sábado, 3 de agosto de 2013

A Construção de um Mercado Municipal na Vila de Santo Amaro

Um entreposto de mercadorias dos arrabaldes de Santo Amaro

“...Pelo cidadão Presidente foi apresentada a indicação do teor seguinte: Considerando que a falta de um mercado nesta Vila, torna-se vexatória aos seus habitantes, mormente a classe menos favorecida da fortuna. Considerando que dessa falta resulta o monopólio dos gêneros de primeira necessidade que são vendidos pelos produtores aos comerciantes, por atacado, com grave prejuízo do varejo franco ao povo. Considerando que a construção dos mercados não se torna onerosa ao cofre Municipal, antes é ao contrário uma fonte de renda para o Município. Indico para que a Câmara, se estender em sua alta sabedoria, chame concorrentes para esta obra de acordo com a planta, perfil e demais estudos que nesta data tomo a liberdade em submeter a apreciação da Câmara.
Sala das sessões em três de abril de mil oitocentos e noventa e três. Carlos (da Silva) Araújo. Posta a votos a indicação foi aprovada, ficando o cidadão intendente encarregado de chamar concorrentes para a referida obra.”

O edital da obra foi publicado em 5 de maio de 1893, assinado pelo então intendente Municipal, Luiz Gonzaga de Miranda Guerra, e sua construção iniciada em 15 de julho de 1896, cabendo a obra ao empreiteiro Alfredo Formigoni, sendo o contrato celebrado com a Câmara Municipal da Vila de Santo Amaro representada pelo intendente capitão Baptista da Luz Mendes pela quantia de nove contos quinhentos e trinta e oito mil réis (9:538$000)  recebidas em “quatro prestações”. A área do edifício será de 17,00 metros x 17,00 metros, com baldrame reforçado assim com as paredes e a sustentação do telhado de “boa madeira” que terá ainda oito pilares, mais tarde alteradas, que complementa o alpendre com caimento do telhado em duas águas com telhas fornecidas pelo fabricante Andrea, industrial residente na Vila. As portas internas serão lisas com 1,10m x 2,50m, e as externas 2,20 x 3,40m, abrindo em duas folhas, com janelas de 1,10m x 1,00, sendo as madeiras de canela, cedro ou outra de igual duração. Toda a construção para a “feitura” estará a cargo da “Marcenaria MontAmaro e Irmão”. O acabamento será em reboco que depois serão caiadas. Foi previsto ainda uma bomba de poço para abastecer o mercado de água potável.
Localizado na atual Praça Doutor Francisco Ferreira Lopes, anteriormente denominada de Largo São Benedito e Praça do Mercado, denominação essa efetuada em Ata da Câmara Municipal da Sessão de 31 de novembro de 1896, tem em todo seu aspecto uma estrutura reforçada por colunas em seus dois alpendres.

Dava o construtor como garantia do serviço um terreno na Rua Liberdade, atual Rua Irineu Marinho, na Vila de Santo Amaro, somado a oito mil tijolos e duas mil telhas existentes no dito terreno. O contratante nomeou seu fiador idôneo o senhor Cenerino Formigoni que juntamente com Alfredo Formigoni aceitaram a empreitada, sendo as testemunhas do referido contrato os senhores José Alves Alvim e José Pereira da Paula.

Com o desenvolvimento da área agrícola e a comercialização de cereais e madeira, carvão, foi acelerada a construção do mercado, pois recorriam produtos de municípios avizinhados como Itapecerica e M’Boy, o atual Embu das Artes e Cotia. Tudo isto colaborou anteriormente para a “exportação” de mercadorias para a cidade de São Paulo através de linha a vapor inaugurada oficialmente em 14 de março de 1886.

Toda a atividade econômica afluía para o centro do Largo da Bola, o atual Largo Treze de Maio, sendo o escoamento para São Paulo através da Rua Tenente Adolfo, a atual Avenida Adolfo Pinheiro. Foram tomadas medidas relacionadas ao abastecimento urbano e a saúde pública, pois em 1889 houve um surto de varíola que obrigou os governantes adotarem certas medidas de higiene pública, exigindo qualidade no abate de reses, melhorias e construção de hospital e estudos de abastecimento de água para a população. Isto gerou a necessidade de um mercado local já pronunciado pelo intendente Luiz da Fonseca Galvão em sessão de 2 de abril de 1890 que julgava conveniente a necessidade de um mercado no centro da Vila, que posto em votação foi aprovado.

