PIONEIRISMO DA INDÚSTRIA ELETRÔNICA
NO BRASIL
A SEMP foi marco de
desenvolvimento da região de Santo Amaro, em São Paulo, está sendo desativada e
demolida neste início de ano de 2015, para dar lugar a novos empreendimentos
imobiliários. O que representou um pólo das indústrias locais situada na
Avenida João Dias, nº 2476, somada a tantas outras indústrias que foram
desativadas na região onde nada mais resta do que foi orgulho de desenvolvimento
no ápice industrial de Santo Amaro. São Paulo tornou-se uma cidade de serviços
e não mais de transformação industrial, o que ocasionou a mudança da SEMP TOSHIBA
Amazonas S.A. para a cidade de Cajamar, no quilometro 39,5 da Rodovia
Anhanguera, Bairro Jordanesia.
Avenida João Dias, nº 2476
Finda-se deste modo mais um
capítulo da desindustrialização de Santo Amaro, São Paulo, refletindo um novo
modelo de ocupação destas áreas para a gentrificação e apoderamento de espaços
para ampliar cada vez mais a ocupação física pela cidade com o inchaço
populacional descontrolado, sem as infra estruturas básicas para manter a funcionalidade urbana.
Uma história de
superação
A indústria eletrônica no Brasil
estava ainda em passos lentos quando Afonso Hennel, natural de Curitiba,
Paraná, onde serviu o Exército saindo como segundo tenente, sabendo deste modo,
como se processava e evolução ocorrida na tecnologia de ponta pelo mundo. Mais
tarde Afonso Hennel foi adquirir novos conhecimentos na indústria sueca
Ericsson em Minas Gerais. Mais tarde mudou para o Rio Grande do Sul, para
formar sociedade com Carlos Rettmann, em 1934, iniciando a importação de
produtos eletrônicos pela Rettmann & Hennel Ltda.
Um grande importador era Edward
Adler, judeu de origem, que morava em São Paulo. Edward tinha uma “carteira de
contatos” com os Estados Unidos e mantinha relações comerciais em vários
lugares do Brasil. Um acidente aéreo interrompeu repentinamente essa promissora
atividade que surgia no país. A esposa de Edward Adler, senhora Maria Paes de
Barros Adler, de família tradicional, sabendo da visão empresarial de Afonso
Hennel convidou-o para assumir a empresa do marido e propondo-lhe sociedade na mesma,
surgindo deste modo a importadora Hennel & Adler Ltda, com sede à Rua 24 de
Maio, no Centro da cidade de São Paulo. A senhora Maria Paes de Barros Adler pouco
participava desta atividade e propôs que Afonso Hennel adquirisse sua
participação da sociedade. Acertadas as partes envolvidas e com toda essa gama
de conhecimento de Afonso Hennel era fundada em 1942 a Sociedade Eletro Mercantil Paulista Ltda, mais conhecida Pela sigla
SEMP, e foi incentivada pela industrialização tardia do país e coincidentemente
dentro das causas de desenvolvimento apoiada pelos Estados Unidos durante a
Segunda Guerra, de apoio ao momento beligerante do momento histórico.
A maior ambição da Semp era fomentar a
industrialização local e não importar equipamentos das grandes indústrias
americanas e até das européias. Afonso Hennel com seu vasto conhecimento
anterior criava a atmosfera acrescida de Know-how suficiente para fortalecer uma
indústria de produtos no campo da eletrônica. Em 1943 eram fabricados os
primeiros rádios genuinamente nacionais e que receberam o nome de Saratoga,
montado com uma miscelânea de peças produzidas artesanalmente, não dando
qualidade ao produto. Findada a guerra o mercado abriu-se para a importação de
peças o que fomentou melhor qualidade aos produtos eletrônicos e outros bens de
consumo. O rádio tornou-se a fonte principal dos meios de comunicação e foi
massificado como meio de informação, onde a Rádio Tupi fundada por Assis
Chateaubriand era a emissora sintonizada desde 1935, ano de sua fundação[1]. O
mesmo Assis Chateaubriand impulsionaria
a transmissão televisiva começada em 18 de setembro de 1950, trazendo dos
Estados Unidos os primeiros equipamentos transmissores e 200 televisores.
