segunda-feira, 5 de outubro de 2020

A EPOPEIA DOS IMIGRANTES ALEMÃES AO BRASIL (04): A REBELIÃO PALATINA e AS TERRAS OFERECIDAS EM SANTO AMARO/SP AOS COLONOS ALEMÃES

 TERRAS DEVOLUTAS

- À insignificante freguesia que era de Santo Amaro em 1828, coube o histórico papel de ter sido o lugar de São Paulo onde primeiro se instalou uma colônia de imigrantes. Pelo que se sabe da importância da imigração em São Paulo, isso torna-se fator um alto interesse.

Aquela povoaçãozinha humilde, pobre e conformada do princípio do século passado fica situada como o marco do início no mais profundo movimento econômico e social do país. Com os primeiros colonos alemães de Santo Amaro começam o Governo e o povo de São Paulo as suas experiências com o imigrante. Após essa tentativa que, se não deu os esperados frutos, não deixou, entretanto, de contribuir para a modificação da mentalidade nativa quanto ao colono estrangeiro, tornaria a ideia migratória novos impulsos. (ZENHA, p. 26, 1950)

Aquela referência à freguesia de Santo Amaro, como local para a Colônia, é a primeira vez que aparece nos documentos. E marca a segunda e definitiva fase dos trabalhos de instalação da mesma.

Este ofício foi discutido, no mesmo dia de sua remessa, pelo Conselho da Província de São Paulo. Ficou resolvido, à vista das “diferentes pretensões (dos colonos) sobre o seu estabelecimento; e pois se declara (o diretor) que eles se contentam, que se lhe deem terras  em qualquer lugar que melhor parecer visto que sendo estrangeiros não têm o preciso conhecimento das que se acham devolutas para as pedirem, assentou o Exmo. Conselho, que como o referido diretor não se acha nessas circunstâncias pode indicar as que, estando devolutas, julgar mais convenientes aos ditos colonos, declarando sua extensão”. Cumprindo esta determinação, vai o diretor informar-se e descobrir uma região devoluta capaz de abrigar a colônia que, poucos dias depois, receberá a adesão de mais um grande grupo de alemães.

O destino, na pessoa do Capitão Joaquim Manoel de Moraes, juiz de paz, levaria o Dr. Mello Franco para Santo Amaro. (ZENHA, p. 26, 1950)

Em 23 de novembro (1828), o diretor dá conta ao Conselho de exame que fez nas terras devolutas de Santo Amaro. Acompanhara-o o juiz de paz. O sertão que se dizia devoluto ficava pouco mais ou menos a quatro léguas da freguesia, no sul, onde se encontrava o ribeirão Itaquaquecetuba, “que corre para Weste”. Confinavam as terras examinada com as de propriedade do juiz de paz e de Joaquim Machado. O caminho até o ribeirão era de carro (de boi) sem morros nem passagens difíceis. Pouco para o sul encontrava-se o ribeirão Vermelho que desembocava no Itaquaquecetuba[1]. Para além desse ribeirão até a Serra do Mar, tudo era sertão devoluto. Existia uma picada que ia a Conceição de Itanhaém “por onde consta já ter seguido gado” e ter varado gente escoteira com dia e meio. Havia facilidade de comunicação com esta vila e, pelo Rio Grande, do qual não ficava longe o sertão visitado, poder-se-ia rumar para Santos. Os matos eram “assentados” e de boas madeiras. O lugar se mostrava bem regado, já que, além dos dois ribeirões citados, entre os quais se devia localizar a colônia, dele manavam algumas fontes do Rio Grande e outra aguadas. (ZENHA, p. 27, 1950)

O sertão examinado era o mais próximo era o mais próprio, pois além das vantagens apontadas oferecia a de se achar perto de povoações. Este fato era de suma importância. Se tal lugar fosse escolhido, deviam as famílias acomodarem-se em Santo Amaro, freguesia mais próxima.

E para o estabelecimento de cada uma delas, o diretor sugeria que, escolhido o local, fosse adiantada a importância correspondente ao subsídio de quatro meses afim que pudessem construir seus ranchos e iniciar plantações. Com o que, dizia mui finalmente, ganhava a Fazenda pois quanto mais depressa se instalasse a colônia, mais depressa cessaria o subsídio.

A 28 de dezembro (1828) o diretor comunicava (ao Conselho) que os colonos tinham ido ver as terras da freguesia de Santo Amaro e que, por documento escrito as aceitavam. Que o Conselho, no lugar examinado, concedesse “a mercê que S. M. Imperial foi servido fazer-lhes das 400 braçadas em quadra porque há tanto suspiram”.

