OS
CONTRATOS E O REGIME DE COLONATO
Sempre que estamos diante de uma árvore genealógica, parece que estamos buscando a nascente de um rio saído das entranhas da Terra que desliza das montanhas e desce de mansinho por entre as escarpas, se torna sinuoso, começando com um filete de água e de repente se torna caudaloso a correr em seus limites.
Sempre que estamos diante de uma árvore genealógica, parece que estamos buscando a nascente de um rio saído das entranhas da Terra que desliza das montanhas e desce de mansinho por entre as escarpas, se torna sinuoso, começando com um filete de água e de repente se torna caudaloso a correr em seus limites.
Consta nos anais que o
maior contingente de imigrantes para a América, veio da região de Veneto, Itália
Setentrional, e que teve grande importância na agricultura cafeeira paulista.
Deste local podem ter saídos
muitos daqueles que deram alma a grande diáspora, uma dispersão coordenada por
interesses de governos à época, quando a Itália estava no processo de
Unificação e o Brasil em um processo de colonização, necessitando de mão de
obra para outra cultura que se expandia mais ao sul do país, diferente da
antiga estrutura da cana de açúcar: o café.
De muitos lugares de Veneto
partiam os vapores saindo do principal porto italiano de Gênova que recebia
enormes contingentes do interior de Pádua, Verona, Rovigo, Veneza, Vicenza,
Treviso, Belluno e Udine que cultivavam em algumas propriedades cereais e
vinhas, forragens aos animais, onde a família, geralmente numerosa para dar a
força motriz à lavoura, que neste tempo se apoiava na força humana, sem muitos
equipamentos, tendo apenas uma charrua atrelada a algum animal de tração e a
força das enxadas para limpar e arar todo terreno.
Esses pequenos
agricultores não possuíam uma terra que pudessem chamar de sua e arrendavam as terras
mediante algum pagamento ou usavam o sistema medieval de meeiros, acertando a
colheita entre o dono da propriedade. Outros preferiam serem assalariados por tempo
determinado, quando se usavam um maior contingente de mão de obra que era no
tempo da semeadura e da colheita e eram denominados “braccianti”, (Alvim, p. 29)
derivado do esforço braçal a que eram submetidos, podendo haver poucos destes
com contratos firmados para serem os responsáveis em manter a plantação dentro
das condições próprias não deixando que ervas daninhas invasoras danificassem o
produto além de enxotar pássaros e insetos que prejudicassem a lavoura.
A concentração de terras entre grupos seletos (de grandes proprietários da Itália) mantinham a estrutura fechada, não havendo acesso a estas propriedades milenares, por intermédio de aquisição ou outro meio. (ex. Terras Comuns)
A concentração de terras entre grupos seletos (de grandes proprietários da Itália) mantinham a estrutura fechada, não havendo acesso a estas propriedades milenares, por intermédio de aquisição ou outro meio. (ex. Terras Comuns)
Esses agricultores se
mantinham com algum recurso provido da força de trabalho de uma prole numerosa
e fabricavam em pequenos teares manuais suas próprias vestimentas de algodão ou
lã, cobertura de inverno e raramente haviam sapatos substituídos por tamancos
de madeira.
A base alimentar
provinha do milho plantado onde o prato básico de sustentação era a polenta,
raramente possuía alguma carne e quando era ofertada provinha de pequena
criação, como o porco e carneiro Na colheita das primícias[1]
da uva, produzia-se o vinho pisoteado no lagar e era nesta época que ainda se poderia
dizer que se fartavam da bebida, tida como parte alimentar, depois somente
sobrava o “vinhete” de uma segunda prensagem por um torniquete manual.
As moradias eram precárias
e salubres, com chão de terra batida, com janelas e portas rústicas e de pouca
mobília, e as necessidades eram feitas em reservado fora das moradias. A
higiene pouca, não raras vezes causava doenças.
As terras iam com o
tempo sendo diminuídas, pois eram divididas entre os filhos quando estes se
casavam dando continuidade ao ritmo antigo aprendido por gerações, mas esse
modelo foi aos poucos rareando os grandes campos de plantio sendo cada vez mais
diminuídos.
Isto tudo dentro deste
contexto agrário resultou a crise que perdurou de 1873 a 1895, quando a afluência
do sistema capitalista primitivo é abarcada pelo monopólio de outros centros (países)
já mais avançados de produção que ofereciam mercadorias de produtos básicos da
agricultura a preços mais atrativos. Os campos aráveis, por vezes de terras
cansadas italianas foram aos poucos sendo abandonados, pois a oferta de
melhores preços de outros países não dava uma alternativa melhor ao pequeno
produtor agrícola senão abandonar a produção costumeira de trigo, milho, por
exemplo.
Houve assim uma expulsão generalizada do campo, e um esvaziamento do meio rural. Sucumbia deste modo os pequenos produtores e os arrendatários engolidos pelo mesmo sistema vigente. Muitos colocaram a venda o que restava de propriedade e se sujeitaram a um novo modelo de vida nas Américas.