A SEMP inovou com as transmissões
de rádio ao idealizar as baterias energizadas pelo vento (Wind Charger) para
abastecer locais longínquos do território brasileiro, de grandes extensões
rurais.
Em 1947, Afonso Hennel juntamente
com a esposa Jurema Hennel faz a proposta de enviar o se único filho, Affonso
Brandão Hennel, para aprimorar-se nas novas tecnologias ocorridas nos Estados
Unidos da América, local dos primeiros contatos para aquisição de peças que
eram importadas para a incipiente indústria em franca expansão do pós guerra da
engenharia eletrônica. Affonso Brandão
Hennel já estava tendo experiência do comércio da Rua Florêncio de Abreu onde
trabalhava na loja de ferragens de Gabriel Gonçalves, nome renomado no varejo
comercial.
Com a passagem e o visto de
permanência assinado, Affonso Brandão
Hennel decolava do Rio de Janeiro à América onde lhe acompanharia o argentino Joseph
Martinez rumo a Nova York, cidade que iria exercer a função de Office-boy de um
dos fornecedores da empresa de seu pai, mas já orientado para esforçar-se em
conhecer os fornecedores de peças eletrônicas para a SEMP e ainda tinha que se
adaptar ao modelo da cultura americana.
No Brasil a Superintendência da
Moeda de Crédito, SUMOC (substituída pelo Banco Central, a partir de 31 de
dezembro de 1964, Lei 4595) cortou os créditos de importação em 1948, no
governo do Marechal Eurico Gaspar Dutra, afetando muito a entrada de linhas
eletrônicas no país. Toda essa conjuntura afetou a empresa de Joseph Martinez ocasionando
a demissão de Affonso Brandão Hennel. Os Estados Unidos ainda se ressentia dos
efeitos da guerra e estava voltada a produção bélica com o advento da Guerra
Fria, disputa das duas potências antagônicas no modelo de governar, de um lado
os Estados Unidos com seu capitalismo de oferta e do outro lado a União Soviética
fortalecida com a vitória da 2ª Guerra com seu modelo socialista. Os empregos
estavam escassos e o que de melhor um jovem poderia fazer neste exato momento
era ingressar em uma faculdade e se especializar em uma carreira que desse
respaldo as atividades do que se propunha fortalecer no Brasil cursando
engenharia eletrônica para no futuro fortalecer as raízes da SEMP e a produção
no Brasil.
A “performance” do aluno na
Universidade de Syracuse, na região dos Grandes Lagos, foi no início de grande
dificuldade e se mantinha dentro dos recursos que lhe enviava a família para se
manter enquanto estudava. Foi remanejado para o curso de Engenharia Industrial,
para num futuro não muito distante reconhecer o “piso da fábrica” com o tino
administrativo e gestão somada ao desenvolvimento dos processos de produção.
Affonso Brandão Hennel neste ínterim casou-se, e dedicou-se com maior afinco
aos estudos e assumia também maiores responsabilidades e no final de 1950 veio
ao Brasil visitar os pais sem a esposa. Neste
tempo a SEMP estava ocupando outras dependências na Rua Liberdade, no centro de
São Paulo tornando-se a primeira indústria brasileira a montar em aparelho de
televisão no Brasil. Somavam-se as vendas de televisores o rádio Capelinha (conhecidos como AC 431 ou PT-76)
muito difundido e popularizado pelo país e de grande sucesso até meados da
década de 1980.