A lista de alemães que aceitam as terras na freguesia de Santo Amaro compreende 129 nomes. O diretor fizera um documento na língua dos colonos e estes o assinaram. Teriam todos os signatários examinado os terrenos? A interrogação se justifica em face de dúvidas, que logo mais surgirão. Embora o diretor faça esta comunicação a 5 de janeiro de 1929, o documento firmado pelos imigrantes é de 12 de novembro do ano anterior, circunstância digna de ser retida. (ZENHA, p. 28, 1950)

 

Nesse momento o presidente da Província de São Paulo, José Carlos Pereira de Almeida Torres, estava desesperadamente sem verbas de manutenção e dizia não se esperar pela resolução do Império e que se assentassem o colonos no sertão próximo à freguesia de Santo Amaro, em terras desocupadas no Distrito da Aldeias de Itapecerica, Mboy (hoje Embu das Artes) e Carapicuíba como já havia deliberado o Conselho. Pedia ao sargento mor José da Silva Carvalho examinasse essas terras das aldeias assim como ao Capitão Antonio de Oliveira fizesse o mesmo com as terras de Araçariguama, onde se pretendia enviar colonos também. Era dado um prazo de três dias aos enviados para informarem sobre a questão dos assentamentos, o que foi feito em 8 de fevereiro de 1829.

As terras são localizadas com as mesmas indicações do diretor. Quanto as culturas “dizem que dão milho em parte bem, em outras sofrivelmente, e dá bem batatas, carás, arroz e mesmo mandioca”. Ficava o local a futura colônia em ponto mais ou menos central, ente Santos, Conceição (de Itanhaém), Santo Amaro e São Paulo.            (ZENHA, p. 29; 30, 1950)

Algumas famílias pela indecisão do governo resolvem adquirirem suas próprias terras, sendo que oito famílias o fizeram em Itapecerica, duas em Santo Amaro e três ne Freguesia da Penha e cinco pelos lados de Sorocaba, com seus próprios recursos da venda de suas propriedades que possuíam na Alemanha.

De posse dessas informações, o Conselho realiza a sessão extraordinária de 12 fevereiro de 1829 em que fica a colônia instituída, definitivamente, em Santo Amaro.

Os senhores conselheiros da Província de São Paulo achavam que tinha cessado os debates sobre os assentamentos e deram aval para formar a ordem expedida pela Secretaria de Estado dos Negócios do Império.

Não sendo possível aos colonos se instalarem imediatamente nas terras que lhes estavam destinadas, “se assentou ser igualmente indispensável, que se compre para o indicado fim os cultivados que naquele lugar tem Joaquim Machado a custa dos ditos colonos, para o que deverão concorrer com a oitava parte de seus subsídios, atenta à utilidade, que desta providência lhes venha, em que seja a Fazenda Nacional obrigada a fazer mais esta despesa, a qual apenas montará na quantia de 50 mil réis e por isso não lhes será pesada”. Que se, entanto, não quisessem ir logo para o serão, “construíssem o seu arranchamento no sítio denominado Rio Bonito, que também fica próximo e à entrada do sertão”.

O que estava em jogo era o assentamento rápido dos colonos em quaisquer pontos que se oferecessem e isso deixava claro pelas intenções do presidente da Província de São Paulo, para que cessassem logo os subsídios advindos da Fazenda Nacional, que a condição primordial eram os assentamentos o mais breve possível. A preocupação de todos os conselheiros era com o tesouro provincial, pois atormentava a curta bolsa pública.

Estava assim instituída a Colônia alemã de Santo Amaro. A sessão iniciou-se às 10:00 horas da manhã e terminou à 2 horas da tarde. Assinam a ata: José Carlos Pereira de Almeida Torres, presidente da província, Manoel Joaquim Ornellas, Dom Manoel, bispo diocesano, José Arouche de Toledo Rendon, Bernardo Pinto Galvão Peixoto e Rafael Tobias de Aguiar. Ficam estes nomes ligados também a história da imigração de São Paulo.  (ZENHA, p. 31, 1950)

Resolvida a instalação da colônia, era necessário transportar para Santo Amaro os colonos que estavam em São Paulo e Itapecerica. Para tanto foi enviada ordem ao sargento mor afim de que este pusesse a disposição do diretor os carros necessários. O Dr. Melo Franco (diretor agrimensor) pediu 64 carros. O sargento mor conseguiu reunir unicamente cinco. Comunicava ter mandado, entanto aviso para todos os carreiros se reunirem numa quarta-feira e procederem ao transporte dos colonos. Ninguém se aluiu a grande pare dos colonos fez a mudança a pé. (ZENHA, p. 32, 1950)