Houve assim uma expulsão generalizada do campo, e um esvaziamento do meio rural. Sucumbia deste modo os pequenos produtores e os arrendatários engolidos pelo mesmo sistema vigente. Muitos colocaram a venda o que restava de propriedade e se sujeitaram a um novo modelo de vida nas Américas.
O Brasil com a observância
pela Inglaterra por exigências de abolir o regime escravo de produção apressou-se
em elaborar a Lei de Terras, em 1850, já prevendo a necessidade de mão de obra
externa em substituição a anterior, houve por bem providenciar garantias aos
grandes fazendeiros e instituir o regime de colonato.
Pela regulamentação de
aquisição de terras foi instituída a forma de aquisição fundiária de terras
públicas somente mediante a compra de glebas de terras, mediante pagamento pecuniário
e não mais seria permitida a concessão de sesmarias, aparentemente suspensa com
a Independência do Brasil.
Este novo modelo dava aos
grandes monopólios mais condições de possuírem terras através de fazendeiros proprietários
que assim sobre o controle das terras aráveis cada vez mais abarcava mais
terras, considerados homens “bons”, não pela qualidade de serem por virtude
humana, mas por possuírem posses e assim darem as rédeas políticas locais.
Esse modelo dificultava
ao extremo o acesso a terra para os imigrantes pobres e de poucos recursos e também
aos escravos sem renda. Somente dava àqueles
imigrantes que antes havia tido terras na Itália e as venderam, em dispor de um pequeno rancho ou sítio onde
recomeçaria no empreendimento, diversificando uma cultura de plantio ainda não estruturada
no Brasil, acostumada com a monocultura, antes a da cana de açúcar e neste
momento do século 19 pelo grande sistema cafeeiro.
O objetivo da aquisição
de terras apenas para quem tivesse posses financeiras para pagar pelas terras era
também evitar que os colonos que advinham para o país fossem usados como força
de trabalho e não se dispersassem em pequenas propriedades, pois o interessante
para o governo brasileiro era manter as grandes fazendas com esta mão de obra
barata dando sustentação a uma infraestrutura de escoamento da produção através
de ferrovias que retiravam a mercadoria nas praças produtora, isto é, a “fazenda
latifúndio”, e mantinha ainda a mão de
obra “importada” sobre rígidos parâmetros das instituídas em Colônias, guetos
de controle.
A Lei de Terras dava garantias
aos fazendeiros, pois muitas vezes eles eram os grandes financiadores para esta
mão de obra, assim com foram também financiadores da escravatura, mantendo seus
privilégios perante a política de controle da produção. Deste modo é que foi
articulado todo o sistema de trabalho no “regime
de colonato”, aonde os imigrantes, na maioria das vezes pobres e sem
recursos, chegaram ao Brasil na vigência dessa lei e foram trabalhar nos cafezais,
sendo obrigado a aceitar o contrato imposto arcando com as despesas do embarque
em algum vapor marítimo[2]
que eram acertados entre os governos do Brasil e Itália no colóquio com os
fazendeiros.
Os colonos aqui chegados
passavam por um regime de observação com alguma custodia em departamentos imigratórios
e depois deste tempo eram embarcados para as respectivas fazendas que possuíam o
modelo de contrato através de pagamento pelo numero de pés de café entregues onde toda família era usada
com mão de obra, e até as crianças tinham tarefas determinadas, ao limparem o
fundo de cada caule de pé de café e outra tarefas corriqueiras e deste modo os colonos recebiam em função da quantidade de
café colhido.
O regime de colonato permitia
aos colonos o cultivo de subsistência entre os cafezais, podendo usufruir como
melhor lhe aprazia para consumo e por vezes era disponibilizado um terreno
separado para esta finalidade. Isto tinha a intenção de diminuir despesas da
fazenda, quando da liberação que deveria ser feita em determinadas ocasiões sem
acarretar prejuízo aos cafezais.
No colonato havia a
relação direta do homem com a produção e o vinculo do colono ao local
diferenciando sobre maneira ao modelo assalariado, onde o proletariado possui a
relação de produção com o equipamento geradora do capital, sem vinculo com a propriedade.
Na Itália já existia um
sistema parecido em suas terras e os colonos possuíam parcela da produção em
contrato dos cereais e vinhas (videiras) plantadas e que serviam de consumo para toda família.
São estes colonos arrendatários e pequenos proprietários da Itália que irão
formar a primeira leva emigratória da Itália, de operários braçais para a grande
imigração italiana ao Brasil, regidos por um contrato de trabalho que estavam
acostumados a se sujeitarem no “regime de colonato” através dos arrendatários,
meeiros, mantendo uma estrutura familiar dentro dos ditames impostos.
Bibliografia:
ALVIM, Zuleika. Brava Gente, Os Italianos em São
Paulo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.
HEFLINGER Jr., José Eduardo; LEVY, Paulo Masuti. E
os Italianos Chegaram. São Paulo: Unigráfica Ind. Gráfica Ltda, 2010.
CENNI, Franco.
Italianos no Brasil. São Paulo: EDUSP, 2003.
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