Affonso Brandão Hennel voltou
rápido para os Estados Unidos sendo que seu filho Afonso Antonio Hennel
nasceria breve e com o curso universitário a ser concluido. Com as tensões
externas da Guerra Fria cada vez mais acirradas e necessitando tomar a decisão
de assumir em definitivo os negócios da família resolve retornar ao Brasil em
1953, juntamente com sua família constituída nos Estados Unidos. Neste mesmo
ano a razão social da empresa passa a denominar-se SEMP Rádio e Televisão S.A., época que passa a liderar a indústria
de rádios e televisores no Brasil e com aproximadamente 150 funcionários. Affonso
Brandão Hennel assumiria deste modo o setor de suprimentos da empresa em 1953,
ano este que a família aumentaria com a chegada do segundo filho George Antonio
Hennel. Suprimentos e matérias primas consumiam 60% dos custos da fábrica, 5% eram
destinados aos recursos da mão de obra, e como o Brasil sempre taxou muito alto
os impostos o restante ficava para estas finalidades somadas a alguns
imprevistos ocasionais.
Novos conceitos de produção
aprendidos nos Estados Unidos foram aplicados na linha de produção da Semp
aumentando seu poder de produção e eficiência com o mínimo de desperdício.
Affonso Brandão Hennel assumiu mais tarde a produção da fábrica, tornando-se gerente
da linha de produção. Em 1954 nasce-lhe a filha Cristina Hennel e no ano
seguinte é ardoroso defensor da intensificação do segmento de televisores pela
SEMP. Outras marcas eram impulsionadas no Brasil surgindo marcas nacionais com
ABC, Straus e Zilomag e as importadas como a Philips, Telefunken e Philco e
outras tantas que fatiava o mercado interno. Nesta época a demanda de mercado
era apenas 5% televisores e 95 % rádios e rádioeletrolas, um misto de toca
discos, amplificadores e rádio, tudo acoplado num único aparelho pesado de
madeira, pois o advento do plástico para produção de eletrônicos começaria um
pouco mais tarde. A empresa, por dificuldade de produção terceirizada, passou a
desenvolver também peças de qualidade nas dependências da SEMP, ampliando o quadro
de profissionais do Departamento Técnico. O s conflitos de produção eram
enormes mais foram, aos poucos, sanados a contento atingindo alto nível de
eficiência.
Juscelino Kubitschek assumiria a
presidência do Brasil, fundamentando os Planos de Metas a serem alcançados para
o desenvolvimento do país, dando impulso a indústria nacional, mas resultou
também um descontrole nos orçamentos da União. Neste mesmo ano, Affonso Brandão
Hennel passa a acionista da empresa SEMP, revigorando ainda mais o crescimento
e a demanda de produtos exigidos pelo mercado e aumentando o faturamento. O
advento do plástico somado ao aparecimento dos transistores[2]
resultou na produção de rádios portáteis alimentados por pilhas de 6 ou 12
volts e que poderiam ser levados para um lado a outro sem depender de energia
elétrica. A mecanização da lavoura provocou um excedente de mão de obra na
lavoura que se deslocou para os centros urbanos no final de 1950 e início de
1960. Isso resultou numa oferta menor de empregos em relação à mão de obra
excedente no mercado, devido a este êxodo do campo para a cidade. Houve também
uma melhoria dos salários, principalmente aquela mão de obra especializada que
tanto dependia a indústria de transformação. Affonso Brandão Hennel toma uma
decisão em 1965, de se desligar da SEMP e fundar a Manufatura de Produtos Eletrônicos
S.A., MADEL, que viria a ser detentora da marca Motorola, mas a experiência
durou um curto período de tempo, fazendo-se retornar a empresa anterior, no
caso a SEMP. Nova mentalidade foi introduzida na empresa e ao invés de produzir
todos os componentes inerentes aos produtos formalizados optou-se por comprar
no mercado ao invés de produzir todas as peças dos equipamentos, resultando
nisso uma redução de espaço que seria necessário para montagem de produtos. A
tecnologia externa criada nas empresas possuía o aporte necessário de
financiamento para pesquisar, criar melhorar e renovar o produto, com inovações
que atraiam o mercado consumidor. Affonso Brandão Hennel era adepto de optar-se
por uma parceria com um grande multinacional para não sucumbir no mercado
competitivo mundial. Neste ínterim, criou-se a Zona Franca de Manaus, pelo
decreto Lei nº 228, de 28 de fevereiro de 1967, que regulamentava as parcerias
de empresas nacionais e estrangeiras e dava impulso à região Amazônica com a
criação de pólo de desenvolvimento econômico e social.