Neste interim assume os interesses dos colonos alemães o agrimensor Theophil (ou Teófilo) Schmidt para mediar os lotes. Sabe-se que ele entrou no Brasil na categoria de avulso em 22 de maio de 1828 vindo para São Paulo na Sumaca “Santa Delfina[2]”. Assumiu a posição de Henrique Droge, o primeiro indicado para mediador, que foi afastado da colônia por divergências com os próprios colonos.(ZENHA, p. 31, 1950)

Dando conta do pedido feito pelo mediador alemão Theophil Schmidt que era proibir os nacionais de abrirem roças nas áreas a serem divididas entre os colonos; o senhor diretor Melo Franco deveria enviar todos os colonos para ajudar nas demarcações, inclusive um marceneiro; convocar o alemão senhor Fluer, versado em medicina e conhecedor de geometria, e sendo agora um dos colonos ajudar na empreitada; arrumar instrumentos, prancheta, cadeira, para anotações cabíveis a cada família.

Parecia coisas simples, mas a empreitada precisava acima de tudo trabalho árduo nas terras de mato virgem e começa uma desavença entre os interesses dos colonos e os interesses da província, informando de que o lugar destinado para ao alemães não prestava, era contra o ajuste que com os colonos na Alemanha se tinha feito, e que eram para aquele lugar designados para favorecer homens ricos e poderosos.

Theophil Schmidt apresenta então a Declaração dos dois cultivados de Joaquim Machado:

Estes cultivados seriam adquiridos para neles instalar-se a povoação. O Conselho do Governo não podendo medir, como desejava, até o fim do ano, as datas (terrenos) grandes e livrar-se do subsídio, usou um subterfúgio: comprou com os próprios vencimentos dos colonos os dois cultivados e neles mandou medir pequenos lotes, distribuídos de forma a permitirem futuras ruas. Estes lotes foram entregues aos alemães para construções de suas casas, enquanto se aguardava a medição das datas(terrenos) de quatrocentas braças. (ZENHA, p. 34, 1950)

Indiscutivelmente os dados apresentados pelo alemão Teófilo Schmidt eram muito mais precisos e minuciosos do que os apresentados pelos outros examinadores. O tesouro estava sem verbas e urgia pôr fim ao termo das despesas tão pesadas. As coisas pareciam ir a contento quando o mediador alemão afirmou que as terras oferecidas nada valiam e que um grande fracasso era anunciado.

Theophil Schmidt em 17 de março de 1829, endereça ao vice-presidente da província uma longa nota. O fato de ter sido dirigida diretamente ao alto procurador da coroa dá bem a medida das coisas dentro da colônia. O mediador não se julga mais obrigado a representar primeiro ao diretor, como estava estabelecido: salta pela autoridade deste, e se dirige ao Conselho e ao vive presidente. O Dr. José Carlos Pereira, por esta ocasião desempenhava-se de seu mandato na câmara dos deputados, substituindo-o Dom Manoel, bispo diocesano.

Nesta nota, entre outras coisas, diz Theophil Schmidt que o sertão destinado aos colonos não podia preencher uma das cláusulas do contrato firmado na Alemanha “por pessoas encarregadas de “Negócios deste Império”, pois nele se pactuava que ao colono seria entregue um quinhão formado de matos e campos. Isto não se podia, satisfazer com as terras destinadas aos alemães, “...será necessário, - diz ele, - que o Governo, em cumprimento dos referidos contratos, evitando queixas e agravos, conceda lugares competentes aos colonos”. (ZENHA, p. 35, 1950)

TheAfter further negative trials, a wilderness near Santo Amaro was considered and shown to the prospective colonists. Este plano foi recusado pelos alemães e, especialmente, os palatinos protestaram contra ela e insistiu em seu contrato, que lhes prometeu terras aráveis e prados, e não em uma região de selva encharcada de regulares inundações. A letter of protest of Uma carta de protesto de March 17, 1829 17 de março de 1829 was sent to the Vice President of the province and signed by 26 persons: foi enviada ao Vice Presidente da província e assinada por 25 colonos, quase todos eles do Palatino Kusel:

 

Theofílo SCHMIDT, who had measured out the territory,Frederico Lang,

Philippe Anton,

Jakob Kuntz de Essweiler,

Pedro Schumacher,

Johannes Stoffel;

Pedro Bauer,

Heinrich Gilcher de Bosenbach, (ou Gilger?),

Pedro Hassel (ou Hessel?),

Nickel Mueller,

Adão Weinbreger (seria os atuais Rheinsberg?),

Philipp Schaefer de Erdesbach,

Jacob Walder,

Theobald Ulrich de Ulmet,

Frederico Hasse (ou Haeseler),

Elizabetha Walter (viúva de Max WALTER), Diderico GERES (= GEERS), Pedro SCHUCK, Luiz GADNER ( = Ludwig KETTLER!), Jacobo MATER (= MADER), João PFEIFER, Frederico FRANCK, Daniel SANSEL (= SAMSEL!), Philippe WEINREICH, Frederico THEOBALD und Jacobo REY , almost all of them Palatines from the Kusel region who had the courage to protest and who traded in enormous difficulties for themselvesMax Walter),

Diderico Geres (ou Geer?),

Pedro Schuck, (ou Schunck?)

