Diretor da Faculdade de Direito de São Paulo
de 1915 a 1917. Foi Secretário da Justiça e Segurança Pública de São
Paulo, na presidência Altino Arantes, filiou-se ao Partido
Republicano Paulista - PRP e foi Senador Estadual novamente em 1922 e logo
Federal por São Paulo, funcionando como relator da reforma constitucional.
Em 14 de dezembro de 1918, substituiu Eloi Chaves, eleito para a Câmara
Federal, no cargo de secretário da Justiça e Segurança Pública do Estado de São
Paulo, na presidência de Altino Arantes, renunciando então seu cargo no Senado
paulista, sendo sua cadeira ocupada por Virgílio Rodrigues Alves. Na sua
gestão, inaugurou a Penitenciária de São Paulo, estabelecimento modelar, tido
como um dos mais adiantados do mundo, e lançou à pedra fundamental do Palácio
da Justiça, sede do Tribunal de Justiça de São Paulo, permaneceu no governo até
1º de maio de 1920, quando assumiu Washington Luis, no governo de São Paulo, e
foi substituído por Francisco Cardoso Ribeiro.
Em decreto de 7 de dezembro de 1925, foi nomeado ministro do Ministro do Supremo Tribunal Federal, preenchendo a vaga aberta com o falecimento de João Luiz Alves. Tomou
posse em 28 de janeiro de 1926, vindo a falecer no Rio de Janeiro a 14
de maio de 1926.
As
terras de Herculano de Freitas em Santo Amaro
Tamanha reputação e
exercendo cargos de altíssima relevância política tinha vasto conhecimento de
pluralidade de todas as pastas de governo e sabendo das dimensões do Estado de
São Paulo que na virada do século 19 tornava-se a economia central do país, assumindo
a grande participação no cenário nacional tornando-se o maior produtor de café
nas primeiras décadas do século vinte, Herculano de Freitas adquiriu terras
pela antiga província de São Paulo para delas usufruir das benesses da cultura
em franca ascensão internacional do café, mas que por conseqüência de tipo de
solo não foi a cultura primordial na Vila Santo Amaro, bem ao extremo sul e da
capital, que neste momento possuía autonomia administrativa (de 1832 a 1935) e
onde foi instalada a força hídrica geradora elétrica da Light and Power. Muitas destas
terras abrangiam até fronteira de outros municípios possuindo uma área física de
640 quilômetros quadrados. Parte destas terras hoje é parte de distritos
municipais da região sul. Implantada a Represa Velha de Santo Amaro adquiriu
glebas extensas que mais tarde se tornaram fazendas de outros donos como o caso
da Fazenda Caravellas no Riviera Paulista, às margens da represa hoje
denominada de Guarapiranga.
Santo
Amaro e a Represa com seus encantos
“É bem conhecida a
velha Vila de Santo Amaro, a poucos quilômetros de São Paulo. Não faz muito
tempo, apesar do tramuei que a liga à capital, (trem a vapor que ligava São Paulo à Santo Amaro {Liberdade/Largo 13 de
Maio} com 19 quilômetros de
extensão, idealizado pelo engenheiro
Alberto Kuhlmann)
ela ainda conserva todo o aspecto de uma erma e distante cidadezinha do sertão.