Nesta época Affonso Brandão
Hennel era vice-presidente da Associação Brasileira de Indústria Elétrica e
Eletrônica e assumiria como membro da Associação Nacional de Fabricantes de
Produtos Eletrônicos, uma dissidência da primeira e participou ativamente do
processo de criação da Zona Franca de Manaus, criada para geração de empregos e
frear a devastação da floresta pelo comércio ilegal da madeira. Em 1968 assume
o comando da SEMP, pela enfermidade de seu pai, Afonso Hennel e a procura de
tecnologia de ponta eram inevitáveis e buscar uma parceria era meta urgente. Em
1972 foi lançada a televisão a cores de 20 polegadas e as portáteis de 14 polegadas.
Era o ano também que marcaria a SEMP com a morte de seu idealizador, Afonso
Hennel, ocorrido em março de 1972. Era uma hora de reflexão do filho, mas
também uma hora de tomar a decisão de buscar uma parceria duradoura, pois a
multinacionais já estavam abarcando um quinhão do mercado nacional de
televisores com as empresas Mitsubishi, Philips, Sanyo, Sharp, Sony, National
(Panasonic).
Affonso Antonio Hennel inicia sua
trajetória na SEMP sendo incumbido de estrutura a SEMP para fabricação de
televisores na Zona Franca de Manaus, sendo que buscou instalações pré
fabricadas no mercado norte americano onde adquiriu um galpão de 8 ml metros
quadrados para acomodar as instalações de televisores e áudio, sendo mais tarde
ampliada com outro galpão de mesma metragem para a fábrica 2, com instalações
de geradores para energia de funcionamento da mesma.
A solidez financeira da
empresa clamava não por investimentos de capitais, mas de uma parceria capaz de
fornecer uma tecnologia de mercado competitiva[3].
Surgia deste modo o nome da empresa japonesa Toshiba que tinha interesse de
parceria e investir no Brasil e que culminou com uma série de contatos para
formatar as cláusulas no ano de 1974 e que se prolongou até longo período de
negociações finalizadas e oficializadas a parceria de ambas em 1977, surgindo a
SEMP TOSHIBA.
Nota:
Sujeito a revisão sem prévio
aviso, conforme interferências externas de colaboradores que possam somar
informações úteis para ampliar a gama de dados desta crônica.
Vide mais sobre Assis
Chateaubriand:
Baby Pignatari em Roma: Mecenas do MASP
Referências:
AWAD, Elias. Affonso Brandão Hennel:
Ensina-me a ensinar. Osasco/São Paulo: Novo Século Editora, 2009.
O ESTADO DE SÃO PAULO, Economia, Especial Telecom, 31 de
março de 2015.
CARTAZES: SEMP TOSHIBA
[1]
Para incentivar a venda de aparelhos radiofônicos a Corporação Elétrica
Westinghouse fundou em 1920 a KDKA, a primeira emissora comercial do mundo e o início
da Era do Rádio. No Brasil essas transmissões radiofônicas foram incentivadas pelo
médico Edgar Roquette Pinto com a fundação da Rádio Sociedade do Rio de
Janeiro. O rádio era então massificado e os aparelhos eram produzidos em grande
escala o que barateava o produto.
[2]
Em 1948 pesquisadores da Bell Lab, nos EUA, foram os responsáveis para o advento dos
transistores, que viriam a substituir as válvulas termiônicas e que
transformaria a tecnologia eletrônica e que criaria condições favoráveis para
criar circuitos de menor volume, e que abriria novos campos de pesquisa e que daria
sustentação para no futuro a criação dos computadores. Foi somado a isto o
lançamento em 1957, do Sputinik, primeiro satélite artificial lançado pela
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
[3] O
campeonato da Copa do Mundo de 1970 foi transmitido via satélite e dois anos
após as transmissões eram a cores. As televisões com transmissão digital tipo
LCD eram fabricadas a partir de 2006 pela Semp Toshiba em Manaus quando foi eleita a Melhor Empresa do Setor Eletroeletrônico daquele ano.