Luiz Gadner (Kettler Ludwig),

Jacobo Mader, (ou Mater?)

Johannes Pfeiffer (de Bosenbach),

Friedrich Franck, Friedelhausen,

Philipp Weinreich, de Friedelhausen,

Daniel Sansel,

Frederico Theobald

Jacob Rey de Essweiler, (ou Jacobo?)

 

O diretor da colônia considerou esses protestos e a marcha de uma delegação alemã à sua casa como uma “revolta” e com a ajuda policial zelou pela “ordem”. Esses alemães foram definitivamente informados de que nenhuma outra terra estavam disponíveis para eles e além disso foram punidos com a retirada do apoio financeiro.

Os que encabeçaram a lista e exigiam seus direitos saíram para outros lugares, e Por causa destes fatos a Alemanha por algum tempo fechou suas fronteiras imigratórias ao Brasil, para rever as condições em que os colonos estavam sendo tratados.

Esses palatinos que insistiam nos direitos declarados em seus contratos sairam de Santo Amaro. Alguns deles, como Johannes Pfeiffer, procurou trabalho na jovem siderúrgica de Ipanema, contruida por ordem de Dom João VI. Outros se mudaram para Minas Gerais, Santa Catarina ou Curitiba. Por causa destes fatos a Alemanha por algum tempo fechou suas fronteiras imigratórias ao Brasil, para rever as condições em que os colonos estavam sendo tratados.

Em 28 de março de 1829, o vice presidente exarou o seguinte despacho: Informe ao Sr. Diretor, ficando na inteligência de que hoje foi dispensado da comissão em que se acha empregado o alemão Theophil Schmidt.

Como represália os signatários foram excluídos da Colônia Paulista. After repentful pleas, some of them were accepted again as colonists three weeks later: Theobald ULRICH , Heinrich GILCHER , Johannes STOFFEL and Peter BAUER . Após alguns ajustes foram alguns desses colonos signatários recolocados novamente no programa de imigração e seus nomes são ainda preservados em Santo Amaro.

Mas boa parte que assinaram a carta de protesto tinham que sair e não se encontravam mais na primeira lista de habitantes de Santo Amaro de 1830.

Theophil Schmidt que havia substituído Melo Franco e Henrique Droge, para representar os interesses dos colonos alemães, que chegou e São Paulo através da Sumaca “Santa Delfina”, em 22 de maio de 1828, que considerou o solo demasiado pobre para fins agrícolas e que tinha debates conflitantes sobre este assunto com o diretor da colônia, e que até se ofereceu em ir para ir ao Rio de Janeiro expor as condições da primeira colônia de São Paulo, a Colônia Paulista, ao Imperador, desaparece como referência da colônia e a que tudo indica encaminhou-se para o Rio de Janeiro, depois de lutar pela causa dos colonos alemães de São Paulo.

O gado prometido não estava disponível nas quantidades necessárias, assim os colonos receberam uma compensação monetária. Em fevereiro de 1830, o Juiz de Paz, Joaquim Manoel de Moraes, fez uma lista da colônia alemã de Santo Amaro e contava 62 famílias com 229 pessoas. Em Itapecerica, havia 30 famílias alemãs, em um total de 163 pessoas.

Os colonos de Santo Amaro e foram mediados pelo Juiz de Paz Joaquim Manoel de Moraes e a partir de julho de 1829, sendo que essas famílias alemãs começaram a se estabelecerem em Santo Amaro.

Informava ainda o bispo que “Sua Majestade o Imperador acaba de não só aprovar, como de louvar todas as medidas tomadas pelo Excelentíssimo Sr. Presidente desta Província sobre o estabelecimento dos referidos colonos nas terras que ele em Conselho designara”.

Em 3 de abril de 1829 o director comunicava que haviam chegado a Santo Amaro muitos imigrantes daqueles que se tinham separado no mar e ficado na Inglaterra, como naufragos do Veleiro “Helena e Maria”!



[1] Não confundir o município de Itaquaquecetuba localizado na Região Metropolitana de São Paulo e Alto Tietê distante 42,6 quilômetros a nordeste da cidade de São Paulo, com a Estrada de Itaquaquecetuba, na “Ilha” do Bororé, na zona sul de São Paulo. (Em São Bernardo do Campo há a Estrada Taquacetuba e a represa Billings que recebe águas de um rio de mesmo nome!!!)

[2] Embarcação pequena de 2 mastros, usado comumente na América do Sul

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