Mas com a necessidade de aumentar as reservas hidrelétricas que servem o
poderoso centro industrial da capital paulista, foi preciso barrar os inúmeros
córregos ou pequenos rios que descem diretamente da serra de Cubatão em demanda
do Tietê. As proximidades da cidadezinha sertaneja ornaram-se então de uma
longa série de lagos que, partindo, ao sul, do leito da estrada de ferro de
Mairinque a Santos, estende-se, ao norte, até as proximidades da E. F. Santos
Jundiaí. Foi uma transformação maravilhosa. A esquecida e velha Santo Amaro
metamorfoseou-se em região alpestre, oferecendo, com as suas montanhas verdes,
as suas águas azuis e as suas enseadas e praias caprichosas, um dos mais belos
sítios de turismo do Brasil inteiro, senão de toda a América do Sul. As terras, até habitadas somente por
alguns míseros caboclos e servindo apenas à caça de pacas e veados, entraram
rapidamente a ser vendidas. Às margens dos lagos, já então servidas por boas
estradas de automóveis, (já se havia
construído Auto-Estrada S.A. {Hoje denominada de Washington Luís} ligando São
Paulo a região de Interlagos, ambos empreendimentos elaborados por Luís Romero
Sanson) surgiram numerosas vilas de luxo e encantadoras casinhas de
recreio. Com a instalação de alguns clubes náuticos em praias que foram
recebendo nomes sugestivos, tais com Interlagos, Riviera, Praia Azul e
Copacabana, as águas da imensa represa cobriram-se de velinhas brancas que
deram vida nova ao caprichoso e vasto panorama, aumentando-lhe o encanto. Santo
Amaro transfigurara-se...” (CARAVELLAS, p.143,144)
O Industrial Oscar Muller e a Fazendinha
Três Caravellas
Partes destas terras de
Santo Amaro, localizadas às margens da Represa Velha (a atual Guarapiranga) foram
adquiridas em 1942 por Oscar Reynaldo Muller Caravellas,
empresário de sucesso industrial com fábricas por São Paulo com a razão social
O. R. Muller & Cia, sendo pioneiro em embalagens de bisnagas (cápsulas de estanho
prensadas a partir de um disco prévio, chegando mais tarde ao desenvolvimento
da matéria plástica) para pasta de dente, instalada no terreno da Rua José
Antônio Coelho com fachada voltada para a Rua Caravellas, nº 138, onde se
originou a Estamparia Caravellas, Indústria Metalúrgica e Plástica Brasileira
S.A. Uma luta árdua de tenacidade descrito no livro “História de uma Indústria”
onde São Paulo tornava-se um grande pólo industrial brasileiro assumida mais
tarde pelos filhos Vera Muller, Armin Carlos e Gunter Oscar que tiveram ainda
os encargos da Indústria Metalúrgica e Plástica Brasileira S.A. e A Chimica
Plástica Caravellas S.A.
Era um sítio de “21
alqueires de terras aráveis à borda do lago e servidos ainda por numerosas
nascentes de água cristalina, tudo apenas a 30 quilômetros de São Paulo. Adicionados
a esses 21 alqueires a outras terras por mim adquiridas no outro lado do lago,
no lugar chamado Campo de Baixo, ficava eu com uma considerável propriedade
agrícola de mais de 50 alqueires, nas melhores condições para atendera todas as
necessidades de abastecimento de frutas, legumes, verduras e laticínios de todo
o numeroso pessoal das Indústrias Caravellas. Pus mão à obra. Derrubaram-se
matas, araram-se e adubaram-se grandes extensões de terras e prepararam-se
pastos excelentes. Construiu-se um grande estábulo e uma bela cocheira, tudo
segundo os métodos mais recomendados e mais modernos.
Plantou-se um bosque de
castanheiras, um imenso bananal e seis mil mudas de uvas para a mesa, além de
uma extensa horta capaz de produzir verduras e legumes para toda uma pequena
população. Prepararam-se instalações para a pequena criação e distribuiu-se
água encanada e luz com energia elétrica para todas as habitações da nova
propriedade sem esquecer naturalmente a grande casa de residência.
Estava
montada a granja modelo – a Fazendinha Três Caravellas. Vieram então os animais
vacas leiteiras, cavalos de sela e de trabalho, porcos de raça, carneiros,
cabras, perus, galinhas, patos e até coelhos.
Há lindos bosques de eucaliptos, há passeios encantadores,
há uma esplanada para danças, há quadra de tênis e campo de futebol, sem contar
os esportes aquáticos que os lagos oferecem. Em mesas desmontáveis que fiz
construir, podem sentar-se mais de quinhentas pessoas, havendo também ali à mão
o necessário para o preparo de sadias e excelentes refeições. Já
eles(funcionários da empresa) lá tiveram duas grandes festas, com farto almoço
ao ar livre, alegres danças e animadas competições esportivas. Eu lá também
estive”. (CARAVELLAS, p.145,146)
Santa
Edwiges
Uma capelinha muito
formosa resiste ao tempo na região da Riviera Paulista, denominada de Capela
Santa Edwiges, nome este que faz parte da história da família Muller
Caravellas, em homenagem a Edwiges Haenel, que se casou com Oscar Reynaldo
Muller Caravellas, tornou-se a senhora Edwiges Muller Caravellas, sendo filha
de Oscar Haenel, que havia sido procurador do banco alemão Brazilianische Bank
fur Deutschland.
A ermida começou a ser
erguida por sugestão de um amigo de Oscar Caravellas, sendo o local escolhido
pelo reverendo vigário de Santo Amaro, num local de um outeiro com vista para o
lago.
Em 1943 os trabalhos avançavam com rapidez e as partes de marcenaria,
janelas, esquadrias, portas, bancos, juntamente com o altar em mármore,
vitrais, sino, pia foram encomendados em São Paulo e eram enviados no momento
da montagem com um cronograma bem definido.