Antes funcionava o modelo das “Casinhas”, comuns no Brasil colonial e logicamente na Capital paulista. Eram pequenos comércios, “portas de venda” de gêneros alimentícios nas ruas de São Paulo, inclusive uma rua foi denominada Rua das Casinhas, depois chamada de Rua do Palácio e finalmente Rua do Tesouro, que fechava o triângulo pela Rua Direita, São Bento e Rua da Imperatriz, que depois da República passou a ser denominada de “15 de Novembro”.

Santo Amaro expandia-se de forma diferenciada aos outros municípios paulistas que a partir de 1870 consolidavam a cultura cafeeira, somada a produção de algodão para o Oeste paulista, e ampliava as colônias imigratórias.

Santo Amaro não era produtora nem de café e algodão para o mercado externo! Era abastecedor da cidade de São Paulo e parte de um subúrbio de produção rural.

A primeira iniciativa de um centro abastecedor foi criar um Mercado Provisório na Vila de Santo Amaro em 1894, tendo como zelador Horácio Bertholdo de Andrade Vasconcellos, regulamentada pelo Código de Postura Municipal que já havia prenunciado na sessão de 2 de abril de 1890 através do intendente Luiz da Gouveia Galvão a “necessidade de um mercado nessa Vila” e implantada com aprovação da Intendência de Obras do governo do Estado em 25 de junho de 1890, sendo proposta a sua localização no Largo Municipal situado no trajeto para a região de Itapecerica da Serra, entre as ruas Direita, hoje Capitão Tiago Luz, onde estava situada o maior número de casas comerciais e Rua da Palha, atual Rua Paulo Eiró, ligação do Largo (praça) Municipal ao Largo da Matriz. Foi deliberado em 2 de setembro de 1894 alugar a casa de José Antonio Marianno Baretto por vinte cinco mil réis mensais.(25$000) lavrado o contrato com a intendência.

A inauguração do Mercado Municipal tem como data presumível o dia 23 de maio de 1897, quando foi expedido um recibo de 15$000 réis para “foguetório para a inauguração do mercado”, assinado por Amaro Antonio da Silva, sendo então o Largo São Benedito denominado de Praça do Mercado, que somado ao Largo Municipal, que passou a ser, a partir de 7 de maio de 1894, Praça Marechal Floriano Peixoto, acesso ao Largo da Estação, próximo a atual Praça Santa Cruz, onde estavam todas as atividades comerciais do local, sendo que os produtos produzidos em Santo Amaro alcançavam o mesmo preço dos de mercado da Capital, disto resultando o montante de tributos da arrecadação do Município de Santo Amaro.



“É EXPRESSAMENTE PROIBIDO O EXCESSO DE VELOCIDADE BEM COMO ABRIR O ESCAPAMENTO DENTRO DO PERÍMETRO URBANO”
(dizeres da placa)

Na cerimônia de inauguração do Mercado Municipal, além do afluxo da participação popular, estiveram presentes ainda o padre Luiz Bittencourt e um séquito municipal recém-eleitos, a saber: Benedito Branco de Miranda, coronel Luiz Schmidt, capitão Felix Avelino de Moraes, Amaro Antonio de Oliveira e Silva, Tenente Coronel Carlos da Silva Araújo e Amaro Vieira de Moraes.

A “exportação da madeira, uma das principais fontes de riqueza popular também criava o problema da devastação das matas”. É o momento que a demanda sofre taxação sobre a fabricação de carvão, muito consumido pela cidade de São Paulo abrindo ainda o mercado como modelo de feiras livres de madeira, gêneros alimentícios e manufaturados como tecidos, arreios de montaria, ferragens, louças, bebidas, nos terrenos próximos a estação da The São Paulo Tramway, Light and Power Co Ltd. que impulsionava estas relações através do transporte ferroviário.

O terreno supracitado foi concedido para a “Companhia Carris de Ferro São Paulo a Santo Amaro”, do idealizador da mesma, o engenheiro alemão Georg Albrecht Hermann Kuhlmann, naturalizado brasileiro e conhecido por Alberto Kuhlmann (foi deputado pelo PRP e participou da constituição paulista de 1891) em sessão realizada pela Câmara Municipal de 5 de outubro de 1885, e que mais tarde foi administrada pela The São Paulo Tramway, Light and Power, quando desativou por completo a “Companhia Carris de Ferro São Paulo a Santo Amaro” no  ano de 1913. Hoje no local, onde se localizava a antiga estação, está implantada a Escola Municipal Professor Linneu Prestes, com frente voltada para a Avenida Adolfo Pinheiro, 511, somado ao antigo pátio da Eletropaulo hoje área da expansão da linha 5, a Lilás do Metrô, compreendendo as duas ruas paralelas, Padre Anchieta e Conde de Itu.