Foi convidado para a celebração
inaugural o Bispo de Ribeirão Preto, Dom Alberto Gonçalves, mas devido as obrigações
já assumidas em sua diocese enviou seu vigário geral, Monsenhor Doutor João
Lauriano, que respeitando a região da Arquidiocese de São Paulo envia-se
documento do bispo de Ribeirão Preto dirigido a Dom José Gaspar de Affonseca e
Silva, arcebispo de São Paulo, requerendo autorização para as providências necessárias ao ato litúrgico. Assim a solenidade de benção e inauguração
foi marcada para o dia 29 de junho de 1943.
Os convidados chegaram
ao local de automóvel e/ou de bonde onde foram providenciados vários ônibus que
esperavam em Santo Amaro para o transporte em direção a Fazendinha onde os
convidados ao chegarem em ondas sucessivas, “viam a ermida de Santa Edwiges, a
altear-se, muito simples e toda branca, no seu outeirinho verde”. (CARAVELLAS,
p.159)
Todos convidados para o
festejo de inauguração paravam em frente rente a grade de madeira contemplando
a capela e aos poucos iam para seu interior, adornado de camélias com a santa
no altar iluminada por círios e velas. Monsenhor João Lauriano procedeu à
benção do novo templo fazendo após o descerramento da placa comemorativa,
dirigiu-se a assistência saudou a senhora Edwiges Gertrudes Muller Caravellas.
Hoje a capela de Santa
Edwiges ainda mostra sua beleza na colina, altiva e voltada para a Represa de
Guarapiranga, na Riviera Paulista, obra de quem ousou fazer o bem feito há 73
anos e que faz parte da história de Santo Amaro!
Referências:
CARAVELLAS,Oscar
Reynaldo Miller . História de uma Indústria. São Paulo: S.A. IND. GRAFICAS, 1949
HILTON, Ronald. WHO’S WHO Em Latin
America. Part VI Brasil. London:
Geoffrey Cumberlege/Oxford University Press
AMARAL, Antonio Barreto
do. “Dicionário de História de São Paulo. São Paulo”: Imprensa Oficial do
Estado de S. Paulo, Coleção Paulística, nº.19, 1981.
CALIMAN, Auro Augusto
(coordenador). "Legislativo Paulista – Parlamentares (1835-2005)". Imprensa
Oficial, São Paulo, 2005.
Links
complementares:
Escola Adventista e
o Capão Redondo: 100 anos de convívio
DATAS HISTÓRICAS: SANTO AMARO, CAPELA DO SOCORRO E OUTRAS
Represa de Guarapiranga: Imagens da Construção da
Barragem na Capela do Socorro/SP
Represa de Guarapiranga: ESCOPO
Documentos de Santo Amaro, São Paulo: Início da Villa e
Extinção do Município
FREGUESIA DE SANTO AMARO E A COLÔNIA PAULISTA, NÚCLEO
COLONIAL IMPERIAL
Santo Amaro teve como iniciativa uma linha de
trens idealizada pelo Engenheiro Georg Albrecht Hermann Kuhlmann, naturalizado
brasileiro que implantou os trens a vapor “Tramlok Krauss” importados da
Alemanha. (Foi eleito Deputado Estadual pelo PRP e participou da Primeira
Assembléia Constituinte Paulista). Estes trens a vapor ligavam o Largo 13 de
Maio, em Santo Amaro, à Liberdade, próximo ao Vale do Itororó no antigo
matadouro de São Paulo (próximo a atual Rua Humaitá). Implantou-se um novo
matadouro através do mesmo engenheiro que tinha o monopólio de controle sobre a
linha da “Companhia Carris de Ferro de São Paulo a Santo Amaro”. Esta linha
ferroviária tornou-se deficitária e São Paulo assinava contrato com a Light and
Power a canadense sediada em Toronto, tendo entre seus acionistas ingleses e
norte americanos, para implantar o sistema eletrificado das linhas. Foi criada
a The São Paulo Tramway, Light & Power Co. Ltd. em 1899 para iniciar
barragens e sistemas onde se criou controle estrangeiro sobre a energia
elétrica em São Paulo. A primeiro Hidrelétrica de São Paulo foi a Usina de
Parnaíba, Rio Tietê inaugurada em
23 de setembro de 1901 (depois denominada Usina Hidrelétrica Edgard de Souza ou Barragem
Edgard de Souza).