Em 30 de abril de 1903 foi contratado o empreiteiro Francisco de Bonni para que deste modo o mercado sofresse as primeiras intervenções em obras de reformas devido à pujança da cidade de São Paulo que influenciava sobre maneira o desenvolvimento da Vila de Santo Amaro, onde foi implantada a primeira experiência da Colônia Paulista, quando chegaram em 1829 os primeiros colonos alemães na região.

O Mercado Velho, como comumente ainda se denomina o local, onde por décadas se promoveu a concentração da produção agrícola de uma lavoura local que produziam em seu espaço rural abundância de legumes, milho, feijão, mandioca, batata, e de pequenas criações, além de uma produção fabril de mobília e arreios denotando existir gado, o que urgia também a necessidade de um Matadouro, oficializado na Câmara Municipal da Vila de Santo Amaro em Sessão de 14 de janeiro de 1890.

Um Novo Mercado Municipal

Após mais de meio século de préstimos a construção de um novo mercado municipal, em rossio, para pastagem de animais, iniciado em 1954, à Rua General Osório, atual Rua Ministro Roberto Cardoso Alves, número 359, na confluência da Rua Padre José de Anchieta, próximo ao Cemitério de Santo Amaro (fundado em 1856), mercado este que custou aos cofres públicos a importância de $ 7.827.075,40 cruzeiros e foi inaugurado em 13 de novembro de 1958.

Deste modo o antigo mercado, que tanto contribuiu para o desenvolvimento comercial de Santo Amaro, perdeu sua função mercantil, mas teve o reconhecimento como bem cultural e patrimonial apresentado no início de 1970 por Lúcia Piza Figueira de Mello Falkenberg e concretizado em 21 de setembro de 1972, com a inscrição no livro de Tombo Histórico do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico, CONDEPHAAT, processo nº16705/70, com Tombamento em 21 de setembro de 1972, publicado no Diário Oficial em 22 de setembro de 1972, inscrição nº66 no Livro de Tombo, página 6, de 4 de outubro de 1972.



No Mercado Municipal onde se promoviam um grande afluxo de comércio, na década de 1960 se tornou Depósito Municipal da Divisão de Parques e Jardins incorporando após a sede do “Grupo de Escoteiro 9 de Julho” e depois acolheu o acervo do “Museu Folclórico” , seguido pelo “Centro de Atividades de Comunicação e Expressão”, CACE, e, na atualidade  abriga a “Casa de Cultura Manoel Cardoso de Mendonça” situada na atual Praça Praça Doutor Francisco Ferreira Lopes, 434.

O QUE FOI FEITO DO MUSEU FOLCLÓRICO DE SANTO AMARO E SEU ACERVO?



A dinâmica da história é surpreendente, por vezes parecem incontroláveis as interferências humanas, que por outro lado também, com todo o arcabouço armazenado, insiste em persistir como legado das transformações ocorridas no espaço ao longo do tempo, como um marco a dizer para as gerações seguintes:

“Mesmo com toda a autodestruição capital, eu persisto em existir, e sou o Mercado do mercador, independente do que ele mercantilizar”!

Todas e quaisquer informações que possam somar ao assunto serão de bom alvitre e podem ser postadas em comentários no blog.

REFERÊNCIAS:

PASSAGLIA, Luiz Alberto do Prado. Mercado Velho de Santo Amaro. São Paulo: Registros 2. Publicação do Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria do Município de São Paulo. 1978.

RODRIGUES, Marly. A Instituição do Patrimônio em São Paulo-1969-1987. http://www.mem.com.br/Imagens_do_passado.pdf

GAZETA DE SANTO AMARO de 30 de março de 1961



Atas de Santo Amaro: Revistas do Arquivo Municipal

Revista de Assuntos Sociais e Culturais “Interlagos, set. 1961. Nº. 20 ano 11.

Fotos antigas: Departamento do Patrimônio Histórico Municipal de São Paulo.

Santo Amaro, Interior Urbano: